Estudo publicado na revista Nature Geosciences mostra que a forte redução na taxa de desmatamento na amazônia entre 2003 e 2014 diminuiu a emissão de poluentes decorrente das queimadas e melhorou a qualidade do ar em grandes áreas da América do Sul.
O trabalho mostra que a queda no desmatamento beneficia a saúde da população em vastas áreas, inclusive em regiões distantes da floresta, pois correntes de ar levam os poluentes emitidos nas queimadas para áreas como o Sudeste brasileiro.
Por meio do cruzamento de dados sobre redução do desmatamento e emissões de poluentes, estima-se que até 1.700 mortes foram evitadas por ano na América do Sul. A pesquisa teve a participação do físico Paulo Artaxo, do Instituto de Física (IF) da USP e de pesquisadores do MIT (Estados Unidos), e das Universidades de Leeds e Manchester (Reino Unido).
A cada ano, milhares de quilômetros quadrados de florestas são derrubados para preparação de novas terras para a agricultura e pecuária na amazônia. A fumaça emitida a partir de grandes incêndios causa altos níveis de poluentes atmosféricos tais como material particulado, ozônio, monóxido de carbono, óxidos de nitrogênio e outros. Esses poluentes têm importantes efeitos negativos na saúde humana. A fumaça é tão forte e tão extensa por grandes áreas da América do Sul que é facilmente detectada por satélites. Na pesquisa, a equipe de pesquisadores usou dados de satélites e medidas em solo para examinar a quantidade de fumaça na atmosfera.
A área total da floresta amazônica é de aproximadamente 5 milhões de quilômetros quadrados (km2). De acordo com as informações fornecidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Brasil em 2003-2004 desmatou 27.000 km2 de florestas. Em 2013-2014, a área desmatada foi de cerca de 5.000 km2. “Esta forte redução na taxa de desmatamento fez com que as emissões de gases de efeito estufa diminuíssem cerca de 70% no período”, aponta Artaxo. “A emissão de poluentes tais como material particulado, monóxido de carbono, óxidos de nitrogênio e outros também foi muito expressiva, o que fez com que a redução da exposição a poluentes atmosféricos tenha reduzido a mortalidade na América do Sul”.
De acordo com o físico, os poluentes são transportados na atmosfera por longas distâncias. “As correntes de ar que trazem umidade da amazônia para a região Sudeste também trazem os poluentes emitidos pelas queimadas”, relata. “Isso faz com que uma pessoa que está longe da região amazônica, mas na região onde este transporte atmosférico ocorre sofra com aumento da carga atmosférica de poluentes. Estes poluentes tem forte efeito na mortalidade pelos efeitos na saúde”.
Queda dos níveis de poluentes
A pesquisa demonstra que em anos com altas taxas de desmatamento, a atmosfera é muito mais poluída se comparada a anos com baixo desmatamento. Com a forte queda, os níveis de poluentes associados também diminuíram. De acordo com Artaxo, as observações de satélites foram combinadas com modelos atmosféricos de circulação global, mostrando que a concentração do particulado fino na região Sudeste do Brasil decresceu em cerca de 30% durante a estação seca (entre os meses de agosto e outubro), como resultado da redução do desmatamento entre 2003 e 2014.
A queda dos níveis de poluentes, por sua vez, foi então combinada com índices de mortalidade associadas à exposição de material particulado fino. “O estudo levou em conta doenças cardiovasculares e respiratórias, que respondem por mais de 90% dos efeitos da exposição à poluição”, explica Artaxo. “A população estudada refere-se a adultos de mais de 30 anos, pois os valores de exposição de crianças são diferentes dos adultos e os dados de exposição para particulados em crianças são mais esparsos”. Os resultados apontam que cerca de 400 a 1.700 mortes por ano foram evitadas na América do Sul como decorrência da queda do desmatamento na Amazônia.
A pesquisa revela um novo benefício na redução do desmatamento, pois a qualidade do ar em regiões distantes da amazônia melhorou significativamente e grande número de mortes adicionais foram evitadas pela redução da exposição a poluentes atmosféricos. “A forte redução do desmatamento, até chegarmos ao desmatamento zero traz benefícios extras que vão favorecer em muito não só o meio ambiente amazônico e global, mas também a saúde da população”, ressalta o físico. “Precisamos continuar o esforço de proteção da floresta amazônica, pois isso também salva vidas de brasileiros e auxilia na redução das mudanças climáticas globais”.
O artigo Air quality and human health improvements from reductions in deforestation-related fires in Brazil foi publicado na edição online da revista Nature Geosciences em 16 de setembro. A pesquisa foi realizada pelo Programa de Grande Escala da Biosfera e Atmosfera da Amazônia (LBA), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), e financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) (Agência USP)