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Ou a esquerda controla seus haters ou o fascismo será duradouro no Brasil

Pequeno textão-desabafo sobre o caso Tábata Amaral X esquerda:

.Por Miguel do Rosário.

A insanidade está de volta. E infelizmente está vindo de setores da esquerda. A mesma que eu vi emergir contra Ciro Gomes no início do ano passado. Insanidade que acabou nos levando a Bolsonaro.

A propósito, para os “amigos” que vem me patrulhar aqui: não, não me arrependo do meu voto em Ciro no primeiro turno. Ao contrário, a realidade provou que Lula e o PT erraram tragicamente ao lançarem uma candidatura fictícia, fraudulenta, de um político que, todos sabiam, estava impedido legalmente de ser candidato.

(foto câmara federal – divulgação)

Se tivessem apoiado Ciro, não sei se teríamos vencido, mas as chances seriam bem maiores.

Isso é o que eu acho, mas não sou o dono da razão, e ouço e respeito quem não pensa igual.

Estamos todos no mesmo barco (que afunda rapidamente) e quem quiser tomar uma cerveja e conversar sobre o futuro, estamos aí.

Voltando à Tábata.

O ódio e o preconceito contra Tabata Amaral é completamente sem sentido. Pessoas inteligentes repetem clichês idiotas, tipo “Tábata é de direita”, sem a mínima preocupação com a incoerência e hipocrisia vindo de quem conhece a política brasileira.

Direita por que?

Tábata é contra casamento gay? Não, é a favor.

Tábata é contra facilitar o acesso às armas? Sim, é contra.

Tábata é a favor de uma política carcerária mais humana? Sim, é.

Tábata é a favor da expansão dos investimentos públicos em educação e pesquisa? Sim, é.

É a favor do Estado adotar políticas de distribuição de renda? É.

Ela se reivindica de esquerda? Sim, de centro-esquerda e progressista.

Onde é que Tábata é de direita? Alguém pode responder? Não, não pode, porque é dessas idiotices que se diz sem pensar.

Na verdade, o que eu percebo é a emergência do identitarismo mais bizarro e nocivo à política de todos: o identitarismo autoesquerdista. A pessoa se considera de esquerda, ou considera o outro de esquerda, não mais por suas ações e pensamentos, mas como uma questão de identidade. Eu sou de esquerda e ponto final! E o outro, o diferente, não é de esquerda! E ai de quem afirmar o contrário!

Esse binarismo é idiota e despolitizante.

E assim qualquer imbecil pode ser de esquerda: não precisa estudar, não precisa fazer nada de concreto ou objetivo, basta dar alguns likes em algum post de alguma campanha partidária.

O ódio é tão grande que extravasa e acaba se voltando contra qualquer um que a turba acha que está “do outro lado”. E aí se volta contra o Cafezinho e contra minha pessoa.

Muita gente se acovarda diante dessas ondas de linchamento. Alguns aceitam-na, incorporam-na. Justificam-na.

Eu não. Eu acho que isso é antidemocrático, antipolítico e antiprogressista. E foi essa cultura que elegeu Bolsonaro.

Como essa onda vem sobretudo de setores do PT, seria um sinal de generosidade que as lideranças do partido agissem explicitamente no sentido de neutralizar esse tipo de coisa. Ou então não venham falar em “união da esquerda” ou “frente democrática” e outras platitudes do gênero.

Por parte do PSOL, já houve vários sinais neste sentido. Parlamentares do PSOL fizeram fotos ao lado de Tábata e Marcelo Freixo acaba de elogiar a deputada numa entrevista ao El País (o que inclusive lhe valeu um desses hilários ataques do PCO, o capanga do lulismo).

Percebendo a estranha onda de ódio sectário, o governador Flavio Dino também teceu elogios à deputada em suas redes sociais.

O PT não pode se fazer de sonso. Ou neutraliza os ataques da militância petista à Tábata, ou depois não venha reclamar das ferroadas dos trabalhistas e de Ciro Gomes, que naturalmente irão defender a sua correligionária.

Os patrulhadores e linchadores pensam a política sob um paradigma radicalmente schmittiano, de amigo X inimigo. Se é meu “amigo”, pode tudo, pode nomear Levy, pode tirar foto com Maluf, com Doria, pode ser aliado de Cunha. Se é meu “inimigo”, pode-se usar qualquer jogo sujo para destruí-lo, pode-se usar um paradigma ultrarradical, que nunca se usou para julgar os “amigos”, para condená-la e fuzilá-la sumariamente.

Um amigo veio com papo complicado de que a Tábata está preocupada com “eficiência”, o que seria um “marco liberal”.

De novo, isso é loucura! Eficiência não tem ideologia. Nem Tábata pode ser resumida a só “eficiência”.

Só porque ela tem cara de competente e “eficiente”, é de direita?

Agora, ela é esperta, no bom sentido, e procura encurralar os neoliberais do governo, como foi o caso de sua voadora no ministro da Educação, com cobranças de eficiência que, ela sabia, iriam repercutir na mídia liberal e provocar danos irreversíveis ao governo.

Dito e feito. Algumas semanas depois do episódio, o ministro foi demitido.

Ainda sobre esse episódio, porém, seria injusto dizer que a fala de Tábata se limitou a “cobranças de planejamento estratégico”.

Ora, não é verdade. O momento mais dramático da fala de Tábata foi quando ela confronta o ministro com a sua história pessoal, lembrando que perdeu o pai e amigos para violência e drogas, e que tinha convicção de que se eles tivessem tido acesso à educação pública de qualidade, isso não teria ocorrido. Foi uma fala classista, de uma verdadeira trabalhista!

De qualquer forma, a esquerda não pode delirar ao ponto de jogar conceitos como “eficiência” para a direita.

Mao Tsé Tung já avisava: sejamos revolucionários E TÉCNICOS.

A garota veio de família miserável, a família ainda vive em casa de ocupação. Sua militância é inteiramente voltada para melhorar a educação pública brasileira.

Não é justo chamar Tábata de neoliberal.

Neoliberal, me desculpem, é quem nomeia Levy para o ministério da Fazenda, Cardoso para a pasta da Justiça, Paulo Bernardo para Comunicação, e sanciona as leis da Ficha Limpa, da delação premiada, e assiste, impassível, a população carcerária quadruplicar no país.

E não, ela não defende a reforma de previdência de Bolsonaro. Isso é mais uma das mentiras abomináveis que se usam contra ela.

Ela apoia uma reforma da previdência justa, com base na proposta do Mauro Benevides, deputado federal de seu próprio partido.

Ah, ela quer fazer “ajustes” na proposta de Bolsonaro. Meu caro, isso é política. O jogo é fazer o máximo possível de ajustes, de maneira a preservar o regime de repartição, isolar a capitalização apenas como um complemento. Enfim, conter danos e melhorar a reforma.

O objetivo não é dar o grito de “ganhei”, ou pior, fazer um teatro político que visa justamente perder mas com aura “heroica”.

Se ao cabo, Bolsonaro gritar “ganhei”, mas a reforma da Previdência aprovada tiver sido devidamente aparada, cortada, ajustada, com o regime de capitalização convertido em apenas complementar, com a preservação da aposentadoria rural, com ajustes no tempo de transição, então a oposição terá sido vitoriosa!

Nesse ponto, acho a Tábata bem menos “bobinha” do que seu rostinho angelical, meio infantil, deixa transparecer.

Ela está entrando firme no debate da reforma, chamando-o para si, sinalizando abertura ao diálogo, o que lhe permite acumular capital político para defender o que ela acredita, tanto no campo da reforma quanto em outros.

O objetivo de uma oposição propositiva é conter danos, ampliar a base de apoios e ajudar o país a fazer a transição desse regime policialiesco, fascistoide, que entramos, por conta de todos os erros que NÓS, da esquerda, cometemos, para uma fase posterior, de normalidade democrática, racionalidade pública e crescimento econômico.

Não concorda com a Tábata? Natural. Mas tenham respeito, ao menos.

E usem a razão, leiam um pouco mais sobre ela. Divirjam democraticamente, sem promover linchamento e fake news.

É óbvio que, na atual conjuntura, uma liderança política progressista, com capacidade (em virtude de seu próprio talento e capital político) de penetrar em nichos da opinião pública até então fechados para a esquerda, é um tesouro!

O Haddad não estava tentando, no segundo turno, obter o apoio de Fernando Henrique Cardoso e Joaquim Barbosa? Não tentou furar a bolha da esquerda? Não tiraram o vermelho da campanha, mudaram as cores, e fizeram de tudo para conquistar o centro?

Só o PT pode fazer? Ninguém mais? E isso só vale na campanha, e não no processo político? O interesse é só ganhar eleição, e que se dane a política?

Qual a lógica de se falar em “frente democrática” e se tentar isolar Tábata Amaral?

Eu tenho minhas críticas, duras, à Tábata.

Eu, por exemplo, acho que ela e o Movimento Acredito erraram feio ao dar crédito (não hoje, mas há dois meses) àquele picareta e agente da CIA, Juan Guaidó.

Ora, mas não foi só a Tabata! Foi o planeta inteiro, incluindo aí toda a esquerda europeia e americana.

Quem acabou segurando Maduro foi o Putin, que é um cara de de direita, mas que tem interesses geopolíticos contrários ao imperialismo.

Da minha parte, sinto imensa admiração por essa garota, que considero corajosa e progressista, uma verdadeira joia da política nacional.

E se eu divergir dela, será com respeito e educação, como faço com qualquer político de quem discordo.

Que venham os haters.

(Do facebook de Miguel do Rosário)

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