Por Allan Lucena
Quando eu era pequeno, não sabia qual era o meu papel no mundo, mas tinha certeza que saberia quando fosse grande. Quando eu cresci um pouco mais, descobri a informática e achei que estava feito. O que fiz mesmo foi 18 anos, comecei a trabalhar e não me satisfiz. Desviei do caminho de exatas ao trancar a faculdade de Engenharia da Computação para ingressar em Comunicação Digital. Mesmo formado eu não mudei de profissão, mas havia ali uma oportunidade adormecida. Até os 24 anos, quando ela acordou com um chacoalho forte!
Bati o carro ao dormir no volante. Estava ensaiando o dia todo pra uma audição de teatro musical. Na batida quase não me machuquei, mas eu morri de verdade. Morreu um técnico em informática, uma pessoa indecisa e nasceu um artista. De vez e pra sempre, deixei de ser um técnico em informática e descobri o meu amor pela Arte.
Durante a vida tive várias mortes, mas essa até agora foi a mais significativa. “Morremos” muitas vezes, nem sempre de um acidente tão grave, nem mesmo de acidentes ou tragédias. Você já acordou sentindo-se com a energia renovada e tomando atitudes que nunca teve antes, não é? Já se olhou no espelho e viu a mesma cara, mas com um olhar completamente diferente! Isso chamamos de morte ritual. Não que haja necessariamente um ritual para que ela ocorra, é a morte parcial, que acontece quando há uma mudança grande em nossas vidas. E isso é muito bom! São fases importantes, uma forma de renovar, para nascer um novo “EU” melhor e mais evoluído.
Não tem muito segredo, muitas tribos indígenas encaravam essa morte ritual como os ritos de passagem da infância para a juventude e da juventude para a vida adulta. Porém eles realmente ritualizavam essas mortes, com tarefas a ser realizadas e com o risco de seus participantes realmente falecerem durante os testes. Para os japoneses, esses ritos são celebrações de passagem de acordo com a idade. 3, 5 e 7 anos eram comemorados pois havia grandes níveis de mortalidade infantil na era Edo, já aos 20 anos os jovens são considerados adultos, e depois há a celebração que acontece aos 61 anos como sendo a “segunda infância”, comemorando a volta ao signo de nascimento do horóscopo chinês.
Celebramos nosso aniversário todos os anos, devemos dar mais ênfase e significado a cada ano que passa, reforçando nosso aprendizado e tornando isso um ritual mais forte que somente a contagem do tempo numa festa bacana. Nossa vida tem significado aqui, mesmo que não saibamos exatamente qual é, mesmo que só tenhamos a oportunidade de descobrir do que realmente gostamos depois de algum tempo. Não sei dizer se saberemos qual nosso real papel, mas penso que todos os dias, querendo ou não, estamos fazendo exatamente o que devemos fazer e isso já é o bastante para comemorar e continuar em frente, com ou sem acidentes, até que a gente não tenha mais a chance de renascer.
Allan Lucena – Escreve também no blog Umikizu!