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Um mergulho interior com Anelis Assumpção

 

.Por João Augusto Neves.

O show de Letrux no Sesc Campinas na quinta-feira [05/04/2018] foi maravilho, o climão era de prazer em meio as ansiedades. Seu espetáculo foi imprescindível para o momento. Precisávamos respirar, nos liberar, pois a sexta e o sábado seguidos foram de luta. Sabíamos disso, ou pelo menos imaginávamos o que poderia ocorrer, por isso dançamos, soltamos o corpo e dissemos: “accept all happiness from me”. LULA LIVRE!

Entre uma canção e a outra, Letícia Novaes revelou ao público que sua Lua é em Touro. Confesso que nada entendo de astrologia, o pouco que sei aprendi com minha amiga Isabela Amaral, mas tenho algumas noções sobre as coincidência, ou acidentes históricos, no universo musical. A referência dada por Letícia de seu mapa astrológico, por exemplo, pode nos dizer muito da REVOLUÇÃO sentida nos tempo atuais.

No acender das luzes deste incerto ano de 2018, Anelis Assumpção evoca os sentidos de Tauros e começa, já na desconcertante imagem do álbum, anunciado as misturas, com requintes femininos, que alimentaram seu trabalho. O mistico, o sagrado e o profano. A mulher, as frutas – proibidas, é claro – e o animal, (de)compõem os sons de Taurina. Para começo de conversa>>>>>

“Senta aqui comigo nessa pedra

Descobre teu drama

meu sangue rio escorre

vamos dar um mergulho interior”

A moça nos convida a entrar em seu percusso narrativo por meio de nosso interior subjetivo. A face do indivíduo, ignorada frente nossas vontades materiais, é excitada e temperada nas primeiras frases do disco. Um pequeno desvio de olhar nos faz observar que essa filosofia se aproxima – e muito – de algumas anarquistas que no começo do século XX, mediante os regimes totalitários, bradavam que “o único objetivo legítimo da sociedade é prover as necessidades do indivíduo e ajudá-lo a realizar seus desejos” (Emma GOLDMAN. O indivíduo, a sociedade e o Estado. São Paulo, Hedra, 2017, p. 44).

A relação entre anarquismo, Letrux e revolução se repetem na segunda faixa do disco. Da mesma forma que a Tijucana deu voz à liberdade sexual entre mulheres, confessando o estrago de prazer feito por uma outra, Anelis revela em Chá Jasmim – letra escrita em parceria com a falecida irmã Serena – os conflitos amorosos no qual o gozar não é compartilhado. Além da presença marcante do contrabaixo e trombone, a canção traz à tona o íntimo, revelado em diálogo via whatsapp, das cantoras Tulipa Ruiz, Céu, Karina Buhr, Ava Rocha e Laís Sampaio. A composição destila amor, raiva e descontração entre suas colagens e mixagens.

De “segunda a sexta”, tudo fica mais complexo.

O disco regido pela Natura Musical abre espaços para ousadias artísticas. Lembra do novo na velha indústria musical? Nas brechas do capitalismo cibernético, o simples pode ficar incrivelmente interessante. Enquanto alguns gastam uma nota preta com videoclipes, Anelis, com apoio de Isadora Gallas, Tulipa Ruiz, Vitor Hugo e Liniker Barros, dá outros sentidos para os dias da semana e as pinturas tidas como blasé na história da arte.

As parcerias e os encontros são múltiplos, talvez uma das maiores características da família Assumpção. Dos já citados, como letristas, somam João Donato, Russo Passapusso, Saulo Duarte, Rodrigo Campos. Entre músicXs e produtorXs mais uma dúzia são convidadXs para deixar suas marcas na constelação taurina. Aquelxs que estão próximos é a graça de ser mortal?

A mais forte presença, no entanto, é da irmã, sempre pulsante no disco. O Gosto Serena vai das letras às melódias colocando-nos diante do universo lírico de Anelis.

No final da poesia musicada para a irmã, ela pergunta:

“Um coração inteiro é meio complexo? Florada de laranjeira tem cheiro de amor ou lima? Beterraba e coração cabem na mesma paleta de cores? Ou são ilusões servidas fatiadas? Laranja seleta, vitamina quem prova ou espia?”

E a dúvida contínua em Paint my Dreams:

“Seu azul só eu vejo porque se quer existe na paleta de Deus. Deus se quer existe? Ou o azul é Deus?”

Percebemos a cada faixa que as frutas, cores e temperos na imagem da capa, pintada por Camile Sproesser, participa do TODO formado por, ritmos, melodias e harmonias do mundo cibernético. Taurina revela o quanto nossas mensagens de texto e áudio dos meios de comunicação atuais – Whats, Instagram e Facebook da vida – espremem emoções. [TENHO QUE DESLIGAR ESSA PORCARIA QUANDO COMEÇO A ESCREVER]. No disco ouvimos as experiências com os instrumentos eletrônicos como Mellotron, Synth e Samples interagirem com as vozes gravadas em Smartfones.
A arte capta os sentimentos, a filosofia tenta traduzi-los em conceitos. O capitalismo eletrotécnico, vai longe. Taurina fez com seus códigos Arte, mas desculpe amigxs, a prisão de Lula, apesar de grave e doloroso, é só mais uma onda do tsunami capitalístico. A moral do consumo está sistematizada e programada em nossas subjetividades em perigosas criptografias. Faça um mergulho interior e reconecte os circuitos. Que gosto isso tem? Amargo, um tanto quanto acido.

(Eu poderia gravar um áudio com meus gritos de agonia e colocar um link aqui, a Carta Campinas talvez entregaria essa correspondência para meus leitores. Nossa raiva precisa escapar, ganhar as ruas e dar forma para outr@s possíveis. No México quando tentaram calar o fato de 43 desaparecidxs, algo do tipo veio à tona:

É o que sinto. Ontem, hoje e amanhã. Com o peito aberto, após gritar e secar as lágrimas, sento em uma pedra para descobrir meus dramas.

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