Para Saviani, um dos pontos chaves que provocou o golpe foram os interesses econômicos do sistema financeiro. Ele ressaltou, em entrevista ao jornal Brasil de Fato, que o foco na dívida e nas contas públicas, pós-golpe, foi para fazer caixa, para fazer o superávit primário, para o pagamento dos bancos.
“Isto levou àquela emenda constitucional, a chamada PEC do Fim do Mundo, que congelou por 20 anos os gastos públicos, limitada apenas à inflação do ano anterior. Então, isto inviabiliza o Plano Nacional de Educação (PNE) porque as metas do plano estão vinculadas aos recursos financeiros. Uma das metas principais, a meta 20, que determinava atingir 7% do PIB [para o investimento na educação] nos primeiros cinco anos, chegando a 10% ao final do período de dez anos. Como o plano foi aprovado em 2014, então a meta de 10% do PIB, deveria ser atingida até 2024″, disse.
Para Saviani, que é considerado o criador da chamada Pedagogia Histórico-Crítica e já recebeu o prêmio Jabuti, a aprovação da emenda constitucional por 20 anos, impedindo investimentos públicos, e iniciando-se a partir de 2017, conduz a limitação do Plano Nacional de Educação até 2037. “Como o plano vence em 2024, as metas ficaram inviabilizadas; algumas delas que deveriam ser atingidas no prazo de 2 anos, portanto em 2016, já venceram e não foram atingidas, e aquelas cujo vencimento se estende até 2024, também estão inviabilizadas por conta dessa PEC”, afirmou.
Segundo o professor, a reforma do ensino médio proposto pelo governo Temer (com o apoio dos partidos evangélicos e do PSDB), implica um retrocesso para a década de 1940, quando estava delimitada a formação profissional de um lado e a formação das elites de outro.
“Em 1942, o decreto que é conhecido como Lei Orgânica do Ensino Secundário, determinava que o ensino secundário se destinava às elites condutoras, e nesse mesmo ano de 1942, foi baixado um outro decreto, conhecido como Lei Orgânica do Ensino Industrial, regulando o ensino industrial, com o mesmo período de duração do ensino médio, quatro anos de primeiro ciclo, chamado ginásio, e três anos do segundo ciclo, o colegial, para formar os chamados técnicos de nível médio. Se o ensino secundário era destinado às elites condutoras, infere-se que o ensino profissional era destinado ao povo conduzido. Em 1942 foi a Lei Orgânica do Ensino Industrial, e em 1943 a do Ensino Comercial, depois em 1946 saiu a do Ensino Agrícola”, contextualizou.
Para ele, a reforma atual comete um absurdo ao atribuir ao adolescentes de 15 anos, a responsabilidade de definir o seu percurso, os seus projetos de vida.
“Como é que um adolescente de 15 anos vai ter um projeto de vida para poder escolher já entre os cinco itinerários, àquele que corresponde ao que ele pretende desenvolver na sociedade? Nós sabemos que os jovens de 18, 20 anos que ingressam no ensino superior não têm clareza ainda da opção (…) Por detrás disto está o entendimento de que a grande maioria vai para aquelas profissões de caráter não-intelectual, que implica maior precariedade e salários mais baixos. Então, a diferença entre as elites condutoras e a população trabalhadora de modo geral, proclamada lá na reforma de 1942, tende a se acentuar com uma proposta como essa”, afirmou. (Veja no Brasil de Fato a entrevista)
Coincidentemente, a reforma trabalhista também retrocede para 1942, quando foi criada a Consolidação das Leis Trabalhistas e há também tentativas de criminalizar a mulher em casos de aborto que remontam ao código civil anterior à década de 40.