.Por Ricardo Alexandre Correa.
Os negros de todos os lugares já estão fartos da hipocrisia praticada pelos brancos. − Malcolm X
Não acredito em benevolência das pessoas brancas quando o assunto é racismo. Ninguém que tenha nascido num sistema que lhe oferece inúmeras vantagens quererá perder essa herança. E mesmo sabendo que existem pessoas buscando contribuir na luta antirracista, observamos atitudes que estão internalizadas e naturalizadas. Estas atitudes são resultados da subjetividade e alimentam as estruturas que dão sustentação ao racismo. Esse espaço íntimo das pessoas tem caráter complexo, dado que ao longo de cada vivência é contaminado por informações apresentadas por inúmeras fontes e configuram diferentes subjetividades na formação humana. Nesse sentido, as pessoas brancas por não estarem sujeitas à opressão racial desenvolvem uma visão de mundo totalmente distinta das pessoas negras.
A imprensa televisiva é uma fonte de informação que está presente na vida de milhares de pessoas e tem participação direta nesse processo. Ela fornece à subjetividade do seu público um arcabouço de imagens estereotipadas e estigmatizadas da população negra. Isto é tão recorrente que levou muitas pessoas brancas a acreditarem que as qualidades negativas são partes da natureza humana a quem são associadas, além disso, os negros não estão imunes aos efeitos perniciosos da conformação da subjetividade. Eles assimilam tal condição e colocam limites nos anseios para a busca de uma vida menos desumana. Nesse aspecto, a psicanalista Maria Lúcia da Silva (2017) comenta que “a vivência cotidiana do racismo pode produzir situações traumáticas, que fazem com que o indivíduo, muitas vezes, não consiga sair desse lugar da dor, da angústia, que não consiga compreender o que está acontecendo com ele”.
E somado a todas essas questões, a realidade de brutal sofrimento demonstra o racismo estrutural. Qualquer análise das condições de vida dos negros aponta analiticamente que os mesmos estão em múltiplas posições marginalizadas, e raramente presentes nos espaços de decisão e atividades consideradas “nobres”. Isso posto, entendemos que a sociedade brasileira não está evoluída ao ponto de compreender que a inexistência de privilégios beneficia a todos os indivíduos. Infelizmente, somos educados ao longo da vida a acreditar que o merecimento é conjugado com o esforço de cada pessoa. Dessa maneira, ignoramos a gênese da sociedade que colocou os negros distantes da condição de seres humanos, e ergueu uma enorme barreira que define as relações raciais.
Por essas considerações, miramos a existência de um complexo desafio em combater o racismo estrutural, já que a condição de desigualdade encontra nos beneficiários a chancela da sua manutenção sem a pretensão de radicalizar uma mudança de paradigma. Isto se comprova nas práticas exercidas pelos brancos nos espaços de decisão, onde estão sempre preservando os próprios privilégios. Assim sendo, não podemos ficar esperando os brancos a minarem o sistema racista. Devemos agir causando constrangimento a todos que se aproveitam da condição de sofrimento dos negros, mas sem a ilusão de que os direitos surjam em função de discursos moralistas.
O racismo extrapola atitudes individuais. Ele exige a disputa no campo político, com ações conjuntas e elaboradas pela população negra na cobrança das demandas necessárias e inadiáveis. Estarmos conscientes desses desafios significa que a compreensão sobre o racismo na sociedade brasileira está em concordância com a reflexão do professor Dennis de Oliveira (2007) “o Brasil é uma sociedade em que o racismo é estrutural, isto é, modelou os comportamentos, as atitudes, os pensamentos de uma grande parte das pessoas. Garantiu privilégios maiores ou menores a determinados grupos, mesmo entre as classes sublternizadas”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PORTAL CULT. Entrevista da psicanalista Maria Lúcia da Silva. Disponível em: <https://revistacult.uol.com.br/home/como-a-vivencia-cotidiana-doracismo-pode-produzir-traumas/>. Acesso em: 17 março 2020.
PORTAL GELEDÉS. Acusar o racismo incomoda
Disponível em: < https://www.geledes.org.br/acusar-o-racismo-incomoda-por-dennis-de -oliveira/>. Acesso em: 17 março 2020.