No mês seguinte, um grupo de extermínio, também formado por policiais militares, assassinou 21 pessoas em Vigário Geral, favela da Zona Norte da cidade. Essas chacinas, assim como a Chacina de Acari em 1990, contribuíram para estabelecer a reputação da polícia do Rio de Janeiro como uma das mais violentas do mundo.
Na época, a Anistia Internacional denunciou as violações em relatórios e campanhas e se juntou ao movimento de familiares na mobilização por justiça. Hoje, após 25 anos, policiais e outros agentes do estado ainda atuam de forma organizada através de grupos de extermínio e milícia, sendo um dos principais responsáveis pela extrema violência do Rio de Janeiro.
Segundo diversas pesquisas, estes grupos passaram a ter um projeto político e seus membros a ocupar cargos públicos no aparato estatal para interesses próprios, ampliando ainda mais seu poder. Os grupo de extermínio já tem até representante que pretende disputar a Presidẽncia da República, que defende abertamente a transformação de policiais em assassinos como forma de se fazer justiça. Depois de mais de 20 anos das chacinas, estas milícias continuam atuando e, segundo investigação, são responsáveis pelo assassinato de Mariele Franco (PSOL), vereadora do Rio de Janeiro.
“A letalidade da polícia era estimulada por políticas como a chamada ‘gratificação faroeste’, espécie de prêmio financeiro por bravura que era medido inclusive pelo número de pessoas mortas, e por declarações públicas de autoridades que contribuíam para naturalizar as execuções extrajudiciais. Ao invés de orientar a polícia para proteger e preservar a vida, o estado reforçou o entendimento de que o papel da polícia era matar. Algo que perdura até os dias de hoje”, afirma Jurema Werneck, diretora executiva da Anistia Internacional.
A Chacina da Candelária trouxe à tona ainda o debate sobre a numerosa população de crianças e adolescentes em situação de rua. Três anos antes, em 1990, o Brasil aprovava o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), um dos mais importantes avanços do marco legal regulatório dos direitos humanos. Desde então, apesar do avanço no marco legal, ainda há uma enorme lacuna na sua implementação pelo Estado.
Movimento de mães de familiares de vítimas da violência policial
Em reação à enorme violência dos agentes do estado, surgiu um forte movimento, o de mães e familiares de vítimas da violência policial. Organizadas no luto e na busca por justiça das três marcantes chacinas da primeira metade da década de 1990, os grupos ganharam força nos anos 2000 ampliando as redes de suporte e solidariedade.
O acolhimento entre as mães, o acompanhamento detalhado dos casos e a pressão por justiça as tornaram agentes fundamentais na mobilização por uma segurança pública que respeite direitos humanos. São mães que se caminham juntas para que a violência que ceifou a vida de seus filhos não alcance outras famílias. O movimento também denuncia o caráter estrutural e racista da atuação das forças de segurança do estado, que tem como consequência o extermínio da juventude, especialmente negra, de favelas e periferias.
Assim, este tema, que em geral é tratado com indiferença na agenda pública nacional, ganha visibilidade. Ao promover debates, marchas e atos públicos as mães e familiares de vítimas demonstram com fatos e relatos pessoais a urgência de uma nova política de segurança pública que valorize a vida.
“Todos os anos, acontecem mobilizações para lembrar a Chacina da Candelária. É fundamental que toda a sociedade se mobilize ao lado das redes de mães e familiares de vítimas da violência para romper com a lógica de guerra que pauta as políticas de segurança pública e que resulta no extermínio da juventude negra brasileira”, conclui Werneck. (Com informações de divulgação)