Um Inquérito Civil público foi instaurado pelo Ministério Público Federal em São Paulo (MPF/SP) para apurar denúncias de violência obstétrica em estabelecimentos de saúde na capital paulista.
A violência obstétrica implica em agressões físicas ou emocionais por parte de profissionais de saúde durante o atendimento às parturientes, nas redes pública e privada. De acordo com o MPF, práticas invasivas desnecessárias são consideradas “rotina hospitalar” em maternidades brasileiras.
O MPF está recebendo denúncias que demonstram o desrespeito às mulheres antes, durante e após o parto. A ausência de informação e consentimento da paciente acerca dos procedimentos realizados leva à adoção de práticas invasivas que, embora desnecessárias em muitos casos, são rotineiras em várias maternidades. Dentre elas está o corte na região da vagina para facilitar a saída do bebê, prática chamada episiotomia. Apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS) determinar critérios e cautela para a adoção do procedimento, a maioria dos médicos brasileiros defendem a episiotomia e a realizam de maneira indiscriminada.
Outros exemplos de violência obstétrica são a infusão intravenosa para acelerar o trabalho de parto (ocitocina sintética), a pressão sobre a barriga da parturiente para empurrar o bebê (manobra de Kristeller), o uso rotineiro de lavagem intestinal (enema) e retirada dos pelos pubianos (tricotomia) e o exame de toque frequente para verificar a dilatação. São comuns também os relatos de xingamentos e humilhações praticados por parte dos profissionais de saúde ao proferirem frases como “se você não parar de gritar, eu não vou mais te atender”, “na hora de fazer não gritou” e outras do gênero.
Além disso, as mulheres não são hidratadas ou alimentadas durante o trabalho de parto nem recebem qualquer assistência para o alívio das dores. São obrigadas a permanecer deitadas, sem liberdade para se movimentar e encontrar a posição mais confortável para parir, situação que amplia o desconforto advindo das contrações. Em relação ao contato entre mãe e bebê, na maioria das vezes a criança é separada da mãe assim que nasce, prejudicando o início da amamentação e o contato direto durante a primeira hora após o nascimento.
OMS e SUS. Os problemas relatados vão de encontro às boas práticas recomendadas pela OMS, como o respeito ao direito da mulher à privacidade no local do parto, o apoio emocional pelos profissionais de saúde, a adoção de métodos não invasivos e não farmacológicos de alívio da dor, a liberdade de posição e movimento durante o trabalho de parto, o contato cutâneo precoce entre mãe e filho e o incentivo ao início da amamentação na primeira hora após o parto. Os casos de violência contra as parturientes também afrontam a atenção humanizada à gravidez, preconizada no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) pela chamada “Rede Cegonha”.
Além de fiscalizar as entidades de saúde que estão desrespeitando os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, o MPF pretende divulgar a ocorrência das práticas indevidas durante o trabalho de parto, bem como os direitos das parturientes. As procuradoras da República Luciana da Costa Pinto e Ana Previtalli, responsáveis pela instauração do inquérito civil público, defendem que as mulheres precisam ser informadas para que possam cobrar dos profissionais que as atendem a assistência digna e baseada em evidências científicas já estabelecida pela OMS. (Carta Campinas com informações de divulgação)