Curso do Astrolábio, Salomé em cena: a dança e o trágico na arte e na literatura, abre inscrição

(Artemisia Gentileschi, Judite decapitando Holofernes, cerca de 1620)

“O mistério do amor é muito maior que o mistério da morte”. É essa frase provocadora de Oscar Wilde que abre os caminhos do curso e oficina de escrita “Salomé em cena: a dança e o trágico na arte e na literatura” que atravessa a literatura, a dança e as artes visuais para investigar a figura de Salomé como símbolo trágico e subversivo.

O curso acontece de modo online no mês de dezembro, às quartas e sextas-feiras, nos dias 03 e 05, 10 e 12, das 10h às 12h e das 19h às 21h, no Centro Cultural Astrolábio, e será ministrado pela professora, pesquisadora e crítica literária Maura Voltarelli. No dia 26 de novembro, às 18h, também acontecerá uma aula aberta e gratuita de apresentação do curso. Os interessados podem se inscrever na aula aberta e no curso pelo site do Centro Cultural Astrolábio. As aulas são ao vivo e as gravações ficam disponíveis por 30 dias para aqueles que não puderem comparecer no horário da aula. É emitido certificado de participação.

(Theda Bara em “Salomé”, 1918)

O percurso das aulas vai do século XIX à literatura brasileira contemporânea, passando por Wilde, Flaubert, Mallarmé, Machado de Assis, Júlia Lopes de Almeida, Raduan Nassar e tantos outros nomes que se deixaram capturar pelo mistério de Salomé ora deusa, ora fantasma, ora corpo em êxtase.

Feiticeira, femme fatale e histérica

Protagonista do drama de Oscar Wilde “Salomé”, a misteriosa e mortífera dançarina que assaltou o imaginário das artes no fin de siècle converte-se em uma espécie de locus communis na passagem para a modernidade. De mero instrumento a serviço da vingança de sua mãe, Herodias, como lemos na narrativa bíblica, Salomé passa a representar, na virada do século XIX para o século XX, a feiticeira, a femme fatale e a histérica subversiva, cujo corpo curvado em arco se insinua na coreografia ondeante e lasciva de Salomé.

Como escreveu Eliane Robert Moraes em “O peso da cabeça”, presente no seu estudo O corpo impossível, a dança de Salomé se situa nos domínios da morte, ao culminar na decapitação de um homem, tal dança recortada por um espírito trágico anuncia o tema da perda da unidade do corpo que a modernidade não cansará de explorar. Neste sentido, o motivo artístico do bailado de Salomé dá a ver com particular intensidade o vitalismo dionisíaco e o êxtase que atravessam as diferentes artes do fin de siècle.

Neste curso, retomaremos algumas figurações de Salomé na literatura ocidental que datam do período compreendido entre o século XIX e início do século XX, entre elas, o drama Salomé (1893), de Oscar Wilde, o conto “Herodíade” (1877), de Gustave Flaubert e seu romance Salammbô (1862) no qual a dançarina surge pálida, ofuscante e antiga feito um fantasma a exalar um odor que era “mais suave que o vinho e mais terrível que a morte”, sem esquecer o poema inacabado de Mallarmé “Hérodiade” que ele começa a escrever em 1864, no qual as relações entre linguagem e dança se intensificam diante de uma Salomé demoníaca “devorada de angústias”, pura imagem a um só tempo opaca e transparente. Próxima da Salomé de Mallarmé, está a “Deusa da imortal histeria” à qual sucumbe o herói de Às avessas (1884), de J.K. Huysmans, reconhecida na “Salomé sobre-humana” que das telas de Gustave Moreau salta para as páginas do livro.

(Mariette Charles Mazarin em “Salomé”, Richard Strauss, 1907)

Salomé na literatura brasileira

Em um segundo momento, faremos um deslocamento para a literatura brasileira, seguindo os gestos convulsivos de Salomé em autores do Romantismo como Fagundes Varela e José de Alencar com sua trágica e erótica Lucíola (1862), passando por Machado de Assis e sua “Terpsícore” (1886), entre outras personagens com ares de cigana “oblíqua e dissimulada”, chegando a inquietantes figuras femininas espalhadas pelos contos fantasmagóricos de Júlia Lopes de Almeida reunidos em Ânsia eterna (1903), entre eles, “O caso Ruth” em que nos deparamos com uma “morta em êxtase” a dançar com uma alegria maligna de dentro da própria morte. Também faremos uma passagem pela violenta dança de Ana, personagem de Lavoura Arcaica (1975), de Raduan Nassar, e a leremos como uma Salomé e bacante anacrônica, mulher ornamental e transgressiva.

Da literatura às artes visuais

Nosso percurso pela literatura será acompanhado de um percurso pelas artes visuais no qual colocaremos em diálogo com os textos algumas figurações da dança de Salomé e das variações do tema em obras de Botticelli, Ticiano, Donatello, Bernardino Luini, Artemisia Gentileschi, Dominique Ingres, Gustave Moreau, Victor Meirelles, entre outros artistas capturados por essa força feminina e pelo enigma de uma dança a girar em torno do abismo.

Estava linda! Na pele alvíssima nem uma sombra. Os cabelos negros, mal atados na nuca, desprendiam-se em uma madeixa abundante, de largas ondas. […] Alucinado, ciumento, Eduardo arrancou então num delírio o véu e as flores de Ruth, e inclinando um tocheiro, pegou fogo ao pano da eça. E a todos que acudiram nesse instante, pareceu que viam sorrir a morta em um êxtase, como se fosse aquilo que ela desejasse…”

Júlia Lopes de Almeida, conto “O caso Ruth” em Ânsia eterna

(Gustave Moreau Salomé tatuada, 1874)

Programa das aulas:

Aula 1 – Salomé: dança e decadência, o espírito trágico e o corpo despedaçado

Aula 2 – Beleza e morte: as Salomés de Oscar Wilde, Flaubert, Huysmans e Mallarmé

Aula 3 – Lascivas, vingativas: as falenas de Varela e Alencar, as bacantes de Machado de Assis

Aula 4 – A morta em êxtase: danças infernais em Júlia Lopes de Almeida e Raduan Nassar

Serviço:

SALOMÉ EM CENA: a dança e o trágico na arte e na literatura

curso e oficina de escrita com Maura Voltarelli

Aula aberta e gratuita: quarta, 26/11, 18h

Quartas e Sextas: 03, 05, 10 e 12/12, 10h às 12h e 19h às 21h

Aulas online via zoom

Inscrições e mais informações: https://www.oastrolabio.com.br/maura-voltarelli-dezembro-2025 ou pelo e-mail oastrolabiocontato@gmail.com

* Desconto especial para ex-alunas/os do Astrolábio, estudantes universitários e pessoas acima de 65 anos

MAURA VOLTARELLI é crítica literária, professora e pesquisadora com mestrado e doutorado em Teoria e História Literária pela UNICAMP, e pós-doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada pela USP. É autora dos livros de crítica literária O Sequestro da Ninfa (2024), sobre a obra de Carlos Drummond de Andrade, e Amar, depois de perder: uma poética da Ninfa (2021), além do livro de poemas Nymphé e outros poemas (2014) e de diversos artigos sobre literatura brasileira, teoria e crítica literária e artes visuais. Atualmente, realiza um segundo pós-doutorado na Unicamp sobre as expressões da histeria na literatura brasileira, onde também dá aulas.

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