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Por Luís Fernando Praga

O que sinto agora é novo, parece o pior que eu poderia sentir. É uma tristeza resignada que se acomoda em ser triste. É sentir a esperança morta e sendo esfregada na cara por um bando de brutamontes sorridentes. É uma indignação engessada, é uma força comatosa, um desânimo pra luta.

A clareza dos fatos e as evidências históricas parecem imperceptíveis à maioria. De nada vale o passado como parâmetro para a mudança de que a sociedade tanto carece e com urgência.

Mais uma vez optamos pelo retrocesso. Mais uma vez, enquanto sociedade, entregamos poder aos pastores que nos arrebanham e escravizam. Inocentemente acreditamos que eles cuidarão de nossas vidas e nos protegerão de um mal maior.

Nossas crianças continuarão sendo educadas pela mídia, por religiosos hipócritas e pela cultura de adoração ao dinheiro. Pais presentes e escola de qualidade, nem pensar; aliás: pensar, nem pensar. Serão adultos carregados da mesma ignorância, dos mesmos medos, ódios e preconceitos que nos alienam hoje.

Continuaremos cometendo os abusos próprios das sociedades machistas. Mulheres continuarão tendo menos direitos que homens e naturalmente, continuará havendo estupros e imbecilmente a sociedade continuará condenando as vítimas.

Relutaremos em pisar terrenos novos e seguiremos caminhando pelas dores do passado, com medo de cada centímetro em direção ao futuro e à libertação. As pessoas seguirão, por décadas, temendo aos que lutam por elas, mas trabalharão em prol de quem as escraviza.

Continuaremos alimentando a farsa de que acumular bens e consumir seja o segredo do sucesso e da felicidade.

Continuaremos, talvez por séculos, competindo, guerreando e matando nossos semelhantes para defendermos o direito de permanecer na merda e seguiremos na cobiça de um dia escravizar alguém também.

Os indignados, que gritavam por justiça e contra a corrupção, em uníssono com a mídia golpista, com lideranças fascistas e políticos entreguistas, hoje se calam, e, obedientes àquela mesma mídia, trabalham. Trabalham tranquilos, como se tivessem resolvido tudo, como bois pastando às vésperas do abate. Trabalham até a morte, enquanto a elite política amacia a carne do País para que, nos próximos 20 anos, a elite econômica deguste tudo sem se dar ao trabalho de mastigar.

Eu estava errado e nada era pra agora: nem a liberdade nem a justiça social nem o fim da miséria e da fome nem uma educação que crie cidadãos éticos nem o estado laico nem a sustentabilidade ou a valorização da vida humana como bem maior, tudo vai ter que aguardar.

Meus conceitos de tempo, urgência e necessidade se mostraram equivocadas ilusões criadas por mim. Tudo pode esperar e eu morrerei, deixando aos meus o mundo injusto e movido a guerras, onde vivi minha vida toda.

É muito triste para quem vislumbra outro mundo, para quem vive dessa esperança, para quem sofre a dor do outro, para quem semeia com o intuito de ver frutificar.

Entretanto, somos muitos semeando e ainda há tanta esperança viva dentro de nós! Somos tantos os que já lutamos por liberdade e caminhamos rumo ao mesmo horizonte, desde a aurora da humanidade, que não, não há de ser tudo em vão!

Talvez o “germinar” independa de minha percepção de tempo e de necessidade. Talvez minha capacidade de enxergar o que se convencionou chamar de utopia não me garanta a possibilidade de vivenciá-la.

Tudo o que tenho é minha vida e a condição de dar a esta dádiva o andamento mais digno possível, apesar das limitações impostas por um sistema cruel onde, queira ou não, estou inserido.

Apesar de derrotado, ainda vejo dignidade em apanhar e me levantar pra luta, minha motivação é nobre e pacífica! Vejo dignidade na rebeldia frente à submissão e na desobediência a imposições opressivas. Vejo dignidade em não me vender, em ser empático e solidário. Vejo dignidade em sonhar e não desistir da evolução!

Vejo dignidade em reafirmar que a mídia é uma arma poderosa que nos controla conforme interesses meramente comerciais. Vejo dignidade em alertar que as religiões estão limitando a capacidade humana e em argumentar que este sistema jamais será nosso aliado. É digno viver como aqueles que jamais se calaram perante as injustiças; é uma honra!

Eu não ligo de morrer antes da sombra e dos frutos! Eu vejo dignidade e, reparando bem, posso até sentir o frescor da sombra e o doce dos frutos de tudo o que já foi plantado às margens da nossa estrada.

Talvez nossa função seja apenas trilhar, pra não deixar o mato crescer sobre esse caminho que não querem que vejamos, mas que, um dia, todos percorrerão seguros e convictos. Talvez nosso empenho não transforme ninguém, mas sirva pra gente como nós saber que gente como nós existe, pra que a resistência encontre amparo e pra que saibamos que há com quem contar! Talvez possamos construir pequenas fagulhas de utopia em paralelo ao sistema que destrói e servir de exemplo a futuros sonhadores.

O que sinto agora, alguns parágrafos abaixo, é ainda mais novo! É a esperança renascida, que sempre renasce diferente, vigorosa e sedutora! O que sinto é a beleza de existirmos, de sermos vários, diferentes e de não termos medo de apanhar! Sinto que nós, os sonhadores, por mais que nos oprimam, humilhem, violem e massacrem, nós não acabaremos nunca, e um dia seremos todos!