Por Julicristie Oliveira
O tabuleiro respingado de sabores. O cheiro de dendê nos ares. A textura das cocadas nos olhares. O pescoço recoberto de colares. Quais são os “sabores capitais“ de Salvador? Neste texto, relato minha breve experiência em busca de comida vegana na capital da Bahia, em Janeiro de 2017.
Cheguei em Salvador em uma sexta-feira. No aeroporto, encontrei umas canoinhas de tapioca que eram feitas apenas de polvilho, sal e água. Percebi que minha incursão pelos sabores baianos e veganos seria mais fácil do que previ.
Na noite da sexta-feira, fui jantar no único restaurante vegano da cidade que consegui identificar pelas minhas pesquisas na internet, o Rango Vegan, situado na Rua do Passo, 62. Felizmente, estava hospedada muito perto do estabelecimento que foi praticamente a minha segunda casa em Salvador. Escondido ao fundo de um casarão histórico, o Rango Vegan é aconchegante e agradável. No cardápio, havia várias opções de lanches, doces, mas também versões veganas de quitutes mais tradicionais, como o abará – espécie de bolinho de feijão fradinho, parecido com o acarajé, só que em vez de frito no dendê, é cozido no vapor envolto em folha de bananeira. Para minha infelicidade, o restaurante não estava servindo abará no dia e escolhi um sanduíche como opção de jantar. Estava tudo bem feito e delicioso. O Rango Vegan merece ser conhecido e apreciado.
No sábado cedo, fui ao Museu da Gastronomia Baiana para registrar as peças, os escritos, as composições, os textos e para explorar os pratos típicos do restaurante. Por sorte, consegui encontrar opções veganas, como mini acarajé sem recheio, arroz e feijão de coco. O feijão era batido com coco, formando uma espécie de creme, e era adocicado. Comer feijão temperado com açúcar foi um desafio para o meu paladar. A princípio, achei muito estranho, mas acabei me rendendo e apreciando a peculiaridade. As pessoas que trabalham no museu eram muito simpáticas e, como a maior parte dos pratos era elaborada com algum ingrediente de origem animal, o chefe da cozinha preparou para mim um prato com salada de folhas, legumes, palmito e banana da terra, puxados no dendê, é claro.
Para sobremesa, o restaurante oferece uma mesa com grande variedade de doces de frutas, sem laticínios ou ovos. Fiz um prato nada singelo com um pouquinho de cada um: cocada branca, preta, com maracujá, doce de mamão, de goiaba, de banana e pedi um cafezinho. Sorri e apreciei. Saí de lá mais feliz do que esperei.
Passei o sábado alegre e circulando pelos museus do Pelourinho. A Casa do Benin, situada na Rua das Portas do Carmo, 17, reformada pela arquiteta Lina Bo Bardi, também acopla o salão de exposição a um restaurante. Apreciei a exposição vagarosamente e depois escolhi uma boa mesa no jardim do restaurante para tomar um suco. Foi difícil decidir entre umbu e seriguela, mas como não conhecia a primeira fruta, arrisquei. Achei maravilhoso, o suco de umbu tem um gosto verde que ginga na boca aos goles. Comentei com as simpáticas pessoas que me atenderam que não conhecia a fruta. Cordialmente, me trouxeram um potinho com umbus e seriguelas. Observei, apertei, cheirei, mordi, mastiguei, senti o gosto e engoli cada uma das delicadezas. Sorri e experimentei. Saí de lá ainda mais alegre do que entrei.
No domingo, fui me aventurar pela Praia do Forte com uma amiga que o Pelourinho me deu, a Naiara. Uma história risonha, que não me canso de relembrar e que merece um texto à parte.
Pois é, Salvador tem sabor de canoinhas de tapioca, de dendê, de acarajé, de feijão de coco, de doces de frutas, de suco de umbu e de seriguela. Sorri e agradeci. Saí de lá mais baiana do que cheguei.
Julicristie M. Oliveira tem doutorado em Nutrição em Saúde Pública, é professora do Curso de Nutrição da FCA/Unicamp e atua na área de Educação e Segurança Alimentar e Nutricional.