.Por Verônica Lazzeroni Del Cet.
Há talentosas escritoras no Amazonas que podem não ser ainda tão conhecidas, porém, se o motivo é a falta de espaço, agora não é mais. Letícia Pinto Cardoso, 28, se comprometeu em mudar esse cenário. A idealizadora e coordenadora do projeto “Te Conto em Contos”, é também escritora e elaborou o projeto literário que vem tornando conhecido nomes de escritoras amazonenses.
O projeto – contemplado pelo Prêmio Feliciano Lana, da Secretaria Cultural do Amazonas – publicou até o momento dois e-books, com contos originais, e escritos por mulheres inscritas na seleção. “Não houve tema, decidi que era melhor deixar tema livre para dar a possibilidade de escolha para as escritoras, nem que fosse para elas tirarem textos de suas gavetas, isto é, não ter a pressão de começar um texto do 0, que elas pudessem trabalhar em algo que já tinham feito, achei que isso pudesse facilitar”, explicou a coordenadora, Letícia Cardoso.
“As seleções são voltadas para escritoras do Amazonas, isto é, para mulheres amazonenses e mulheres que residam aqui no Estado há pelo menos cinco anos. A outra exigência é de que os textos submetidos atendam ao gênero literário Conto”, complementou a entrevistada. A banca é composta por três professoras, todas da área de Literatura, e que atuam ou nas escolas públicas do Amazonas ou nas universidades públicas do estado.
“A banca deve aprovar até dez textos. Os critérios de avaliação, disponíveis nas nossas chamadas, são: originalidade e inventividade, qualidade técnica e competência linguística”, conta a escritora. Além disso, o projeto conta ainda com uma revisora e designers, sendo essas últimas responsáveis pela criação do projeto gráfico do e-book e do layout das postagens das redes sociais.
Assim, Letícia Cardoso coordena um projeto que possibilita com que textos originais sejam publicados de forma coletiva, incentivando as mulheres que escrevem. “Fiz uma pesquisa para tentar descobrir outras escritoras fora daquelas que já fazem parte do cânone, além da Astrid Cabral, por exemplo, da Violeta Branca, e encontrei quase nada de estudos sobre escritoras daqui, e nada sobre escritoras que escrevessem contos, e pensei “Ué, mas por quê?” Por que, eu ainda não sei, só suposições, mas decidi fazer um projeto para chamar as mulheres daqui que escrevem para produzir contos, porque eu sei que tem mulheres que escrevem, ex-colegas de universidade, mas por que elas não estão publicando ou não publicam? Se era por falta de espaço, incentivo, eu estaria me comprometendo com isso”, explica a coordenadora.
PARTICIPANTES
O primeiro e-book publicado – Queria te ver me ouvir contar – contou com várias participantes. “Enviei o meu conto no último dia do edital e quando soube da minha aprovação, tive a real noção de que o que eu escrevo pode sim encontrar morada no coração dos leitores. Eu já tenho poesias e contos publicados em livros dos selos Callenda e Casa Literária, ambos do Grupo Lendari. Cada vez que um trabalho meu é publicado, me sinto impulsionada a continuar e penso que escrever não seja um hobby ou uma escolha e sim, uma condição essencial como respirar’, conta uma das participantes do primeiro e-book, Enedina Bentes, 42, especialista em Logística, poetisa e escritora.
“Os contos são bem diversos e fazer parte disso fez com que eu me sentisse talentosa. Nunca havia publicado ficção, submeti alguns artigos acadêmicos em congressos e outros eventos, mas antes do Te Conto em Contos alguns escritos ficcionais meus entraram apenas por meio de redes sociais”, diz Fernanda de Souza Andrade, 23, professora de Português para estrangeiros e uma das participantes da primeira edição.
A possibilidade em publicar um conto de autoria própria não só gerou grande emoção nas participantes, como também comprovou sonhos antigos.
“Publicar no Te Conto em Contos acionou a conclusão de um sonho que ficou lá na infância: ser uma escritora. É de imensa alegria poder compartilhar o livro com os amigos e dizer que, se forem em determinada página, encontrarão algo que você escreveu. Escrevi o conto A menina do Largo em um momento de epifania e o resultado acabou surpreendendo a mim mesma. Escrevi de uma vez só”, conta a professora Fernanda.
“Penso que existem excelentes escritoras no Amazonas, entretanto por experimentarem a dificuldade de ter um livro publicado acabam se conformando em escrever e arquivar. A necessidade de se revelar essas escritoras mulheres urge em meio a um mercado fechado, clubinhos e academias que endeusam uma meia dúzia e deixam os restantes às margens. Não queremos migalhas e tampouco queremos tomar o lugar de ninguém. Queremos sim, a chance de mostrar o nosso trabalho, com o respeito e a valorização, que todo artista merece. Temos histórias, temos conteúdo e só queremos a chance de encantar os leitores e deixarmos nossa marca na literatura do nosso Estado”, explica Enedina Bentes.
“A dificuldade de acesso à produção amazonense não se restringe apenas à literária. Desde a escola nós, nortistas e nordestinos, aprendemos muito sobre as demais regiões do país e, quando pensamos que o inverso também acontece, nos deparamos com problemas graves de geografia simples ou mesmo o puro preconceito. É inacreditável a quantidade de pessoas que não reconhecem Manaus como uma capital desenvolvida, com Polo Industrial, produção musical… Somos a capital do coração da Amazônia, mas não produzimos somente sobre isso. É preciso sair do que está apenas diante dos olhos e explorar artistas em outras regiões. Temos muito a mostrar”, complementa Fernanda Andrade.
NOVAS EDIÇÕES
No começo de março, o segundo e-book – intitulado Entre linhas, memórias e outras passagens – foi publicado com uma nova leva de textos de escritoras amazonenses e seguindo os mesmos critérios da primeira seleção. “Nela oito contos foram aprovados”, conta Letícia.
Além disso, o formato digital permaneceu sendo o meio mais eficaz de publicação, por conta da pandemia e dificuldade em realizar noites de autógrafos ou de lançamentos, além do baixo custo de publicação e facilidade de acesso ao material. “Com um clique, você pode acessá-los e lê-los imediatamente, se quiser, no celular, no computador, em qualquer tela’, diz a coordenadora que já confirma o terceiro e-book, mas com um diferencial. “Estamos no processo de seleção de contos para o terceiro e-book. Este e-book será maior porque contará com escritoras do primeiro e do segundo e-book, além das selecionadas, de escritoras convidadas, e do conto de minha autoria também. Espero publicar, então, nesse e-book, mais de trinta contos escritos por mulheres do Amazonas”, diz a idealizadora.
EXISTEM ESCRITORAS NO AMAZONAS
O reconhecimento das escritoras amazonenses pelo projeto Te conto em Contos levantou também questões acerca da dificuldade de publicação de textos de autoria feminina, reforçando que muito ainda precisa ser feito.
“O primeiro passo para mudar esse cenário é empoderar jovens garotas a expressarem seus escritos, depois, apoiar e divulgar iniciativas como o Te Conto em Contos. Considero esta a de maior poder, porque pode ser feita por mais pessoas e de forma gratuita. Um comentário, um compartilhamento, uma hashtag já coloca em evidência esses projetos. Por fim, massificar a importância da leitura, da escrita e da literatura na formação cidadã”, explica Fernanda.
“Considero esses lançamentos como um reconhecimento a elas enquanto escritoras, porque para mim, pessoalmente, é assim. Então são quase um manifesto, uma declaração de “existem escritoras no Amazonas, venha só ler os contos delas”. E para o digital não tem limites geográficos. Os livros e as escritoras estão no mundo agora para quem quiser lê-los”, finaliza a coordenadora, Letícia.
Acompanhe o projeto nas redes sociais:
Instagram: @tecontoemcontos
Link: https://bit.ly/34B12v7
Para o primeiro e-book, Queria te ver me ouvir contar: https://bit.ly/2Yik7hC
Para o segundo e-book, Entre linhas, memórias e outras passagens:
Links para os dois e-books, para a Chamada, para o perfil, e até para a leitura dos contos do primeiro livro num podcast, estão todos reunidos aqui: linktr.ee/tecontoemcontos