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Mobilização promove evento artístico para apoiar cotas étnico-raciais na Unicamp

A Frente Pro Cotas e o Núcleo de Consciência Negra da Unicamp estão convocando os artistas e grupos artísticos da cidade para participar do Festival por Cotas!

O evento, programado para acontecer dia 29 de maio, segunda-feira, visa discutir e tentar agitar Campinas para esse debate. Para participar, basta preencher o formulário (link) na internet para a montagem da programação.

O evento acontecerá na véspera da votação do Consu (Conselho Universitário) da Unicamp que decidirá, no dia 30 de maio, a implementação de cotas étnico-raciais.

Já neste domingo, 21 de maio, o programa Sala Aberta, produzido pela ADunicamp, discute o tema das cotas raciais na Unicamp (link).

Veja abaixo o Manifesto por Cotas:

Manifesto por cotas étnico-raciais na Universidade Estadual de Campinas – Unicamp

Há mais de uma década a política de cotas étnico-raciais vem sendo implementada nas instituições públicas de ensino superior em todo o Brasil. Antes de 2012, as cotas eram adotadas, principalmente, mediante o compromisso das universidades – e de seus respectivos Conselhos Universitários – para com a promoção de formas de acesso verdadeiramente democráticas e inclusivas ao ensino superior, fazendo-se valer do princípio da autonomia universitária A partir de 2012, com a decisão favorável e unânime à constitucionalidade das cotas étnico-raciais no Supremo Tribunal Federal, a implementação das cotas nas universidades federais brasileiras passou a ser regida pela Lei Federal 12.711, a Lei de Cotas, marco legal da legitimidade dessa política afirmativa enquanto política pública do Estado com vistas à promoção da igualdade no acesso à educação, da igualdade racial e do combate ao racismo.

A conquista dessa política, não nos esqueçamos, foi fruto de intensa luta política do Movimento Negro, ao longo do século XX, por reparação histórica aos descendentes de escravizados vítimas do racismo no Brasil e pelo real acesso a direitos e à cidadania que lhes fora – é – negada sumariamente, antes e depois da abolição da escravatura. Também foi fruto da luta dos povos indígenas pela garantia de seus direitos enquanto povos originários: direitos sociais e oportunidades em condições de igualdade com os demais cidadãos, respeitando-se sempre sua identidade social e cultural, seus costumes, tradições e suas instituições. Para ambos os grupos, é na Constituição de 1988 que suas reinvindicações são institucionalmente acolhidas e entendidas enquanto fundamentais para a construção da democracia, e é baseado neste entendimento que as cotas étnico-raciais são adotadas em todas as IFES e em 30 universidades estaduais do país como a principal ação afirmativa para promoção da igualdade de oportunidades no acesso à Universidade pública.

Atualmente, colhemos os frutos da generalização da política de cotas no Ensino Superior brasileiro. Não somente importantes enquanto ferramenta para formação de quadros de profissionais negros e indígenas e de democratização do acesso ao ensino superior – milhares de jovens tornam-se as primeiras gerações de suas famílias a frequentar o ensino superior -, as cotas geraram, também, resultados excelentes quanto à promoção da diversidade social e étnico-racial no espaço acadêmico, o qual, desde seu surgimento, esteve restrito a quadros da elite branca. Também imprimiram mudanças com relação ao desenvolvimento de novas abordagens acadêmicas e criação de novas linhas de pesquisa orientadas por conhecimentos não hegemônicos ou eurocentrados, fundadas sobre perspectivas próprias afro-diaspóricas, ameríndias, periféricas e populares, dando real sentido à palavra Universidade. As cotas, portanto, vem promovendo verdadeiras mudanças nas estruturas restritivas e racistas da Universidade pública brasileira e, consequentemente, nas instituições tocadas por essa.

Na contramão do movimento nacional pela democratização do ensino superior público, a política de cotas tem sido deliberadamente ignorada pela Universidade Estadual de Campinas enquanto ferramenta legítima e necessária para a promoção da inclusão social, da igualdade racial, da promoção da diversidade e, por extensão, da defesa do princípio do “público” da Universidade Pública. Situada na última cidade brasileira a abolir a escravidão, a cidade de Campinas, mais precisamente, no Distrito de Barão Geraldo – terra essa que bebeu muito sangue negro sob a dominação de um senhor de escravos reconhecido pela brutalidade acentuada de suas práticas -, a Unicamp não reconhece seu atraso quanto à implementação de ações afirmativas comprometidas com a garantia de direitos fundamentais às populações historicamente excluídas do acesso à educação. E, especialmente em relação ao povo negro, a Unicamp continua a acompanhar a prática histórica de uma cidade profundamente racista e resistente à garantia do acesso pleno da população negra aos direitos humanos e à cidadania.

Em detrimento da política de cotas, a Unicamp utiliza-se de dois modelos de ação afirmativa para acesso ao ensino superior. O PROFIS – Programa de Formação Interdisciplinar Superior – seleciona um a dois candidatos de cada uma das escolas públicas do município de Campinas os quais tenham obtido melhor desempenho no ENEM. O PAAIS – Programa de Ação Afirmativa de Inclusão Social – é um programa de bonificação para candidatos que estudaram o ensino médio integralmente em escolas públicas e para autodeclarados PPI. O programa foi criado em 2004 e, desde então, configura-se como o principal programa de ação afirmativa no ensino superior brasileiro alternativo às políticas de cotas.

É difícil de entender as razões por trás da deliberada resistência da Universidade na adoção das cotas. O PAAIS, em seus 12 anos de existência, falhou categoricamente em atingir seu objetivo de promoção da inclusão social e étnico-racial da universidade. De 2005 a 2016, o programa não promoveu a inclusão étnico-racial de alunos oriundos da rede publica de educação – ao longo desse período, 67% dos matriculados estudaram em algum momento em escolas particulares e 52% fizeram cursinhos comerciais – e, com relação à entrada das populações PPI, estas foram apenas 15% do total de ingressantes entre 2005 a 2016. Além disso, por não fazer em nenhum momento recorte de renda, o programa permite que estudantes que não pertencem ao perfil visado sejam beneficiados pelo programa – em 2015, 75 dos matriculados beneficiados pelo PAAIS possuíam renda familiar entre 10 a 15 salários mínimos, 16 dos matriculados renda entre 15 a 20 salários mínimos, e 17, renda superior a 20 salários mínimos. Em 11 anos de PAAIS, apenas sete alunos pretos ingressaram no curso de Medicina e apenas dois no curso de Arquitetura e Urbanismo.

Os resultados de 12 anos de PAAIS só reafirmam o que qualquer um, ao passar o dia na universidade, prontamente percebe: a Unicamp continua sendo um projeto de universidade privada, elitista e branca.
Vivemos em uma sociedade fundada em desigualdades, onde o racismo tem papel estrutural e estruturante. As pessoas negras são minoria nas universidades e nas posições de maior prestígio da sociedade, enquanto são maioria nas prisões e nos necrotérios. A recusa da Unicamp em implementar uma política de cotas certifica que o direito de acesso a uma das universidades públicas mais relevantes do país seja negado à grande maioria da população brasileira, pobre e negra, ao passo que certifica o privilégio de acesso à universidade pública aos filhos das elites, os quais se beneficiam de sua própria cota particular de mais de 300 anos de escravização e 128 anos de dominação mascarada de democracia – quando não abertamente anti-democrática –, exprimindo notoriamente esse mecanismo quando, na ocasião de um resultado mais favorável do PAAIS à entrada de estudantes de escola pública, dão entrada a ações judiciais arguindo que lhes foram roubadas as vagas na universidade, denunciando abertamente que, para eles, as vagas sempre foram de sua posse.

Apesar de estarmos vivendo em um cenário de retrocessos ameaçadores, não abandonaremos a luta pela democracia e pela educação pública. Nossa forma de resistência se dará na constante luta pela real democratização da Universidade pública, que se materializa, neste primeiro momento, por meio da mobilização dos estudantes da Unicamp pela adoção das cotas na universidade: instrumento legítimo que garante a real inclusão social, étnica e racial, a promoção da diversidade e o combate ao racismo institucional brasileiro. Dessa forma, nós nos manifestamos em apoio à implementação da política de cotas na graduação da Universidade Estadual de Campinas por meio da imediata ratificação do princípio das cotas pela Reitoria e pelo Conselho Universitário da universidade.

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