.Por Marcelo Moreschi.
O que aconteceria caso as alturas assim rebaixadas fossem interrogadas a respeito do destino ou fixadas num impossível teatro da memória? A hipótese de Daniel Faria (em Planetário de Bolso) é a de que nesse céu se sintonizam apenas ruídos de injúrias – os corpos celestes acabam por servir para a composição de breves paisagens interiores nas quais as características dos astros figuram num horizonte de queixumes.
O céu interrogado se mostra ressentido pela expectativa de sentido. Plutão, por exemplo, em seu emblema, jura “que foi tudo sem querer” e alega não haver “propósito nenhum nos movimentos do universo – e muito menos em mim, e menos ainda no movimento que me leva a vocês”. O que esse guia portátil oferece é, assim, um lembrete de que o céu (apenas em sua posição rebaixada?) é tela de projeções subjetivas, mapas em branco nos quais o descaminho fica explicitado.
Contudo, é preciso frisar que Netuno aponta uma abertura por meio da qual um grande outro talvez possa ser avistado, como se chamasse atenção para as bordas dos mapas em branco: “um tridente, como toda invenção, foi antes objeto de sonho”.
Marcelo Moreschi é professor de literatura na Unifesp.