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Clássico do teatro marginal, ‘Navalha na Carne Negra’ expõe o corpo preto em seu grito, silêncio e luta

*Atividade suspensa devido ao coronavírus, conforme comunicado:

“Seguindo determinação da prefeitura de São Paulo, o Theatro Municipal suspendeu sua programação e atividades por tempo indeterminado para prevenir riscos de transmissão do vírus Covid-19 (Coronavírus). Por enquanto a duração do recesso não está definida. O período exato do fechamento será decidido na próxima semana de acordo com orientação da Secretaria Municipal de Saúde.

A ópera Aída, que abriria a temporada lírica no próximo dia 28 de março, está suspensa provisoriamente, bem como os demais eventos da programação previstos para as próximas semanas e visitas educativas.

Oportunamente novas datas da programação serão anunciadas, bem como os meios de remarcação ou ressarcimento de ingressos.

A suspensão vale também para as atividades da Praça das Artes”.

Em São Paulo – No próximo dia 30 de março, às 20h, o espetáculo teatral “Navalha na Carne Negra” será apresentado no Theatro Municipal de São Paulo como parte da programação Teatro no Municipal.

(Foto: Divulgação)

A peça de Plínio Marcos, que no ano passado completou 50 anos, é tida como um clássico do “teatro marginal”, aquela cena que fazia ver a “escória da sociedade”.

No caso de Navalha na carne, figuram três personagens, Neusa Sueli, Vado e Veludo, respectivamente, uma prostituta, um cafetão e um camareiro gay, que, nas palavras do crítico teatral Décio de Almeida Prado, fazem parte de um “subproletariado” – “uma escória que não alcançara sequer os degraus mais ínfimos da hierarquia capitalista”.

Se muitos a consideram uma obra “datada” sob alguns aspectos, a direção e os atores pretendem friccionar Navalha na carne contra sua própria pele – a realidade, a experiência e a pesquisa de uma atriz, dois atores e um diretor pretos, que vêm construindo suas trajetórias através de uma proposta estética que articule a presença preta na cena e na sociedade contemporâneas: José Fernando Peixoto de Azevedo, dramaturgo, diretor teatral e professor da Escola de Arte Dramática da USP, foi diretor e
fundador do Teatro de Narradores (1997-2017) e colaborador do grupo Os Crespos; Lucelia Sergio, da Cia Os Crespos (SP); Raphael Garcia, do Coletivo Negro (SP); e Rodrigo dos Santos, da Cia dos Comuns (RJ), grupos que tem extensa pesquisa teatral sobre o tema.

DO CORPO NEGRO

A problemática do corpo preto e seus históricos processos de marginalização social servem de mote central para a montagem, que pretende lançar luzes sobre algumas questões relativas à hierarquização social vigente nas sociedades contemporâneas. Essas questões atravessam o texto de Plínio Marcos e reverberam na própria produção teatral hegemônica em nosso país. Quem são esses “marginais” de Plínio Marcos hoje em dia? Onde se encontram? Como vivem? Como lidam com seus
desejos e necessidades? Qual sua expectativa de vida? Será que se reconhecem como parte da “escória”? O que esperam da sociedade – se é que ainda esperam alguma coisa?

Do corpo-mercadoria – essa redução perversa da imagem do corpo preto
produzida pela história da escravidão – à mercadoria-corpo que é a prostituta Neusa Sueli estancando a fome com seu sanduíche de mortadela; da sexualidade excessiva da “bicha” Veludo à sexualização do corpo negro, esse corpo-objeto, ao qual não se concede o direito ao desejo; e, a partir daí, até a fantasmagoria viril chamada Vado, cuja expressão é a imitação de uma violência cuja gramática constitui uma gestualidade
macaqueada da violência naturalizada na figura do macho nacional.

DO EXCESSO E DA EXCEÇÃO

São excessos de vida e de morte, de potência e impotência, de grandeza e
insignificância, são vestígios de uma história marcada no corpo preto, feita de gritos e de silêncios. Imaginar um futuro implica lançar o olhar às cicatrizes e permitir-nos a escuta de uma potência inaudita – provavelmente, a voz de um anseio oprimido que jamais desistiu da vida. 

Nessa Navalha na carne negra, as figuras em jogo não são apenas
vítimas ou imagens de uma destituição absoluta. Elas são sobretudo figuras em luta: em cena, como na vida, a luta pela vida revela o quão portadoras de vida ainda são. Na resiliência desses corpos adoecidos de sua negação, revela-se uma intuição silenciosa, de que os atravessamentos produzem diferença, permitem que saibam ainda o que são; como qualquer corpo doente, são corpos que imaginam cura.

DA CENA

A cena se constitui como um dispositivo-estúdio, em que as imagens são
captadas e transmitidas ao vivo, elaborando uma espécie de adesão: o ponto de vista da câmera adere a Neusa Sueli. Presente o tempo todo em cena, a câmera, esse dispositivo de olhar, de enquadramento, força a construção. O espectador vê o jogo em cena e compara com o corte que assiste na tela. Os monitores revelam a dimensão do corte, emoldurando o jogo e sua teatralidade. É preciso atravessar essa saturação da imagem, do corte, do enquadramento, para conferir a suposta totalidade da cena, já saturada de
presenças, transitando entre o jogo ficcional do texto e o jogo estrutural da captação de imagem. A luta entre as personagens é duplicada pela tensão gerada por esse trabalho de captura da imagem.

O olhar dessa puta – essa Neusa Sueli preta, mulher, corpo-mercadoria –
contempla, porque precisa contemplar, a imagem de um futuro. Ela se mantém atenta, examinando a miséria, o desespero e a desesperança, em busca de uma pista – o mais sutil laivo de vida. Seu olhar há de nos indicar a direção do grande salto. (Texto de José Fernando Peixoto de Azevedo)

Theatro Municipal de São Paulo – Sala de Espetáculos

TEATRO NO MUNICIPAL
Navalha na Carne Negra

Plínio Marcos, texto
José Fernando Peixoto de Azevedo, direção geral e dispositivo cênico
Lucelia Sergio, Raphael Garcia e Rodrigo dos Santos, elenco
Flávio Moraes, assistente de direção
Isabel Praxedes, vídeo
Denilson Marques, iluminação
Criação Coletiva, direção de arte
Tarina Quelho, assessoria para o trabalho corporal
Corpo Rastreado, produção

Duração aproximada: 60 minutos
Indicação etária: 14 anos
Ingressos: R$ 5 (à venda a partir de 04/03, às 10h)

O ESPETÁCULO COMEÇA RIGOROSAMENTE NO HORÁRIO MARCADO E NÃO É PERMITIDA A ENTRADA APÓS O INÍCIO, TAMPOUCO HAVERÁ TROCA E/OU DEVOLUÇÃO DO VALOR DO INGRESSO.

Mais informações e ingressos pelo SITE do Municipal. (Carta Campinas com informações de divulgação)

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