Em meio a crise na Saúde Pública de Campinas, com falta de médicos, atendimento e a maior epidemia de dengue da história da cidade, a administração do hospital Cândido Ferreira soltou uma grande nota, em que reporta o histórico da parceria entre o hospital e a Prefeitura de Campinas, amparado em leis estabelecidas desde o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Cândido Ferreira
Ponto de Cultura do Hospital Cândido Ferreira

Nesta semana,  o secretário de Saúde da cidade, Cármino de Souza, reconheceu parcela de culpa na administração municipal por demorar em contratar agentes de saúde após o fim do convênio como o hospital Cândido Ferreira.

A nota do hospital, em que pede uma audiência pública sobre a situação da Saúde em Campinas,  foi publicada após o vereador Marcos Bernadelli (PSDB), em sessão da última quarta-feira (23), ter afirmado que a culpa da explosão de dengue em Campinas seria da ex-prefeita Izalene Tiene (PT), que governou Campinas após o assassinato do  prefeito Antônio da Costa Santos, o Toninho (PT), até 2004 e que o hospital “Cândido Ferreira é mais uma mazela do PT”, segundo fala reproduzida no Blog da Rose.

Veja nota integral abaixo.

Lembramos, mais uma vez, que o Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira é uma instituição filantrópica fundada em 1924, com 90 anos de existência completados, agora, no dia 24/04, todos eles dedicados, primordialmente, ao atendimento das pessoas com sofrimento mental. A partir de 1990, a Lei Municipal 6.215/90, incorporou o Cândido Ferreira ao Sistema Municipal de Saúde e estabeleceu uma relação de administração e gerenciamento conjuntos com a Prefeitura Municipal de Campinas e, desde então, esta instituição vem se dedicando ao atendimento à população do município de Campinas, exclusivamente através do Sistema Único de Saúde – SUS, e configurando-se, portanto, como uma instituição de caráter público, laica e apartidária.

Esta parceria vitoriosa vem sendo, desde 1990, diretamente responsável pela implementação da mais extensa e complexa rede de saúde mental entre todos os municípios do Brasil, atendendo com base nos princípios da chamada reforma psiquiátrica, a qual, tem por diretriz fundamental para o cuidado em saúde mental, o respeito absoluto à pessoa em sofrimento enquanto um cidadão pleno de direitos, rompendo radicalmente com as práticas manicomiais e discriminatórias.

Atendendo a cerca de 7.500 usuários/mês, somos 06 CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) para transtorno mentais, em regime de funcionamento de 24 horas, 02 CAPS para o atendimento das crianças e adolescentes, 03 CAPS para o atendimento das pessoas que fazem uso abusivo de álcool e outras drogas, um dos quais em regime de 24 horas, 01 Núcleo de Retaguarda com 72 leitos de internação, 06 Centros de Convivência, 30 Residências Terapêuticas e cerca de 18 projetos de oficinas terapêuticas e geração de renda.

Não bastasse a nossa excelência em saúde mental, sempre nos colocamos à disposição do SUS Campinas, em parceria com a Prefeitura Municipal de Campinas, para contribuir e apoiar a superação de variados impasses na viabilização de um atendimento de melhor qualidade em saúde, à população de Campinas, no que destacamos a nossa parceria também no Programa de Saúde da Família, entre 2002 e 2013.

O Programa de Saúde da Família, lançado em 1994, último ano do Governo Itamar Franco (PMDB), consolidou-se como uma política estruturante da Atenção Básica do SUS entre  os anos de 1995 e 2002, tendo por principais marcos regulatórios a edição da Norma Operacional Básica – NOB/1996 e da Norma Operacional de Assistência à Saúde – NOAS-SUS 01/2001. O Programa de Saúde da Família, no contexto da reestruturação da Atenção Básica, portanto, pode ser identificada como uma das principais realizações, no campo da saúde, do Governo Fernando Henrique (PSDB) ao longo de seus dois mandatos.

Um dos principais obstáculos à plena implementação deste Programa, identificado à época, foi dificuldade em se contratar as equipes do Saúde da Família, pela Administração Direta dos municípios, até porque esta função não encontrava-se regulamentada na grande maioria destes, e ainda pairavam, para muitos prefeitos, incertezas sobre a continuidade de um programa que encontrava-se ainda em implantação e experimentação.

Para contornar esta dificuldade, o então Ministro da Saúde, José Serra, articula o estabelecimento de um “Termo de Compromisso Tripartite” (assinado em 25/01/2002) entre o Ministério da Saúde, o CONASS (que reúne os Secretários Estaduais de Saúde) e o CONASEMS (que reúne os Secretários Municipais de Saúde), o qual contou com a interveniência do Procurador Geral do Ministério Público do Trabalho, para permitir a contratação dos Agentes Comunitários de Saúde por entidades parceiras da sociedade civil.

Este “Termo de Compromisso Tripartite” encontrava-se em consonância com o Decreto do Presidente da República nº 3.189 de 04 de outubro de 1999, que regulamentou as atividades dos Agentes Comunitários de Saúde e que, no seu Artigo 4º prevê que: “O ACS prestará seus serviços, de forma remunerada, na área do respectivo município, cm vínculo direto ou indireto com o Poder Público local, observando as disposições fixadas em portaria do Ministério da Saúde.” (Vide “Modalidade de Contratação de Agentes Comunitários de Saúde – Um Pacto Tripartite”, Ministério da Saúde, Janeiro 2002, acessível pela rede mundial de computadores (“internet”) no endereço eletrônico http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/contratacao_agentes.pdf).

Não é por mera coincidência, portanto, que Campinas tenha iniciado em 2002, ou seja, a partir da assinatura do Termo de Compromisso Tripartite acima referido, esta nova parceria entre o Cândido Ferreira e a Prefeitura, para viabilizar a contratação dos Agentes Comunitários de Saúde e deslanchar aqui o Programa de Saúde da Família. Esta parceria, portanto, não foi uma ‘mazela’ inventada pelo PT ou pela então Prefeita Dra. Izalene Tiene, mas fruto de um compromisso nacional firmado entre a União, os Estados e os Municípios, independentemente de qualquer questão partidária, para a aceleração da implantação do Programa de Saúde da Família em todo o país.

Em Campinas, portanto, a contratação “terceirizada” de trabalhadores para a rede municipal iniciou-se sob os auspícios do Programa de Saúde da Família do Governo Federal, e devidamente amparado no referido Termo de Compromisso Tripartite, firmado com a interveniência do Ministério Público do Trabalho. A escolha do Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira foi decorrente da profícua e estreita parceria já estabelecida no campo da saúde mental, a partir da Lei 6.215/90, a qual transformou este Serviço em uma “ente de cooperação” ou “entidade paraestatal” e, portanto, em parceiro preferencial desta Prefeitura para a pactuação de ações conjuntas em saúde.

Campinas tornou-se, inclusive, um dos municípios que mais se destacaram pela excelência na implementação do Programa de Saúde da Família, tornando-se uma das principais referências para o SUS de todo o país. Ou seja, as eventuais diferenças partidárias entre diferentes governos não impediram a necessária comunhão de esforços em favor de um bem maior – o fortalecimento da Rede de Atenção Básica em Saúde,  principal pilar de sustentação de uma política de saúde pública, universal, integral e equânime – esforços estes, aos quais nos somamos, com muito orgulho, para permitir a sua viabilização em nossa cidade. O Programa de Saúde da Família é hoje uma política de saúde pública já consolidada em termos nacionais, e se transformou em uma das principais conquistas do Sistema Único de Saúde – SUS e de todos os brasileiros.

O Convênio de Apoio ao Programa de Saúde da Família, amplia-se a partir de 2005, na gestão do então Prefeito Dr. Hélio de Oliveira (PDT),  para permitir a contratação, em caráter emergencial e temporário, de variados profissionais de saúde, em especial médicos, dado que a Prefeitura Municipal de Campinas encontrava-se, então, legalmente IMPEDIDA de contratar servidores municipais para a área da saúde dada a impugnação judicial de concurso público realizado no segundo semestre de 2004, a qual, esperava-se, seria rapidamente resolvida.

Para além deste obstáculo legal, que só viria a ser finalmente superado a partir de 2010, ao longo de todos estes anos, o gasto de pessoal próprio (servidores municipais) da Prefeitura Municipal de Campinas, mesmo não realizando concursos públicos para a área da saúde, manteve-se sempre muito próximo do teto legal imposto pela chamada Lei da Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101 de 04/05/2000), que limita, na prática, o gastos do poder executivo municipal com pessoal em 52% do orçamento total e desconsidera que o principal recurso das políticas públicas das áreas sociais como saúde e educação, são as pessoas contratadas para cuidar de pessoas.

Ou seja, os prefeitos em geral, sejam de quais partidos forem, enfrentam sempre um difícil dilema, criado pelo dever constitucional de assegurar a assistência em saúde (Art. 30, item VII, da Constituição Federal) por um lado e, por outro, pelas limitações decorrentes da LRF que ‘engessa’ as administrações municipais dificultando as necessárias contratações de pessoal para as áreas sociais, em particular para a saúde.

Foi, portanto, o pronto apoio do Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira que, então,  IMPEDIU O COLAPSO DO SISTEMA MUNICIPAL DE SAÚDE, assegurando a qualidade e a necessária expansão dos serviços de assistência à saúde da população de nossa cidade. O nosso município ficou em 8º lugar entre os os mais bem avaliados do país, pelo chamado Índice de Desempenho do Sistema Único de Saúde (IDSUS) do Ministério da Saúde, apurado para os anos de 2007 a 2010  e divulgado em 2012. Esta conquista só foi possível através da parceria incondicional deste Serviço com o SUS Campinas. (Para conferir esta informação e obter mais detalhes basta consultar o sítio da própria Prefeitura Municipal de Campinas na rede mundial de computadores (“internet”) no endereço eletrônico: http://www.campinas.sp.gov.br/noticias-integra.php?id=11902).

Em janeiro de 2012, o então Prefeito Dr. Pedro Serafim (PDT), recém-empossado, surpreende a todos ao firmar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público prevendo a substituição de todos os profissionais contratados pelo Cândido Ferreira, no âmbito do Convênio de Apoio Geral à Saúde e ao Programa de Saúde da Família, por servidores concursados, no prazo de apenas 6 meses, quando já estávamos discutindo um convênio de transição, de pelo menos 3 anos, para assegurar esta substituição de forma gradativa e responsável, tanto para permitir uma reorganização mais tranquila da vida dos trabalhadores contratados pelo Cândido Ferreira a serem desligados, quanto assegurar a manutenção da assistência prestada à população, sem solução de continuidade ou quebra da qualidade.

Este prazo foi prorrogado por mais 6 meses apenas, a despeito de todas as ponderações apresentadas, estabelecendo-se o prazo final de 13 de março de 2013. No início de 2013, que coincidiu com o início do mandato do atual Prefeito, Dr. Jonas Donizete, o Conselho Municipal de Saúde, avaliando as dificuldades, já evidentes, para assegurar a substituição tempestiva dos trabalhadores Cândido a serem desligados até 13/03, aprovou uma deliberação no sentido de se garantir a prorrogação do Convênio de Apoio à Saúde em Geral e Programa de Saúde da Família de forma que um trabalhador contratado pelo Cândido no âmbito deste Convênio fosse efetivamente desligado apenas quando um servidor concursado estivesse apto a assumir imediatamente o seu posto.

Entretanto, segundo o próprio Secretário de Saúde Dr. Cármino de Sousa “o governo optou em não solicitar a prorrogação do TAC, o que somente adiaria o problema” (Ata da Reunião Extraordinária do Conselho Municipal de Saúde, dia 13/03/2013, pg. 05, linha 161). Ou seja, a Prefeitura não ‘teve que demitir por ordem da justiça’(segundo fala atribuída ao Sr. Vereador),  posto que o prazo do TAC era negociável. E não negociar este prazo foi, como vimos, decisão soberana e autônoma desta Administração Municipal.

Ou seja, os problemas atuais vividos pela rede pública de saúde, seja nos hospitais, seja no SAMU, seja nos Pronto-Atendimentos, seja nas Especialidades, seja na Atenção Básica, seja ainda no controle da epidemia da dengue, decorrentes do número insuficiente de profissionais para o atendimento adequado à população de Campinas não podem, portanto, ser atribuídos à esta“mazela” do Cândido Ferreira, segundo fala atribuída ao Sr. Vereador, mas, pelo contrário, esta instituição sempre fez parte da solução dos problemas de saúde de Campinas, e as dificuldades atuais apenas enfatizam a importância que esta parceria sempre teve para o estabelecimento de um equilíbrio mais adequado entre as demandas de saúde da população e a capacidade de atendimento da rede SUS Campinas.

Reiteramos, portanto, que consideramos imprescindível a ampliação deste debate, proposto pelo Sr. Vereador, que remete ao papel desta instituição, Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira – em co-gestão com a Prefeitura Municipal – na rede de saúde pública de nosso município. Para tanto, estamos, mais uma vez, solicitando a realização de uma audiência pública, a ser organizada o mais breve possível, na Câmara Municipal de Campinas.

Campinas (SP), 25 de abril de 2014

A Administração.