O gerente de Acesso à Inovação e Tecnologia do Sebrae, Célio Cabral, explica que mesmo com os altos custos, riscos e retornos de longo prazo que envolvem esse tipo de negócio, o número de empresas com base tecnológica tem crescido exponencialmente. “Porque é um diferencial competitivo, sobretudo, em um momento de crise, em que as condições econômicas são cada vez mais difíceis no acesso ao mercado. O risco é maior, mas a possibilidade de retorno é grande”, comenta.
“Esse empreendedor, via de regra, não tem perfil empresarial, é um cientista. Então é fundamental que ele busque se capacitar em gestão empresarial, entender que empresa é muito diferente de laboratório, entender de gestão financeira, de pessoas, linhas de acesso a mercado, linhas de acesso à financiamento”, disse Cabral ao lembrar que o próprio Sebrae oferece um portfólio de serviços para esse tipo de empreendimento, como assessoria, consultoria, capacitação e recursos de até R$ 125 mil não reembolsáveis para projetos de inovação.
A nanotecnologia foi incluída no Plano Plurianual (PPA) do governo federal de 2000-2003 e ganhou programa específico a partir do PPA seguinte. Até o ano passado, o Brasil respondia por menos de 0,1% da produção mundial do setor.
Formada em Farmácia, a catarinense Betina Giehl Zanetti Ramos dedicou o mestrado e o doutorado ao tema da nanotecnologia. A vida acadêmica seria o caminho mais previsível, mas ela decidiu ousar e transformar teoria em prática. Em 2009, criou a Nanovetores, uma incubadora de insumos nanotecnológicos, em Santa Catarina. “Depois que terminei essa etapa de formação, arrisquei em algo que apostava que teria uma potencialidade de boa aplicação”, conta ela, que chama a nanotecnologia de nova revolução industrial: “porque ela quebra muitos paradigmas em vários setores”.
Precursora no ramo de encapsulação (processo em que um ou mais ingredientes são revestidos por uma cápsula), a empresa trouxe para o mercado de cosméticos algumas novidades, como as cápsulas que, ao serem ingeridas, hidratam a pele. “A encapsulação evita possíveis efeitos adversos, que muitas vezes produtos em formato líquido apresentam, e melhora a estabilidade e a eficácia dos cosméticos”, conta.
Segundo Betina, a experiência em administração e empreendedorismo do marido, Ricardo Henrique Ramos, foi crucial para o sucesso da Nanovetores, que hoje tem 25 funcionários e cinco distribuidores internacionais. No ano passado, o faturamento fechou em cerca de R$ 2,5 milhões, R$ 1 milhão a mais do que em 2013. Mas não foi fácil. Os primeiros dois anos foram dedicados à comprovação clínica de eficácia e segurança dos produtos. “A nanotecnologia é ainda muito recente, exige grande bagagem teórica de conhecimento e há uma lacuna muito grande entre a pesquisa que se faz na universidade e a produção desse material industrialmente”, comentou Betina.
O mercado de cosméticos ficou pequeno para o casal, que decidiu expandir para o setor têxtil. A tecnologia inédita no Brasil ajudou a criar roupas com propriedades antibacterianas, com aroma, que ajudam a relaxar a musculatura e combater a celulite e a flacidez.
Para as empresas interessadas em entrar para este universo, Betina aconselha: “Temos um mercado gigantesco para abranger, mas é importante que todo o novo fornecedor dessa tecnologia tenha consciência de que tipo de produto está levando para o mercado, que requer controle e abordagem criteriosa”.
Empresa voltada para o segmento farmacêutico, em São Paulo, a Nonotimize desenvolve, entre outros produtos, micro e nano encapsulamento de princípios ativos que melhoram o desempenho de remédios. “O principal objetivo é reduzir o número de doses que o paciente vai administrar para facilitar a terapia e a adesão a tratamentos mais complicados”, conta o diretor-executivo da empresa, José Martins.
O pesquisador acredita que o principal desafio para o sucesso desse tipo de empreendimento é conseguir transformar um produto de laboratório em mercadoria de larga escala e avaliar a viabilidade econômica. “Existe um conjunto de produtos que tecnicamente pode ser desenvolvido, mas muitas vezes não compensa que se agregue tecnologia”, destaca. “Via de regra, esse produto é desenvolvido em laboratório e durante o processo de escalonamento encontra barreiras e muitas vezes não consegue chegar de fato ao mercado”.
A falta de regulação sobre o desenvolvimento da nanotecnologia é outro problema, ressalta. “Não existem ainda regras claras que possam dar segurança suficiente para que as empresas realizem os investimentos e consigam incorporá-los na tecnologia. Há um gargalo regulatório a ser vencido”.
Em 2014, o Brasil integrou o programa NanoReg, um projeto de pesquisa com foco na regulamentação em nanotecnologia, proposto por um consórcio de mais de 50 instituições do mundo todo, entre empresas, universidades, institutos de pesquisa, institutos de metrologia e órgãos de governo, com financiamento da União Europeia. Dentre os objetivos do projeto está o de disponibilizar aos legisladores um conjunto de ferramentas para avaliação de risco e instrumentos de tomada de decisão, a curto e médio prazo. Outra meta é desenvolver e estabelecer uma estreita colaboração entre governos e indústria para a gestão adequada dos riscos e criar a base para abordagens comuns, conjuntos de dados mutuamente aceitáveis e práticas de gestão de risco.
Em 2012, O Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação criou o Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologias (SisNANO), uma rede de laboratórios com o objetivo de fornecer infra-estrutura e suporte acessíveis a pesquisadores, empresas e órgãos públicos de todo o país para o desenvolvimento e inovação em nanociências e nanotecnologias. (Flavia Vilela/Agência Brasil)