Os alunos têm ocupado escolas estaduais na capital e no interior. De acordo com a secretaria, 151 estabelecimentos de ensino estão ocupadas hoje (25). O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo estima em 163. Em Campinas já são 8 escolas ocupadas: Carlos Gomes e Francisco Glicério, no Centro, Júlio de Mesquita (Jardim das Oliveiras), Antonio Vilela Júnior (Vila Industrial), Eliseu Narciso Reverendo (DIC III), Hugo Penteado Teixeira (Parque Floresta), Procópio Ferreira (Jardim das Oliveiras) e Colégio Dom Barreto (Ponte Preta).
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Nas escolas ocupadas, os jovens criaram uma rotina de atividades. Eles se dividem em grupos para fazer a limpeza, garantir a alimentação, manter a segurança e atender às demandas da imprensa. Além disso, são programadas palestras, aulas abertas, debates e exibições de filmes.
Com o fechamento das escolas e a transferência de estudantes para outros estabelecimentos, o objetivo do governo é segmentar as unidades em três grupos (anos iniciais e finais do ensino fundamental e ensino médio).
A falta de diálogo sobre as mudanças e o apego à escola em que estuda desde o 6º ano levaram Fabrício a aderir ao movimento de ocupação da Escola Estadual Caetano de Campos, na Praça Roosevelt, centro da capital paulista. A escola funciona em um edifício de janelas amplas e pé direito alto, construído no século 19. A unidade foi tomada pelos jovens no dia 16.
Na ocasião, havia cerca de 30 escolas ocupadas. “É sempre assim. Engole! Aceita, aceita e aceita! Não somos obrigados a aceitar tudo”, reclamou o jovem sobre a forma como são tomadas as decisões no ambiente escolar.
Há também reclamações relativas ao excesso de alunos por sala e falta de professores. “Na 7ª série [8º ano], não tive professor de história e geografia. Um ano inteiro sem geografia e história. Em outros anos, fiquei sem matemática. A base para o ensino médio eu não tive”, afirmou Fabrício. “Minha sala é muito cheia. Acho que tem 47 pessoas na lista. Pouquíssimas não aparecem. São sempre 35 ou 40 pessoas em uma sala. Muitas vezes os professores não conseguem nos alcançar da forma que gostariam”, acrescentou Aryel David, 17 anos, estudante do 3º ano.
Aproximação com a escola
Segundo Aryel, a sensação da fazer parte do movimento de ocupação é de empolgação e aproximação com a escola. “É surreal. A escola faz mais parte do meu dia a dia do que fazia antes. Estamos limpando a escola, fazendo comida. Parece que fazemos mais parte da escola do que antes.” Algumas salas foram transformadas em dormitórios. A secretaria e a diretoria foram lacradas com barricadas para evitar danos ou extravio de documentos.
O clima ordeiro surpreendeu a mãe de Fabrício, que, segundo ele, o repreendeu no início do movimento. “Minha mãe veio aqui e viu como está a situação. Mostrei para ela como o pessoal está organizado. Ela pediu desculpas.”
Aryel garante que a mobilização dos estudantes tem deixado em segundo plano organizações tradicionais, como o movimento estudantil institucional. “Eles estão somando com a gente, não estão liderando as coisas”, afirmou ao explicar que existe apoio externo, apesar do comando das ações ser dos alunos.
No Pátio com Laerte
Na Escola Estadual Fernão Dias Paes, em Pinheiros, zona oeste paulistana, primeira a ser ocupada, a cartunista Laerte Coutinho participou ontem (24) de uma conversa com os estudantes. “É para saudar essa gente e dizer que estamos solidários. Conhecer o pessoal e entender como isso funciona”, acrescentou a chargista, que estudou na escola na década de 1960. “Há uma vizinhança. Somos vizinhos no tempo, porque também vivemos nesse espaço e tivemos problemas relativamente parecidos.”
Laerte ofereceu para os jovens um livro francês – Um Século de Desenhos de Contestação. “Se quiserem passar o livro para a biblioteca da [escola] Fernão, beleza. Se quiserem roubar, beleza. Não é mais meu”.
Cauê Borges, 16 anos, do 2º ano, disse que, desde o começo, a mobilização teve caráter horizontal. “Entramos e fizemos uma assembleia. Decidimos ocupar. O primeiro dia foi uma demonstração de poder descentralizado. Conseguimos nos agrupar fora de partidos e de organizações burocráticas do Estado”, informou Cauê.
A reação das autoridades à ocupação surpreendeu os estudantes. “Quando fomos para fora, tinha um monte de policiais”, lembrou Jéssica Lopes, 17 anos, sobre o cerco da Polícia Militar à escola. O governo estadual tentou, sem sucesso, obter na Justiça a reintegração de posse das unidades ocupadas. O apoio recebido de moradores da região e de movimentos sociais incentivou os estudantes a manter a ocupação. “A solidariedade foi espetacular”, destacou Jéssica.
Segundo ela, as ocupações foram uma reação à intransigência do governo estadual que não abriu espaço para negociar com os estudantes mesmo após diversas manifestações contra a reorganização. “Não diria que foi do nada [que começaram as ocupações]. Fizemos sete atos. Tínhamos voz e não éramos ouvido. Estávamos na mídia, mas não tivemos nenhuma proposta de diálogo.”
Laerte ficou impressionada com a articulação dos estudantes. “Estou abismada. Acho que nunca teríamos feito uma coisa desse teor”, afirmou em referência à sua geração. “Não sei o que vai mudar. O que eu gostaria muito que ocorresse era uma resposta de abertura para negociações. Uma compreensão do governo de que não é possível fazer esse movimento sem ouvir a sociedade.” (Agência Brasil/Carta Campinas)