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Por que você, Chico Buarque? 

.Por Luís Fernando Praga.

Para você, que admira o Chico Buarque, gosta de suas músicas e se emociona com sua poesia, mas não entende como ele pode ser tão idiota a ponto de defender pessoas como Dilma Rousseff, eu vou tentar explicar.

O Chico Buarque também acha que a Dilma realmente não fez um governo muito bom, mas o Chico entende que havia um ambiente hostil que inviabilizava qualquer tentativa de se governar em prol do País.

O que o Chico chama de “ambiente hostil” foi criado em decorrência de uma junção de fatores históricos que, se você não procurar entender, aí é que você não vai entender nunca mesmo:

Chico Buarque sabe que, entre 2003 e 2016, o País teve a experiência de governo mais à esquerda de toda a sua história, isto é: antes de 2003 fomos governados, durante 503 anos, apenas por quem representava os interesses dos colonizadores e da elite econômica; e se curvava a tais interesses.

Claro, depois que viramos uma república, todos diziam que queriam o melhor para o povo e que iriam governar para o povo, porque é o povo quem elege político, mas a verdade histórica é que todos os nossos governantes, até a chegada de Lula, vinham da elite ou representaram prioritariamente os interesses da elite. Isso tá lá na história, é só olhar.

Em 2002, além do fato de que o povo já vinha um pouco desanimado com os governos de direita, a esquerda resolveu se flexibilizar e se aliar a setores da direita.

Alianças com setores da direita, visando à eleição e à governabilidade, já eram naturais desde 1889, mas com a esquerda era a primeira vez.

Dessa forma, sem desagradar por completo os interesses do empresariado, dos banqueiros e da rede globo, pela primeira vez um miserável flagelado da seca, um cara a quem o Chico conhece muito bem, assumiu um posto até então reservado a “filhinhos de papai”.

O Chico Buarque (que também é filhinho de papai, não é pecado, pecado é não pensar e deixar a vida escapar) entende que aquele nordestino, desde sempre odiado por muitos, pois é natural que após 503 anos sob o jugo da direita, a população do país aprenda o preconceito racial, social e a xenofobia, conseguiu realizar uma série de transformações de caráter social naquele país, modeladado pela direita por tanto tempo.

A economia prosperou, os bancos lucraram, miseráveis saíram da miséria e começaram a movimentar uma economia até então latente, o Brasil pagou a dívida externa, tornou-se a 6ª maior economia do mundo, os amigos não desfaziam as amizades e uma seca que assolava o Nordeste havia séculos deu mostras de que não era, assim, tão impossível de se combater e de que não era, assim, tão “a vontade de Deus”.

Diferente de você, Chico Buarque acredita que o fato de Lula ter, nalgum momento de sua trajetória, se aliado a setores retrógrados da direita não faz com que Lula se torne “mais do mesmo”, como a mídia faz questão de distorcer e frisar, para que seu cérebro absorva por osmose, você aceite como verdade e se torne parte do senso comum.

A direita, a elite predatória e seus representantes não esperavam que o governo daquele ex-metalúrgico a quem muitos já odiavam desse tão certo e que ele viesse a conseguir uma aprovação popular histórica de mais de 70% ao fim de seus dois mandatos.

O Chico Buarque pensa que os casos de corrupção, naturais num país colonizado, explorado e refém do capitalismo, continuaram acontecendo no período entre 2003 e 2016, quase como vinha sendo desde 1500. A diferença era que, para governar pelo bem do País, e não pelo interesse da elite, o governante precisava tentar combater a corrupção e não se aproveitar dela, o que seria uma mudança profunda na estrutura do poder vigente.

Chico enxerga que a Operação Lava Jato, iniciada em 2014, no governo Dilma, indicou inúmeros beneficiários da corrupção no país, muitos deles, beneficiários de longa data, que, ao perceberem que não conseguiriam mais derrotar a esquerda nas urnas e que, caso se tornassem susceptíveis à justiça e não imunes às implicações das investigações da Lava Jato, sua liberdade e sua “mamata” hereditária estariam seriamente ameaçadas.

Nosso poeta acredita que uma classe política já habituada a dar golpes, um congresso nacional historicamente corrupto e financiado por corporações capitalistas, uma grande mídia formada por algumas das maiores corporações capitalistas de nosso país e um sistema judiciário que sempre prendeu pobres e protegeu ricos, a fim de não permitirem que caísse por terra a já consolidada prática do “é dando que se recebe”, tornaram o panorama político do Brasil ingovernável para Dilma Rousseff e para a esquerda.

Talvez você ainda não tenha notado, mas o Chico Buarque por certo percebeu que, a partir da reeleição de Dilma, em 2014, “figurinhas carimbadas” da corrupção em nosso país vestiram a roupa de gente de bem e, como se tivessem ensaiado, se utilizaram da mídia e das redes sociais para bombardear de acusações e disseminar mentiras e fake news sobre a esquerda, muitas delas, hoje já desbaratadas.

Chico Buarque se recorda de que era muito comum ver políticos bastante tradicionais e conhecidos, investigados por corrupção, por tráfico de drogas, por lavagem de dinheiro, por “caixa dois”, por contas ilegais no exterior; todos citados na Lava Jato e devidamente apelidados na lista de propinas da empreiteira Odebrecht, dizendo na mídia que “Só tem uma medida capaz de acabar com a corrupção no Brasil: é tirar o PT!”.

O Chico não se esquece de que uma verdadeira horda de saqueadores históricos do dinheiro público se uniu a fim de destruir a imagem do Lula, da Dilma e do PT, empurrando para estes a paternidade de toda a corrupção nascida em solo nacional.

Você pode não ter tido acesso, mas o Chico teve e está disponível na internet e nos anais da História, a um áudio em que Romero Jucá (o Caju, na lista das propinas da Odebrecht, onde não constam os nomes de Lula nem de Dilma) intitula a ação dessa horda de saqueadores do dinheiro público de “UM GRANDE ACORDO NACIONAL, COM O SUPREMO E COM TUDO, PARA ESTANCAR ESSA SANGRIA E BOTAR O MICHEL LÁ”.

É possível que você não se lembre, mas você foi às ruas e bateu nas panelas quando a rede globo e o MBL pediram. Hoje o MBL tem diversas páginas bloqueadas no facebook por divulgação de notícias falsas. Você chamou o tal “grande acordo nacional com o supremo e com tudo”, promovido pelo Jucá, pelo (P)MDB, PSDB e suas principais lideranças, de “impeachment da vagabunda”.

A seu lado esteve a grande maioria do congresso nacional, lembra? “Por Deus, pela moral, pela família, pela honestidade, pelas criancinhas”, tá se lembrando?

O Chico Buarque prefere chamar de “GOLPE”, porque golpe é quando um sai enganado e o outro beneficiado.

Você pode não ter vontade de investigar, mas o Chico Buarque, amigo pessoal de Lula há muitos anos, sabe que, antes da prisão, Lula vivia no mesmo apartamento de classe média, bem mais simples que o do próprio Chico, havia mais de 20 anos. Chico, que vai regularmente a Paris, sabe que Lula não tem apartamento por lá, que Dilma não enriqueceu ilicitamente, que nenhum dos dois ostenta posses ou bens materiais e que as pedaladas fiscais que derrubaram Dilma nunca antes haviam derrubado ninguém, que todos as cometiam, que não eram crimes de responsabilidade e que, tão logo o novo governo golpista assumiu, tratou de mudar a legislação para que se pudesse “pedalar” livremente… Como sempre.

Chico Buarque também sabe que Lula jamais possuiu um triplex no Guarujá e que não se beneficiou da virtual posse desse imóvel; entretanto, Chico percebe o quanto os demais envolvidos nas denúncias de corrupção da Lava Jato, muitas já comprovadas através de vídeos disponíveis a todos, se beneficiam do engodo do triplex, da prisão da maior liderança da esquerda brasileira, do impedimento de Lula disputar as próximas eleições e da injustiça seletiva promovida pelos juízes e procuradores da operação, com o supremo e com tudo.

Para o Chico, Lula é inocente, porque Chico conhece Lula e porque não há provas que confirmem a posse do apartamento, o mundo sabe que não há provas; e está claro que condenaram um homem sem provas com o objetivo de inutilizá-lo politicamente e desviar o foco, a fim de proteger gente a respeito de quem não faltam suspeitas e provas de delitos muito mais contundentes que aquele apartamento que nem proto está.

O que pesa contra Lula, no caso do apertamento que motivou sua prisão, além da má vontade do judiciário, da mídia e dos políticos envolvidos no golpe; é apenas a predisposição em condenar e o desejo de punir que gente como você, não gente como o Chico, nutre ardorosamente contra o Lula.

Perante o desejo alucinado, demonstrado por parte de nossa sociedade, de punir um inocente e seguir o script do golpe, Chico prefere tirar fotos com a Dilma, sorrindo e cheio de esperança, porque ele se sente seguro ao lado dela, confia nela e conhece a sua história. Chico evita a proximidade com políticos e pessoas golpistas porque não confia, não se sente seguro ao lado deles e também conhece suas histórias: eles se fingem de bons cidadãos e caluniam, ofendem, mentem, louvam à ignorância, roubam, matam, perpetuam a escravidão, odeiam, golpeiam e, na visão do Chico Buarque, não acrescentam muitas coisas boas.

Francisco Buarque de Hollanda, filho de um historiador e de uma pianista, é um artista consagrado e de renome internacional. Ele é querido e respeitado por milhões de brasileiros e de estrangeiros. Hoje ele é um senhor de 74 anos com mais de 50 discos gravados, 9 livros publicados, 5 peças teatrais, vencedor do “Prêmio Jabuti”, do Grammy e de diversos prêmios internacionais; é também o criador da frase “deixa o ódio pra quem tem”.

Recentemente o Chico Buarque, a Dilma Rousseff, o Luiz Inácio Lula da Silva, eu e tantas outras pessoas que chamam de “GOLPE!” e não de “impeachment da vagabunda”, fomos, e ainda somos, covardemente agredidos, ofendidos e hostilizados por pessoas que sentem mais ódio que vontade de entender.

Pronto, ta explicado o motivo pelo qual o Chico se sente bem, e nada envergonhado, ao sair na foto com a Dilma. Só não sei explicar por que eu ainda tento explicar alguma coisa pra quem chama o Chico de idiota, acho que é algum instinto da esperança.

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