.Por Marcelo Sguassábia.
Por uma manobra involuntária e desastrada do controle em terra, um dos nossos drones de vigilância atravessou uma espessa camada de nuvens e adentrou os domínios de uma colônia de desencarnados. Uma das hélices do aparelho rasgou a túnica de um anjo e depenou sua asa direita, o que provocou um alvoroço como não se via desde os tempos de Zebedeu. Milhares de outros anjos de diferentes escalões do paraíso foram cercando o drone, pálidos de espanto com a geringonça, como se presenciassem uma aparição de Nossa Senhora de Fátima. Foi daí que tivemos uma vaga ideia da imensa “extensão territorial” do pós-morte, ainda sem legislação que a regulamente e faça dela uma fonte de recursos para a União, os Estados e os municípios.
Assim, sugiro a criação, em regime de urgência urgentíssima, do ICEL – Imposto Celestial. Uma vez comprovada a vida após a emissão da Certidão de Óbito, como bem demonstrou o episódio do drone, o cidadão retoma automaticamente seus deveres de contribuinte, pagando pelo uso do espaço aéreo que lhe couber nos planos superiores.
Não é porque morreu que se adquire o direito de não contribuir mais. Assim é fácil, certo? Basta o indivíduo se matar para não pagar mais imposto. Uma covardia com o erário público, quase um crime de omissão aos deveres cívicos e tributários.
Se a moda pega, estamos falidos. A esfera pública e o mundo corporativo também. Outro dia mesmo saiu uma notícia dizendo que, em 2098, o número de perfis de mortos no Facebook será maior do que o de vivos. E aí, como fica? Será que a maior rede social do planeta deixará de existir por causa disso? Os mortos serão maioria, e o espertíssimo Mister Zucker irá rebolar mas encontrará um jeito de fazer dinheiro com o pessoal que não posta mais nada.
Mas, voltando à ideia do novo imposto, há um único problema a ser contornado para regulamentar sua cobrança. Como ainda não há meios de instituirmos uma moeda oficial do Céu, por meio da qual o desencarnado recolheria o que deve aos cofres da nação, os herdeiros do mesmo ficariam responsáveis pelo pagamento, em terra e em reais, do ICEL em nome do finado – cobrando dele depois, se for o caso, da forma como julgarem mais conveniente.