Os professores de literatura da Unicamp, Francisco Foot Hardman e Alcir Pécora, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, defendem que 100% das vagas das universidades públicas sejam preenchidas por estudantes da rede pública de ensino.
Segundo eles, a educação pública, hoje oportunamente abandonada à própria sorte,” deve ser matéria de soberania e desenvolvimento nacional, prioridade estratégica da reforma política do sistema institucional hoje exaurido”. O preenchimento das vagas da universidade pública por alunos vindos de escola pública não só permitiria, segundo eles, a existência de uma democracia real, que se estendesse a todos, como também a valorização de aptidões e talentos que não são levados a sério e, no entanto, são aqueles capazes de encontrar “formas de sobrevivência na barbárie”.
Qualquer outra medida que não vá ao ponto essencial da questão – garantir as vagas aos alunos de escola pública – seria demagogia de governos, reitores, conselhos e “especialistas da exclusão” que, de alguma forma, se beneficiam da péssima qualidade do ensino público, que mantém e intensifica as nossas inúmeras desigualdades.
No entanto, o caminho para essa quase revolução na organização atual de nosso sistema educacional não é fácil e os autores lembram que “será necessário canalizar muito das energias dispersas das Jornadas de Junho numa vontade organizada, pois apenas essa pode ser politicamente eficaz”.
Neste sentido, “seria necessário, portanto, mais que 10% do PIB; mais que 9,57% do ICMS que Alckmin-Calabi respingam como dádiva; mais que inventar um reitor biônico, como Rodas por Serra. Seria necessário defender e aprofundar a plena autonomia financeira da universidade pública, sustentada sobretudo pela grandeza de seus objetivos científicos e sociais”, dizem os professores.
Diante de um cenário marcado pelo que eles chamam de um “descaso centenário com a educação pública no país”, não é acidental que, na ruína, reine o vestibular, sistema abominável de reprodução da desigualdade, em nome de uma falsa meritocracia”.
Os professores lançam assim um grito, ao mesmo tempo que propõem uma reação e atitude frente a essa realidade onde a escola pública permanece cada dia pior e as universidades públicas cada vez menos públicas, em diversos sentidos. Eles dizem: “basta de hipocrisia! Ocupação de todas as vagas da universidade pública, em processo de avaliação contínua, por quem as merece de direito e de fato: os que estudam nas escolas públicas. A universidade pública tem de ser compreendida no cerne da escola pública”.
Parece ser esse o caminho que vai garantir uma real melhora na qualidade do ensino público, sucateado nas últimas décadas. Ao estabelecer uma relação entre a escola e a universidade pública, a qualidade dessa última será transferida para a primeira, acontecendo, enfim, a valorização da atividade do professor do ensino básico, de que tanto se fala, mas que continua sem acontecer de fato, passando, enfim, a serem os serviços públicos – como é em toda real democracia – a melhor alternativa para a população. (Matéria na Folha de S.Paulo)