.Por Denise Argemi.
Desde o início Carola Rackete, comandante do navio Sea Watch 3, de propriedade da ONG alemã com o mesmo nome, Sea Watch, portando bandeira holandesa fez o que devia fazer: salvar as vidas das pessoas que transportava, um grupo de 42 migrantes resgatados em 12/06, em águas territoriais da Líbia, em péssima condições físicas. Inicialmente eram cerca de 53, alguns desembarcaram antes por razões médicas.
Com a proibição do governo italiano representado pelo ministro do interior e vice-premier Matteo Salvini, também líder da Lega Nord, partido de extrema direita que é notada e publicamente racista, machista, homofóbico e xenófobo, que negava o direito de o navio atracar e desembarcar os náufragos e migrantes que estavam Sea Watch, no porto de Lampedusa; e diante do bloqueio marítimo que a “Guardia di Finanza” havia montado, impedindo a passagem da embarcação, a comandante Rackete teve que permanecer ao largo durante dias, aguardando uma decisão positiva e humanitária que permitisse a passagem.
No entanto, as condições de saúde física e psicológica das pessoas resgatadas, todas negras, pioravam a cada dia. O que fez com que a comandante, sem saída, decidisse por romper o “bloqueio” e atracasse em Lampedusa, quase vindo a colidir com uma embarcação dos “finanzieri” durante a manobra.
E por essa razão foi presa, acusada de violar as águas italianas e o art. 1.100 do Código de Navegação: “resistência ou violência contra navio de guerra”, que prevê uma pena que vai de 3 a 10 anos de cárcere. A ONG Sea Watch, por sua vez, deverá pagar uma multa de 20 mil euros, segundo um novo decreto antimigrantes editado por Matteo Salvini.
Com relação à situação legal da comandante, podemos dizer que ela respeitou os deveres previstos no direito internacional, nas leis italianas, na Convenção de Hamburgo (1979), que trata da Busca e Salvamento Marítimos e na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (1982).
Essas convenções internacionais foram internalizadas por muitos países (com legislação própria dentro de cada país signatário) e são leis válidas e em vigor tanto dentro do território italiano quanto no brasileiro.
Não obstante a legislação internacional, essa Mulher respeitou direitos universais e fundamentais, dos quais a vida é o mais importante, pois sem ela nenhum outro pode subsistir.
Porém, no desembarque da comandante as opiniões se dividiram entre quem apoiava o ato de salvar vidas e quem a ofendia, dizendo que ela deveria ser estuprada por “aqueles negros” (link).
Como se percebe, o fato de uma mulher ter alguma autoridade e ser protagonista na esfera pública ainda incomoda alguns homens que não se furtam de proferir ofensas sexistas e machistas, ainda que depois venham se arrepender, como foi o caso do vídeo.
Esse comportamento ainda difuso em larga escala internacional diz muito sobre o quanto ainda temos que avançar em matéria de direitos, paridade e democracia.
De qualquer forma a União Europeia tem o dever de exigir da Itália o cumprimento das leis internacionais e a soltura imediata da comandante Carola Rackete.
Afinal, crime é matar e não salvar pessoas.
Denise Argemi é advogada, especialista em Direito Internacional Público, Privado e da Integração.