finadasdoabortoVelas, flores e caixões para simbolizar milhares de mulheres que morreram em abortos clandestinos no país, fazem parte de uma instalação de protesto montada hoje (8) em em frente à 12ª Delegacia de Polícia, em Copacabana, no Rio. A delegacia coordenou ação que prendeu, na semana passada, uma paciente e dois médicos em uma clínica na cidade, sob acusação de prática do aborto, considerado crime no Brasil, com até 3 anos de prisão.

Na manifestação, na porta da delegacia, as ativistas em defesa dos direitos das mulheres e contra a criminalização do aborto questionaram as condições de prisão da paciente da clínica. As ativistas disseram que a grávida que esperava na recepção, levada para a delegacia, foi impedida de se alimentar durante horas, prática que classificaram como tortura psicológica. Segundo a ativista Daniele Machado, o objetivo era que a moça confessasse a intenção de fazer o aborto, já que foi presa na sala de espera, portando R$ 4 mil.

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“Como a mulher não foi presa em flagrante, foi torturada na delegacia. Ficou sem comer para que confessasse alguma coisa, pegaram o dinheiro dela, R$ 4 mil, e ainda a obrigaram a assinar um documento comprometendo-se a testemunhar contra os médicos”, disse Daniele, que participou da manifestação ao lado de dezenas de mulheres em frente à delegacia.

A versão da gestante circulou em redes de mulheres que defendem o fim do crime de aborto e foi confirmada por outras ativistas. A Agência Brasil não conseguiu localizar outra grávida que estava em procedimento de aborto quando os médicos foram presos. Segundo a Polícia Civil, essa vai responder por aborto consentido, crime com pena máxima de 3 anos.

Na avaliação das ativistas do grupo Finadas do Aborto, que organizou a manifestação de hoje, a situação à qual a gestante foi submetida fez aumentar seu sofrimento. “Já é uma situação difícil quando a mulher decide abortar, ela vai para ilegalidade, para a clandestinidade, fica vulnerável, corre risco de morrer. Daí, a prisão, a exposição, a tortura, com a pressão [dos policiais] e a estigmatização, torna tudo isso muito pior. A abordagem criminal do aborto não é o caminho”, disse Laura Molinari Barreto, do Finadas do Aborto.

Para as ativistas, a única forma de reduzir as mortes de mulheres em decorrência do aborto, e a prática em si, é acabar com a tipificação como crime. “Uma brasileira morre a cada dois dias fazendo aborto por causa da ilegalidade. Defendemos que ela possa fazer esse procedimento de maneira segura, no serviço público, para que ela não morra”, disse Laura.

No ato na porta da 12º DP, as feministas levaram fotos de mulheres que morreram recorrendo ao procedimento ilegal no estado do Rio, como Jandira Magdalena dos Santos Cruz, de 27 anos. As ativistas penduraram cabides na instalação, em referências às mulheres que não têm condições de buscar uma clínica e usam objetos para furar o útero para dar fim à uma gestação indesejada.

No Brasil, segundo o documento Aborto e Saúde Pública no Brasil, de 2009, do Ministério da Saúde, a estimativa é de que 1.054.242 abortos foram induzidos em 2005, passando de terceira para a quinta causa de mortalidade materna, de 1990 a 2012. No Rio, o Comitê Estadual de Mortalidade Materna divulgou que 8% das mortes maternas são em decorrência do aborto.

Conselho

Segundo nota da assessoria de polícia à Agência Brasil, a prisão em flagrante dos médicos, um ginecologista e uma anestesista, é decorrência de investigação da 12º Delegacia de Polícia, que apurava denúncias sobre o funcionamento de uma clínica de aborto em Copacabana.

O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) informou que abriu uma sindicância para apurar o envolvimento dos dois médicos da clínica, podendo, posteriormente, abrir processo ético-profissional para determinar sanções aos profissionais, que podem variar de advertência até a cassação do registro, o que impede que voltem a exercer a função. Não há prazo para o fim dos processos, segundo o conselho.

A Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro confirmou que um dos médicos presos trabalhava em uma das unidades do órgão, mas sua atuação “fora da rede é de responsabilidade exclusiva de cada profissional”. O órgão aguardará a conclusão do processo do Cremerj para decidir sobre o futuro do médico.