Por Eli Fernandes
As decisões, sérias ou não, continuam sendo tomadas na calada da noite. Algumas para bem e outras para pior. Para o bem, em tese, seria o afastamento de um presidente da Câmara que é réu e teria mentido sobre contas na Suíça. Seria para o bem a decisão de refazer o processo de impeachment marcado pelo descumprimento de regras para a condução do rito do processo, mas não seria para o bem a decisão de revogar a polêmica decisão do deputado que substitui Cunha no comando da Câmara.
Pior que as decisões tomadas na calada das madrugadas têm sido algumas decisões tomadas à luz do dia, como a de 17 de abril, que decidiu pela admissibilidade do processo de impeachment, ou a reunião de líderes das bancadas no Senado Federal, à residência de Renan Calheiros (PMDB-AL), que decidiu por ignorar a medida do atual presidente da Câmara, pela anulação da sessão que autorizou a condução do impeachment de Dilma. As decisões, à luz do dia, ou na calada da madrugada, têm deliberado um futuro estranho para o Brasil que assiste, até agora, passivo, ao processo que desconfigura o projeto de governo de uma das maiores nações do Planeta.
As decisões parecem, no entanto, distantes da opinião da maioria da população. O eleitorado brasileiro, é verdade, dividiu-se em 2014 nas eleições presidenciais, quando praticamente cada metade decidiu ou por Dilma ou pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG) para a presidência da República. Mas em números exatos a candidata do PT ganhou a eleição. Desde então as denúncias de corrupção trazidas à tona pela Operação Lava jato da Polícia Federal atingiram políticos dos dois lados, tanto dos aliados petistas quanto tucanos.
Agora vamos dormir já pensando que nada mais pode mudar o cenário e que a decisão do Senado, através de votação no Plenário, nesta semana, vai mesmo ser decisiva para o processo. Depois é aguardar a análise pelo STF que julgará o mérito da questão: Dilma cometeu ou não crime de responsabilidade. Daí seria normal esperar que a decisão resultasse em “efeito dominó” envolvendo mais de uma dezena de governadores pelo País que também fizeram as chamadas “pedaladas fiscais”.
No entanto, até o momento, nenhuma Assembléia Legislativa ou mesmo o Judiciário movimentou-se neste sentido. Diferentes pesos e diferentes medidas. Decisões tomadas às claras, ou pior que isso, indecisões que permanecem apesar do avanço do processo contra a presidente. Nada prova o contrário. O aspecto suspeito do processo. As estranhas decisões tomadas nas madrugadas e as bizarras deliberações à luz do dia. Tudo isso em pleno Século XXI, época de comunicação e tecnologia da informação disponível à mão dos portadores de tablets e smartphones, fatos narrados em tempo real, transmissões ao vivo e o cinismo dos líderes do Legislativo e do Judiciário, sem contar com o Executivo dos estados da federação.
Neste cenário de devastação ganha quem pode mais. Quanto mais poderosa a rede midiática que apóia um lado, maior é complexo industrial a usa como porta-voz e maior a força dos interessados em comandar determinado lado da guerra que se trava na política brasileira. As decisões tomadas na madrugada têm sido insuficientes para garantir justiça. Isso é inequívoco. Cunha foi afastado, mas o estrago que proporcionou ao País segue irreparável. Maranhão anula a sessão, mas depois de ser esquartejado pela mídia comercial de grande porte revoga a própria decisão.
Caros correspondentes internacionais, o que há de mais estranho no cenário político brasileiro, não é, de fato, o que se tem decidido na calada da noite, no decorrer das madrugadas, por mais que o cenário e ambiente das sombras remetam aos filmes de terror e suspense. O mais absurdo tem rolado à frente do nariz do brasileiro que acorda cedo para trabalhar, estudar, viver sob a ameaça de um novo realinhamento das forças políticas, ingênuo, às vezes, à esperança de um País melhor. Mas como o bizarro e o anormal se tornaram norma não parece errado pensar que o são estranhas as madrugadas de Brasília. Governo subversivo.