Na última edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), apenas 250 pessoas tiraram a nota máxima 1000 – enquanto 529.374 zeraram a redação. Os números, segundo especialistas, revelam fragilidade no ensino e na formação de jovens. Ensino não faz com que o aluno consiga articular ideias próprias. Faltam leitura e prática de escrita. A responsabilidade sobre o ensino dos jovens é quase integralmente dos governos estaduais, que mantêm uma educação frágil e incapaz de permitir o gosto pela leitura e, consequentemente, a capacidade de reflexão e crítica.
“É um número expressivo. Estamos falando de meio milhão de jovens que tiraram zero. A maioria não conseguiu sequer se prender ao tema. O nosso aluno do ensino médio é aquele que não consegue ler o tema proposto, não está conseguindo escrever minimamente dentro do que foi pedido”, analisa o professor do Colégio JK, em Brasília, Marcelo Freire.
O balanço divulgado pelo Ministério da Educação mostra que 217.339 zeraram a prova por fugir ao tema, esse foi o principal motivo para a anulação. Para Freire, os números devem servir de alerta também para a outra ponta. Dos quase 6,2 milhões que fizeram a prova, apenas 250 conseguiram a nota máxima. Na edição anterior, em 2013, entre os 5 milhões que fizeram o exame, 481 obtiveram a nota 1000 e 106.742 zeraram.
Ele explica que o aluno nota máxima é o que entende os critérios do Enem, que se prepara, mas não se trata “de um novo Machado de Assis, de um superdotado. É bom aluno, que está preparado para falar sobre qualquer tema. São poucos os que podem apresentar o que se espera do bom aluno”, diz.
O resultado pode, no entanto, servir para que haja uma mudança no sistema de ensino, segundo Freire. O coordenador de Redação do Colégio Sigma, Eli Guimarães, concorda que as escolas passarão a dar mais valor à produção textual. Ele defende que não apenas a disciplina de português, mas todas as disciplinas trabalhem a leitura de vários gêneros textuais. “O texto, seja ele qual for, verbal e não verbal, tem que ser o elemento central no processo de ensino e aprendizagem”, diz.
Segundo Guimarães, para escrever bem, é preciso praticar. Os alunos devem escrever e ter os textos corrigidos. “Não podemos deixar o problema textual na leitura, mas na escritura. Precisamos de uma correção orientada. Os alunos devem produzir textos regularmente e esses textos devem ser corrigidos de forma adequada. Não adianta escrever 20 redações sem que elas sejam corrigidas”, defende.
Para o CEO (sigla, em inglês, de Chief Executive Officer – diretor executivo, em português) da Rede Educacional Alub, Alexandre Crispi, além do ensino, o contexto em que o jovem está inserido hoje também causa impacto na produção textual. O jovem está bastante conectado na internet, o acesso à infomação é grande. A leitura, no entanto, é mais superficial e voltada para interesses específicos. Redes sociais, whatsapp também influenciam a escrita. Não é incomum, segundo ele, que os alunos abreviem palavras ou deixem de usar conectivos.
Praticar foi o que ajudou a estudante Victória Maria Luz Borges a conseguir a nota 1000. Este foi o terceiro Enem da estudante, que quer cursar medicina em uma universidade federal. No Colégio Lerote, em Teresina, ela diz que a redação era muito incentivada. Toda semana produzia um texto. “Acho que o segredo é ter muito foco, ler muito, praticar. A leitura tem que ser associada à escrita. É preciso também, antes de tudo, compreender os critérios do Enem para colocar em prática. Assim consegue-se escrever sobre qualquer tema que venha”. (Agência Brasil; edição Carta Campinas)