No que depender das entidades e militantes que participaram do ato público pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, realizado na noite de ontem (26) na sede da OAB do Rio de Janeiro, a agenda da sociedade brasileira ganhou duas importantes metas para os próximos meses: impedir a corrupção legalizada, ou seja, o financiamento de campanha por empresas nas eleições deste ano e, também, reformar o sistema político-eleitoral por completo para os pleitos posteriores.
A tarefa mais urgente, na visão das entidades, e que já está em execução, é pressionar o ministro Gilmar Mendes a devolver ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 4.650 proposta pelo Conselho Federal da OAB. A pressão já virou campanha na internet com o mote “Devolva, Gilmar!”. Há quase dois meses, o ministro pediu vistas e travou a votação da Adin no plenário do STF, que já contava oficialmente com quatro votos e mais duas declarações prévias favoráveis, ou seja, seis dos 11 ministros, maioria necessária para a aprovação, já apoiam o fim das doações de empresas às campanhas eleitorais – a Adin 4.650 está no Supremo há três anos. “Não podemos continuar convivendo com eleições financiadas por grandes empresas que, obviamente, não fazem isso pelo bem da democracia no Brasil”, defendeu o integrante do Conselho Federal da OAB e ex-presidente da seccional fluminense, Wadih Damous.
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A ação, movida pelo Conselho Federal da Ordem, se baseia no entendimento de que é inconstitucional a doação eleitoral por empresas porque cria uma desproporcionalidade no sistema político e dá às empresas um poder de atuação que não deveriam ter, pois não são agentes legalmente reconhecidos da vida política nacional.
“Empresa não faz doação, faz investimento”, alertou a presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Virgínia Barros. O conselheiro federal e secretário-geral da OAB, Claudio Souza Neto, foi além. Para ele, “o financiamento de empresas fere a democracia e viola os princípios mais básicos da República por permitir vantagens ilícitas e interferência em órgãos públicos em benefício dos financiadores. Por isso, a legislação eleitoral brasileira sempre foi inconstitucional”.
Projeto de Lei
Para além do financiamento de campanha, a coalizão de entidades também está empenhada na reforma completa do sistema político-eleitoral do país. Com este objetivo estão sendo coletadas assinaturas em apoio ao projeto de lei de iniciativa popular da “Reforma Política Democrática e Eleições Limpas”. Mais de 200 mil eleitores já assinaram, mas o número precisa chegar a, pelo menos, 1,3 milhão de assinaturas (1% do eleitorado nacional).
O projeto, construído após as grandes manifestações do ano passado e a partir das declarações da presidenta Dilma Rousseff em apoio à reforma política, consolida o fim do financiamento de campanhas eleitorais por empresas e corrige outras distorções do sistema eleitoral brasileiro, entre elas a sub-representação das mulheres na política e a desvalorização dos partidos políticos e do voto do cidadão.
Uma das propostas contidas no projeto merece destaque por recuperar o protagonismo dos partidos políticos, mas sem tirar dos eleitores a palavra final sobre seus representantes nos parlamentos. Para isso, as entidades querem que as eleições parlamentares passem a ser realizadas em dois turnos. No primeiro cada eleitor votará no partido político que, de acordo com sua avaliação, apresentar as melhores propostas, e no segundo os eleitores voltam às ruas para escolher quais candidatos ocuparão as vagas conquistadas por cada partido no primeiro turno.
Para não esquecer de 1964
“Estou pensando em 1964, na necessidade de apoiar reformas estruturantes para o Brasil”, declarou o bispo Dom Roberto Francisco Paz, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), fazendo referência ao processo de reformas que levaram à deposição do presidente João Goulart. Para ele, a política só deixará de ser usada como balcão de negócios com um “controle social do processo eleitoral”, conduzido não só pelos partidos. Nas eleições que se aproximam, o bispo defende que os eleitores sejam rigorosos. “Se o candidato não apoia a reforma política, não pode ser votado. Quem tem vergonha na cara apoia.”
Outros também defenderam a necessidade da reforma política para a superação definitiva do período autoritário. “Nossa transição para a democracia está inconclusa. Ainda temos resquícios da ditadura em várias áreas, como na segurança pública e na educação”, lembrou Virgínia.
“Em março, estive no ato dos 50 anos do comício da Central do Brasil pelas reformas do Jango e fiquei impressionado como as questões de fundo da sociedade brasileira continuam as mesmas daquela época. Além da política, as reformas urbana, educacional, agrária e dos meios de comunicação, entre outras, ainda precisam ser feitas”, alertou o coordenador-executivo da coalizão, o ex-deputado e ex-presidente da UNE Aldo Arantes.
Representando a Frente Parlamentar pela Reforma Política, o deputado Alessandro Molon (PT-SP) comentou sobre as tentativas, até agora sem sucesso, de aprovar no Congresso uma contrarreforma para neutralizar a Adin 4.650 e o projeto de lei de iniciativa popular, o que torna mais importante a pressão sobre Gilmar Mendes. “A tese defendida pela OAB na Adin 4.650 é simples e inquestionável: quem não vota não pode doar. A luta pela reforma política é uma guerra de guerrilha, mas estamos conseguindo avançar. Com a inconstitucionalidade da doação de empresas, com certeza teremos um próximo Congresso bastante diferente do atual.”
Além de mudar os parlamentos, a reforma política responde a inúmeros anseios da sociedade brasileira acumulados ao longo de toda a sua história. “Temos que superar a enorme distância entre representantes e representados”, defendeu Ivo Lesbaupin, da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política. “Não tenho dúvidas de que se aprovarmos o projeto de lei da reforma política daremos um grande passo rumo a moralização e a consolidação do processo democrático brasileiro”, conclui Wadih Damous. ( Rede Brasil Atual)
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