Por Luís Fernando Praga
Pelo fim dos preconceitos e em nome do respeito que tenho por todos, independente do credo, sinto a necessidade de deixar clara a minha posição, muitas vezes contundente, a respeito das religiões, de Deus e da fé; e desculpo-me com aqueles que já se sentiram ofendidos pelo teor do que escrevo. A intenção nunca é ofender, mas sei que erro regularmente, sei que sou muito capaz de ofender e sinto muito.
Decidi que, para mim, e para o curso da vida que desejo percorrer, questões sobre qual a melhor religião a seguir e sobre a existência ou não de Deus serão pouco relevante, mas, particularmente, não acredito que Ele exista.
A vida já me colocou frente a frente com meus enganos do passado e não tenho medo de estar enganado, o engano é natural da espécie humana. Também não sou profundamente apegado às minhas certezas, sou mais apegado às dúvidas, e se, um dia, as evidências me levarem a crer na existência de Deus, não terei nenhum problema em me converter, apenas considero muito pouco provável que isso aconteça.
Quanto à fé, eu tenho a minha. Tenho fé em que nossa espécie evolua e que percorra, mais naturalmente, os caminhos da transformação. Tenho fé em que, um dia, depositaremos mais esperança em nossas capacidades e conhecimentos, no respeito à vida e no querer bem a todos como a si mesmos, do que no retorno de um Salvador, esperado por tantas gerações que já morreram esperando e que pouco fizeram, do que poderiam, para tornar este mundo num lugar melhor.
Acredito que o pensamento de se amar ao próximo como a si mesmo não tenha partido de um Deus, mas de vários seres humanos no decorrer de nossa história, em diversas épocas e distintas localidades. Talvez por ser um pensamento que componha as possibilidades de pensamento dos humanos que se propõem a pensar além de limites impostos.
Acredito que este pensamento também encontre resistência histórica não do demônio, mas de outros seres humanos, que, de alguma forma, sentem-se ameaçados ou lesados pela possibilidade de que o amor, a tolerância e a liberdade venham a reger o nosso mundo, ao invés do dinheiro, da escravidão e das guerras.
Enxergo a importância da religião, inclusive como uma real salvação, no melhor dos sentidos, para a vida de muitos. Enxergo que meu ponto de vista só tenha se formado pelo fato de existirem as religiões, os fiéis e os líderes religiosos; por isso, jamais preguei a extinção de qualquer religião ou a morte de alguém.
Enxergo os inúmeros trabalhos humanitários importantes realizados por gente das mais diversas religiões, mas também enxergo os grandes trabalhos humanitários realizados por ateus.
Por outro lado, não enxergo um paraíso ou um inferno além da vida. Penso que coisas terríveis e coisas maravilhosas podem nos acontecer aqui mesmo, nesta existência.
Não vejo nenhum benefício, para a humanidade, em se viver temendo um inferno, e considero que todo medo imposto seja um bloqueio às nossas possibilidades e uma forma propositada de dominação.
Considero um bloqueio às nossas possibilidades a atitude de pessoas, dos mais diversos grupos religiosos, de proclamar que já garantiram o seu paraíso e, pior, proclamar que outros já garantiram o inferno. Enquanto isso, a vida passa, até que acaba.
Enxergo que o desenrolar da história, muito em virtude da maciça e secular opressão religiosa, tenha condicionado nossa espécie a viver dominada, nas mais diversas condições de submissão e em todas as fases de nossas vidas, mas não vejo isso como uma condição perene e imutável.
Vejo uma fonte inesgotável de sentimentos, conhecimentos e experiências a serem explorados e esclarecidos aqui, em vida, por isso preferi não depositar minhas expectativas naquilo que virá depois da morte. Prefiro viver, aprender e, quem sabe, deixar coisas que considero boas para quem habitar a Terra depois de mim.
Estou de mãos dadas com todas as vertentes religiosas que preguem o amor incondicional e a libertação humana.
Respeito e admiro toda fé religiosa que não seja competitiva, que não viva da necessidade de doutrinar e catequizar forçosamente, que não dependa de lançar pragas sobre ninguém, que não dependa de denegrir e eliminar adversários, que não dependa de formar exércitos de fiéis e que não dependa de explorar a pobreza, a ingenuidade e a ignorância humana para enriquecer financeiramente.
Como não me sinto vinculado a nenhuma das religiões ou ao Deus de qualquer uma delas, vivo de acreditar em minha ética e na ética de outras pessoas a quem admiro, ateias ou religiosas.
Considero importante expor minha ideias, confrontá-las com outras, refiná-las, para o meu aprimoramento pessoal e, quem sabe, ajudar, com elas, a refinar ideias de outras pessoas. Sou contrário, por princípio, a qualquer imposição de pensamento e não desejo, nunca, impor os meus.
Vivo também de questionar e tentar não seguir a ética de outras pessoas, cujas atitudes me parecem daninhas e lesivas à humanidade, sejam religiosas ou ateias. Creio que a evolução de cada um envolva muitos aspectos e que ela venha a seu tempo, um tempo que desconheço.
Apesar de considerar que alguns representem um entrave ao nosso aprimoramento social, não desejo que ninguém seja eliminado da face da Terra e creio que todos tenham a me acrescentar e a evoluir, entretanto, atenho-me sempre mais às minhas possibilidades de evolução, pois não me considero evoluído o bastante para decidir sobre como deve caminhar a evolução dos outros.
Vivo de questionar o quanto seríamos capazes de evoluir socialmente e de reduzir mazelas seculares de uma desigualdade aterradora, que mata gente, geração após geração, caso nos uníssemos, como semelhantes, em torno desta causa.
Questiono o quanto muitas religiões têm se esforçado em nos dizer que não somos semelhantes, e que não o seremos, enquanto não tivermos, todos, a mesma crença. Questiono o quanto algumas religiões insistem em impor que apenas alguns são merecedores da glória e o quanto os outros são “pecadores” e sofrerão.
Questiono se existe algum benefício em se colocarem atitudes naturalmente humanas na lista dos “pecados” e imagino o número de hipócritas que este tipo de opressão tem cultivado nas comunidades.
Questiono quantas atitudes, possíveis, nós deixamos de executar, quando as colocamos nas mãos de Deus e aguardamos.
Vejo como nefasta a influência de qualquer instituição, religiosa ou não, que aja de forma a dissuadir o ser humano de pensar além do que ela prega, de beber de outras fontes e de questionar suas leis e dogmas. Por que será tão importante manter um fiel sob controle?
Também questiono e abomino a atitude de líderes e instituições religiosas que incitam seus fiéis a odiar e matar em guerras santas e abomino a atitude de se aproveitar do tempo de existência neste planeta, da força de trabalho e da boa-fé dos fiéis, a fim de ostentar monumentos suntuosos, visando ao enriquecimento pessoal, visando a aumentar o poder político e de manipulação de massas, se beneficiando particularmente deste domínio.
É importante salientar que minha condição de ateu não me coloca na posição de me considerar superior a ninguém, muito menos de me considerar, a mim mesmo, o meu Deus; não. Penso que sou um nada neste universo e sei que estou à mercê de forças incomensuráveis, às quais não me cabe compreender e jamais serei capaz de explicar por completo. Tenho ciência de que minha ignorância sempre será infinita, mas sei que vago, veloz, pelo cosmo, num planetinha insignificante, cujos rumos independem das minhas vontades, da minha fé e de minhas crenças pessoais.
Por outro lado, dentro de minhas ignorâncias e insignificância, encontrei um infinito de aprendizados, sentimentos e utopias que, creio, estão presentes em cada um de nós e dão muito sentido à minha existência.
Aproveito para me desculpar com todos aqueles para quem eu teria me utilizado do nome de Deus em vão, mas não posso abrir mão da minha liberdade de pensar, de me expressar e de meu livre arbítrio, para usar este nome, não em vão, mas de forma a criar questionamentos que me parecem importantes e pertinentes para minha existência, que é só minha e de mais ninguém; uma existência que busco tornar agradável e frutífera, também para quem convive comigo.
Jamais usei o nome de Deus para ofender ou diminuir ninguém, para impor o medo, para incitar ao ódio, para proclamar guerras ou para ganhar dinheiro. Não vejo como este nome pode ser usado mais em vão que destas formas, amplamente difundidas por inúmeros “homens santos”, tanto em templos faraônicos quanto em minúsculos e decrépitos quartinhos da periferia.
Finalmente, deixo meus respeitos a todos e minhas muitas restrições a várias atitudes humanas que só visam a ferir, iludir, explorar, oprimir e tirar a vida. Tenho gratidão pela oportunidade do esclarecimento e, quando sou grato, agradeço às pessoas, aos bichos, à Natureza e à Vida, por ter-me proporcionado o pensamento e o tempo necessário para elaborá-lo e expô-lo. Um agradecimento especial e um abraço afetuoso e humano aos que conseguirem me respeitar apesar de meus “pecados”.