.Por Luís Fernando Praga.
Cresce o número de pessoas e grupos atuando de forma a oprimir a liberdade de ser de outras pessoas e grupos.
É gente oprimindo gente por ser homo, bi, trans ou pansexual, por ser negro, por ser índio, por ser nordestino, por ser mulher, por ser umbandista, por ser pobre, por ser de esquerda, por ser de direita, etc.
Convencionou-se chamar a esse tipo de atitude de “atitude fascista”. Como cresce a ocorrência desse tipo de atitude em nossa sociedade, convencionou-se dizer que “cresce o fascismo em nossa sociedade”.
Muitas vezes quem oprime não se dá conta de que aquilo que outra pessoa é nem sempre é uma questão de escolha, e que, quando é questão de escolha, a escolha “do outro” é do outro, não tem que ser igual à sua. Aceitar o outro como o outro é chama-se tolerância. Não aceitar chama-se intolerância e a intolerância é base do pensamento fascista.
Os oprimidos, considerem os fascistas correto ou não, sempre reagirão, com as armas disponíveis, à violência do opressor. Isto é estabelecer território e lutar pela auto preservação.
Nosso momento histórico representa o apogeu da intolerância numa sociedade, um passo antes que confrontos de maiores dimensões venham à tona para “acomodar” as coisas de forma muito violenta e com muitas perdas.
As pessoas reagem a este momento histórico de diferentes maneiras.
Há pessoas que não concordam em que esse tipo de atitude esteja crescendo. São os fascistas enrustidos, que, hipocritamente, não contam pra ninguém, mas torcem pelos intolerantes. Ou são os cegos manipulados, que assistem novela, futebol e jornal nacional, e isso não deve soar ofensivo, pois todos enxergamos de acordo com nossas influências e limitações. Ou é gente que não entende ou não acredita em estatística.
Há pessoas que sabem do avanço fascista, torcem abertamente por ele e atuam diretamente pelo seu avanço. São os fascistas “raiz”, assumidos e orgulhosos de suas vastas crueldade e ignorância.
E há pessoas que entendem a gravidade do que está acontecendo, mas se visualizam num país distante e maravilhoso, dentro de seus condomínios, onde o mal não acontece. Essas pessoas são “mudinhas” de fascistas. Elas enxergam a injustiça, não fazem nada a respeito, fingem que são imunes à praga, mas, pelo menos, ainda não queimam índios.
Essas pessoas são muitas, todas ali, na estufa do sistema, sendo cultivadas aos milhões. Elas não sentem a semente do fascismo sendo introduzida em suas vidas e propagam a cultura do “foda-se, oprimido!” ao replicarem argumentos sem base científica ou histórica, argumentos ignorantes e preconceituosos, muitas vezes ensinados na escola.
Essas pessoas não enxergam a violência de uma piada racista, num país onde mais da metade da população é negra; dessa parcela, mais da metade é pobre ou muito pobre, pois vem de uma cruel escravidão, separada deste “hoje” por não mais que 4 ou 5 gerações; num país onde mais de 60% da população carcerária é negra, julgada por esses brancos que hoje conduzem os rumos do País, um país onde é de apenas 5% a representatividade dos negros nos congresso nacional.
Entre as “mudinhas” de fascistas há aquelas que respeitam o negro, mas batem na mulher. Há as que respeitam o negro e a mulher, mas odeiam gays. Há as que gostam de todo mundo, mas morrem de medo de comunistas… e medo vira ódio fácil, fácil.
As combinações da intolerância são infinitas e não escolhem seres humanos. O comportamento fascista está presente em gente da esquerda e da direita (mas a direita gosta mais, isso é estatístico), está presente em ateus e em religiosos (mas os religiosos gostam mais; ô, se gostam!), está presente em miseráveis e em poderosos (mas os poderosos são, de longe, os que mais adoram!).
Todos nós, que fomos criados neste sistema e que estudamos nas escolas que este sistema colocou à disposição de nossos pais, avós, bisavós etc., estamos expostos à contaminação pela sementinha do fascismo, porque plantada ela foi; resta saber se germinou e, se germinou, resta saber se o “dono da terra”, se cada cidadão, como dono de sua própria consciência e de suas próprias ideias, vai deixar que cresça ou se trabalhará duro na poda.
“Piadinhas” (como se o diminutivo as tornasse inofensivas) racistas, sexistas, machistas e que visam a fazer graça com o oprimido ao invés de desqualificar o opressor, são fertilizantes do fascismo disfarçados, que “passaram batido” pela minha própria vigília por muitos anos, mas não quero que isso continue assim.
Há pessoas que lutam contra o avanço do fascismo em nossa sociedade, mas se descuidam daqueles pequenos e tenros brotinhos de fascismo que crescem, desapercebidos, naqueles cantinhos escuros onde a ignorância, o medo e a vingança adubam a terra dos pensamentos.
A polarização social, as amizades desfeitas e a incompatibilidade de lado a lado são consequências históricas que não podem mais se resolver com simples pedidos de desculpas nem com um churrascão para se colocarem panos quentes e deixar tudo pra lá, mas com a firmeza de posicionamentos, clareza de princípios e com transformações profundas.
A dualidade a ser colocada sobre a mesa agora é a seguinte: você luta contra o avanço do fascismo em todas as suas vertentes ou não?
Esta resposta é a mais importante no momento, pois o seu posicionamento perante a pergunta evidenciará se você atribui mais valor a coisas ou à vida humana. Se você abrir mão de colocar a vida humana em primeiro lugar, você será uma ameaça direta e constante à minha sobrevivência (sou ser humano) e não haverá como compactuarmos. Sempre estarei na defensiva quanto a você, sempre afrontarei seu pretenso direito de oprimir e de desrespeitar a vida, e sempre esperarei que você evolua, torne-se um melhor administrador de seus próprios pensamentos e migre para o lado que coloca a vida em primeiro lugar.
O lado que acredita que a humanidade não carece mais de nenhuma pontinha de fascismo para chegar a um tempo melhor não organizará exércitos para destruir seus adversários e não vai orar para que um asteroide ou uma peste fulminante destrua os fascistas do Planeta, mas não hesitará em ridicularizar seus líderes e em afrontar seus preconceitos; e lutará contra suas ofensivas e pelo esclarecimento, enquanto houver humanidade.
Daquela pergunta, cuja resposta define de que lado você está, pode-se extrair diversas outras, do tipo:
Você enxerga que o golpe de estado de 2016 promoveu uma série de lideranças que amarram seus discursos e ações ao pensamento fascista? Em outras palavras, enxerga que o golpe colocou fascistas no poder e contribuiu para o avanço do fascismo no País e no mundo, visto que o Brasil é um país de dimensões continentais e influência global? Ou não?
Você enxerga que a “justiça” de nosso país, durante a condução deste golpe de estado, está agindo de forma parcial; e que as condenações e punições estão sendo impostas com base no mesmo tipo de preconceito que superlota presídios com pretos e pobres de origem humilde? Você é complacente com este tipo de justiça ou não?
Você enxerga o avanço do fascismo no Planeta como uma ação orquestrada e transmitida, subliminarmente, pela mídia ou não?
Você enxerga que apenas um povo livre e uma educação libertadora diminuirão as chances de que seus descendentes tornem-se os fascistas das futuras gerações ou não?
Você está disposto a lutar por uma transformação ou não?
De que lado você quer ficar?
Mas estas são questões pra um outro dia… ou não?