.Por Sandro Ari Andrade de Miranda.
“Racismo Ambiental” é um conceito ainda pouco utilizado pela doutrina jurídica, embora sua prática, no Brasil, seja comum. Em síntese, consiste na violação dos direitos e garantias fundamentais das comunidades tradicionais por parte do estado ou de empresas, por meio da aplicação seletiva das regras ambientais, inclusive violando normas e acordos internacionais.
Um exemplo comum é a realização de grandes obras públicas ou empresariais em territórios ocupados tradicionalmente por povos indígenas, quilombolas, mateiros, ribeirinhos, pescadores, extrativistas, agricultores, dentre outros, sem considerar seus hábitos, tradições, conhecimentos, cultura e a própria noção de território.
O território, por sinal, é um dos mais importantes elementos para a sobrevivência destas comunidades pois não é formado pelos quadriláteros dos mapas, mas por referências físicas e simbólicas só identificáveis materialmente e protegidas pela Resolução 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT.
Pois tanto o preâmbulo, quanto o Artigo 8º, alínea “j” da Convenção da Diversidade Biológica das Nações Unidas – CDB, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 02, de 1994, estabelecem que compete ao Estado Brasileiro “respeitar, preservar e manter o conhecimento, inovações e práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica, e incentivar sua mais ampla aplicação com a aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento inovações e práticas”. Tal norma, de acordo com o § 2º, do art. 5º, da Constituição Federal, constitui direito fundamental inviolável, inalienável e de observância obrigatória, se sobrepondo a qualquer interpretação embasada em norma infraconstitucional.
Todavia, este não é o entendimento da Polícia Federal de Foz do Iguaçu, no Paraná, que prendeu 5 integrantes da comunidade da Reserva Mokoi Joegua pelo corte de um bambu nativo, chamado de taquara, no Refúgio Biológico de Itaipu, na cidade Santa Helena.
O argumento apresentado tanto por policias, como pela própria administração da Hidrelétrica, seria de que os índios estão ocupando “ilegalmente” área na margem do Refúgio, enquanto a empresa trabalha com a FUNAI pelo seu reassentamento. Detalhe: o espaço da Reserva é considerado insuficiente para o tamanho da comunidade.
Ocorre que além de presos por um crime que não existe, pois o art. 38, da Lei 9605/1998 não tem valor diante da CDB, existem denúncias de violações físicas e morais dos presos, chamados de “paraguaios” pelos policiais federais. Também foi fixada fiança extorsiva, de R$ 1.000,00 para cada um, mesmo que um destes “sequer tenha chinelos”, como narrou o advogado do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu – CDHMP.
Enquanto isto, milhares de hectares de floresta nativa, do Bioma da Mata Atlântica, todos os anos são destruídos no próprio Paraná para a expansão do agronegócio e de grandes empreendimentos imobiliários e, para estes, não existe punição.
Sandro Ari Andrade de Miranda é advogado e mestre em Ciências Sociais