Editorial de O Globo na contramão da racionalidade mundial
.Por Nelson Albuquerque de Souza e Silva.
Sou assinante de O Globo há mais de 20 anos e sou Médico e Professor Emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Faculdade de Medicina) e não posso deixar de manifestar minhas críticas ao editorial de hoje na página 2 sob o título “STF pode dar ajuda contra a crise”.
No referido editorial, argumenta-se que esta “ajuda” seria aprovar uma medida que vai na contramão das propostas que estão sendo aprovadas no mundo inteiro, por governos de diferentes matizes políticas, para combater a crise cujo estopim foi a pandemia do Coronavirus.
Enquanto todos recomendam manter ou até aumentar salários, dar bolsas para os mais necessitados, não demitir pessoas, entre outras medidas para impedir a desaceleração da economia devido à redução drástica das atividades econômicas de múltiplos setores, o editorial procura argumentar de modo perverso, antiético e até inconstitucional, em favor da redução salarial dos trabalhadores do setor privado e por “isonomia”, também para os servidores públicos.
Argumenta ainda, de modo mais perverso, que desta “economia”, sobrará mais dinheiro para que o estado aplique no combate à epidemia. Novamente procura-se retirar recursos dos trabalhadores assalariados auxiliando as empresas a economizarem na folha salarial.
Reduzir salários na situação atual, sejam de servidores públicos ou de trabalhadores do setor privado não terá nenhuma repercussão sobre a epidemia e certamente aumentará o número de mortes decorrentes da mesma ao empobrecer os assalariados.
Os médicos e todo o pessoal de saúde, de educação, das universidades e institutos de pesquisas são essenciais para combater esta epidemia e todos são servidores públicos.
Como propor, numa hora dessas, redução de salários e de jornada de trabalho?
Esta medida criará um caos na Saúde, na educação e na Ciência e tecnologia.
Por que O Globo não sugere que os recursos para combater a epidemia venha dos mais ricos? Por exemplo, que os empresários paguem suas dívidas, que chegam a atingir trilhões de reais, com a previdência social, que as taxas de juros da dívida pública sejam zeradas, que os impostos sobre as grandes fortunas sejam efetivados como manda nossa Constituição?
Por que não abrir linhas de crédito a juros zero para os empresários, para que aumentem sua produção com a garantia de manutenção dos empregos e dos salários?
É absolutamente necessário expandir enormemente os gastos do governo visando a contrabalançar a queda na demanda privada, visando evitar a depressão Econômica e iniciar um ciclo de desenvolvimento.
A política econômica em curso está errada e precisa mudar.
A saúde só terá melhora com desenvolvimento, empregos e salários dignos. A injustiça social aumenta a mortalidade por doenças infecciosas como o Coronavirus e por doenças crônicas como as doenças cardiovasculares. Desemprego e depressão econômica são determinantes de doenças*.
A hora é de solidariedade para reverter as drásticas consequências dessa epidemia e para isto, há que reverter as políticas atuais. (Do GGN)
Nelson Albuquerque de Souza e Silva – Professor Emérito Universidade Federal do Rio de Janeiro – nsouzaesilva@gmail.com. *Socioeconomic Development and Cardiovascular Disease