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Quantas mulheres ainda precisam morrer em Campinas?

Por Cláudia Oliveira

A discussão sobre a instalação de um Juizado Especializado em Violência Doméstica e Familiar veio à tona em Campinas. Depois da cidade sofrer um dos feminicídios mais chocantes da nossa história, vemos uma luz no fim do túnel. Essa é uma reivindicação antiga e agora existe a possibilidade de acontecer,  já que o próprio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) tem demonstrado interesse no assunto.

Os desembargadores Cláudio Pedrassi e Ligia Bisogni, em reunião da Comissão Permanente da Mulher na Câmara Municipal de Campinas, declararam publicamente a intenção de trazer o juizado para a cidade.

Para que o Juizado em Violência Doméstica funcione de forma adequada, além da estrutura do poder judiciário, é importante estabelecer um convênio com a Prefeitura de Campinas. Diferentemente de uma vara criminal comum, o Juizado Especializado precisa contar com uma equipe multidisciplinar (com assistentes sociais e psicólogas), além de uma rede de apoio à mulheres vítimas de violência (como centros de apoio e casa abrigo) que a cidade já tem.

Então o que falta? A  Prefeitura oferecer uma equipe multidisciplinar, uma parte pequena para a municipalidade, visto o bem que o Juizado pode trazer às mulheres que são agredidas e precisam de ajuda.

A luta por direitos das mulheres também não vem de hoje. Em 1985, criou-se a primeira Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher – DEAM, na cidade de São Paulo. No mesmo ano, a Câmara de Deputados aprovou e criou o Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres e logo depois, com a Constituição de 88, ficou estabelecido que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”.

Claro que esses direitos não foram dados às mulheres. Embora sejamos a maioria no país (somos 6.353 milhões de mulheres a mais do que homens segundo o IBGE), infelizmente  ainda ocupamos pouco os espaços de decisão, de acordo com ranking de igualdade entre homens e mulheres na política, realizado pelo Inter-Parliamentary Union (IPU), no qual o Brasil ocupa o 154º lugar.

Os avanços conquistados foram importantíssimos  para a igualdade e garantia de direitos de todas as mulheres, mas sem dúvida, o maior deles  veio com a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que cria mecanismos para coibir a violência de gênero que assola todas as mulheres.

Podemos dizer que, perante a lei, muitos direitos de fato foram garantidos, mas o que ainda não conquistamos de vez foi a efetivação de todas as leis. Por exemplo, a Lei Maria da Penha dispõe a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar  e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar (Art. 1o ). Mesmo assim, depois de 10 anos são pouquíssimas as cidades que contam com a estrutura do Juizado Especializado.

Muito se fala em combater o machismo, acabar com a violência contra as mulheres, mas o que de fato as cidades estão fazendo para que isso aconteça? Ter um Juizado Especializado deveria ser uma das prioridades da cidade.

Atualmente as estatísticas mostram dados superficiais, pois muitas mulheres não chegam aos serviços de ajuda por falta de informação e medo de denunciar. A Corregedoria do Estado alerta que nas cidades onde houve a instalação de Juizados Especializados, os números aumentaram, pois existe uma demanda reprimida, por falta de espaços como esse.

Em Campinas, só na chacina da festa de réveillon, feminicídio que chocou o país, nove mulheres foram mortas. Segundo o TJ-SP, subiu em 80% o número de medidas protetivas para mulheres vítimas de violência doméstica desde 2014 na cidade, o que confirma que a violência está presente. Além disso, o SISNOV (Sistema de Notificação de Violência) registrou um aumento de 47% da violência doméstica entre os anos de 2014 e 2015, em seu último relatório divulgado.

Uma Vara com essa especialidade ganha uma juíza/juiz próprio para acompanhar os casos dessa natureza, com isso as mulheres são melhor acolhidas e os processos ganham agilidade. Já dizia o famoso jurista Ruy Barbosa: “justiça tardia é injustiça”. No caso da violência doméstica, justiça tardia é muitas vezes a morte de mais uma mulher.

Atualmente, todos os crimes de violência contra as mulheres são tratados na Justiça Criminal comum, junto com crimes de outra natureza, como furtos e roubo. Imagina o quanto é aterrorizante passar por uma situação de violência, física ou psicológica, fazer a denúncia e ter que voltar para a casa para aguardar as investigações com o seu agressor sob o mesmo teto. Nestes casos, o que o juiz criminal pode fazer? Infelizmente muito pouco, visto que as varas criminais estão abarrotadas de processos.

A não existência de uma Vara de Juizado Especializado em Violência Doméstica e Familiar é violação de direito pura e escancarada. Não podemos aceitar que essa injustiça prossiga na cidade, com uma oportunidade tão boa para a sua instalação!

Acesse o site da mobilização pela Vara de Juizado Especializado em Violência Doméstica e Familiar: http://www.justica-para-mulheres.bonde.org/

Claudia Oliveira é  socióloga e co-fundadora da Minha Campinas

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