Por Regis Mesquita
Carl Sagan foi o mais conhecido astrônomo da história da humanidade. Um homem sensível e sensato, que se dedicou a popularizar a ciência. Sua filha Sasha Sagan lhe perguntou sobre seus avós paternos e a vontade do pai de revê-los. O texto abaixo foi escrito pela filha:
”Um dia, quando eu ainda era muito jovem, eu perguntei ao meu pai sobre seus pais. Eu conheci meus avós maternos, mas eu queria saber por que eu nunca tinha conhecido os pais de Carl.
“Porque eles morreram”, disse melancolicamente.
“Será que você vai vê-los novamente”, eu perguntei.
Ele considerou sua resposta cuidadosamente. Finalmente, ele disse que não havia nada que ele gostaria mais no mundo do que ver sua mãe e seu pai de novo, mas que ele não tinha razão e nem evidência para apoiar a ideia de uma vida após a morte, por isso ele não poderia cair em tentação.
“Por quê?”, eu perguntei novamente.
Então ele me disse, com muita ternura, que pode ser perigoso acreditar nas coisas só porque você quer que elas sejam verdadeiras. Você pode ser enganado se não perguntar a si mesmo e aos outros, especialmente às pessoas em uma posição de autoridade. Ele me disse que tudo o que é verdadeiramente real pode resistir a uma análise.
Esta foi a primeira vez que comecei a entender o significado da morte. Então, eu enfrentei uma espécie de ”mini-crise” existencial, mas meus pais me confortaram sem se desviar de sua visão científica do mundo.
“Você está viva neste exato segundo. Isso é uma coisa incrível”, disseram-me.
”Quando você considera o número quase infinito de bifurcações que levam a uma única pessoa a nascer, deve ser grato pelo o que você é, neste exato segundo. Pense no enorme número de potenciais universos alternativos, onde, por exemplo, seus bisavós nunca se encontraram e você nunca veio a existir. Além disso, você tem o prazer de viver em um planeta onde evoluímos para respirar o ar, beber a água, e amar o calor da estrela mais próxima (Sol).
Você está conectado com as gerações através do DNA e, ainda mais distante, com o universo, porque cada célula do seu corpo foi cozido no coração das estrelas. Nós somos poeiras das estrelas”, disse meu pai sua famosa frase, e ele me fez sentir desse jeito.”
Comentário de Regis Mesquita:
Ninguém precisa acreditar em Deus para ser uma boa pessoa, cuidar bem dos filhos, ter amor e gratidão pela vida. Belos sentimentos não precisam de um Deus que ameaça e pune. A falta de um Deus não é um elemento de perda do autocontrole e destruição da sociedade. Aliás, a Suécia, majoritariamente ateia e agnóstica mostra que a religião é sempre dispensável.
O amor do astrônomo Carl Sagan pela sua filha é patente no texto. É uma família ateia que vive em harmonia e com muito respeito entre si.
Porque estes ateus escolhem a bondade e a gratidão ao invés do ódio e do rancor?
É simples: bondade e gratidão tendem a gerar muito mais prazer e alegria que o ódio e o rancor.
As escolhas dos sentimentos nobres e benevolentes são incentivadas por um amplo sistema de recompensa presente no cérebro e no corpo como um todo. É por isto que São Francisco de Assis viajava descalço no meio da neve e relatava que sua pobreza era fonte de alegria e bem estar. O santo de Assis direcionava toda sua vida para amar e ajudar quem pudesse e a todo momento. Esta capacidade de se manter constantemente conectado com pensamentos e sentimentos nobres gera grande prazer. Desta forma, até o frio congelante sob seus pés era desprezível; o amor e todos os sentimentos nobres “aqueciam seu coração e seus pés”.
Concluindo: a diferença entre ateus e pessoas com fé profunda está na crença e não na capacidade de amar e cuidar. A natureza gerou não só a capacidade de amar, gerou profundas recompensas para quem amar e manter atitudes, sentimentos e pensamentos nobres.
Abaixo coloco um texto que escrevi para uma página espiritualista que mantenho no Facebook. A Página se chama Nascer Várias Vezes (conheça a página). O texto retrata bem o sistema de incentivo e recompensa que existe para quem faz as escolhas mais nobres.
“O perdão te ajuda a seguir adiante
O perdão é a melhor forma de seguir adiante. Com ele você limpa sua mente e não deixa o passado te dominar.
Com o perdão você adquire forças para focalizar o que você precisa.
Com o perdão você troca o remoer de sentimentos negativos do passado pela atenção no desafio do presente. O presente é o momento no qual a pessoa aprende, desenvolve e amadurece.
O perdão é a melhor forma de romper com o passado, superando a dor aguda do sofrimento e da rejeição. É através dele que o sol pode voltar a brilhar no coração, despertando novamente a gratidão, a alegria e a vontade de viver com amor e paz.
Dica de leitura:
Fonte do texto de Sasha Sagan: http://nymag.com/thecut/2014/04/my-dad-and-the-cosmos.html
Com tradução da página do Facebook Questione: https://www.facebook.com/Ques7ione/?hc_ref=NEWSFEED&fref=nf
Regis Mesquita é o autor do site Psicologia Racional e da coluna “Comportamento Humano” aqui no site Carta Campinas
Carl Seagan foi realmente brilhante. Tinha uma vaga lembrança de suas aparições em algum programa televisivo (talvez uma coluna no Fantástico, quando o programa e sua emissora ainda serviam para alguma coisa de útil nos idos anos 70, apesar do incondicional apoio à ditadura militar), e há alguns anos atrás me deparei com o livro “Bilhões e bilhões”, muito interessante, em linguagem de fácil compreensão e muito gostoso de ler – recomendo.