Com apenas R$ 240 milhões, uma mixaria perto dos escândalos de corrupção no Brasil, cerca de 500 mil pessoas poderão receber água doce de forma constante no Semiárido (norte de Minas Gerais e estados do Nordeste).
Após dois anos de diagnóstico, o Programa Água Doce começa a ser implementado nos estados. O objetivo é instalar e reformar sistemas para retirar o sal da água de poços de comunidades rurais do Semiárido, tornando a água própria para o consumo humano. Na Bahia, estado com a maior abrangência do convênio, serão instalados e reformados 385 sistemas, que beneficiarão 150 mil pessoas, até o final de 2016.
Os testes de vazão dos poços ocorrerão em dia 6 de abril e, logo em seguida, serão iniciadas as obras, de acordo com o coordenador estadual do Programa Água Doce e diretor de Política e Planejamento Ambiental da Secretaria do Meio Ambiente do Estado da Bahia, Ruben Zaldivar Armua.
“Estamos em uma região onde as águas subterrâneas são salinas. A intenção é fazer obras de sustentabilidade coletivas, onde a população é que se serve, e a própria comunidade toma conta”, explica Armua. A Bahia concentra 23% do Semiárido brasileiro, onde estão 265 municípios. Na fase de diagnóstico, foram identificadas 41 cidades, em estado mais crítico, que serão as beneficiadas em um primeiro momento. O governador Rui Costa disse que entrega, até o final de 2015, 100 sistemas, que oferecerão água a 40 mil pessoas. “O programa garante água doce de qualidade, como alternativa mais barata do ponto de vista de outros sistemas e mais sustentável, porque há água o ano todo”, diz Costa.
Ao todo, o estado receberá o investimento de R$ 61 milhões, sendo a maior parte do governo federal. A Bahia entra com 10% desse valor. Nacionalmente, o programa prevê o investimento de R$ 240 milhões em todo o Semiárido, que beneficiarão 500 mil pessoas até o final de 2016. As obras foram acordadas com os nove governadores dos estados que compõem o Semiárido, em Brasília, com a assinatura do 3º Pacto Nacional de Execução do Programa Água Doce, no início do mês. Participam Minas Gerais e os oito estados nordestinos, com exceção do Maranhão.
Na Bahia, a cerimônia de início das obras ocorreu sexta-feira (27), na comunidade de Minuim, em Santa Brígida (BA), e contou com a presença da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, além do governador, de parlamentares e do prefeito da cidade, Gordo de Raimundo. A cidade é a mais crítica do estado, pelos critérios usados pelo Ministério do Meio Ambiente. Entre eles estão o baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a alta taxa de mortalidade infantil e o baixo índice pluviométrico.
Em Minuim, fica a unidade demostrativa do sistema produtivo do programa. Além de garantir a água potável à população, a comunidade aproveita os resíduos da filtragem, basicamente água salgada, para a criação de peixes como a tilápia e o cultivo de erva-sal, que por sua vez é usada na alimentação de caprinos e bovinos. A unidade existe desde 2010. Para a construção de unidades produtivas é preciso que os poços tenham uma alta vazão, capaz de sustentar o sistema. Com investimento próprio, o estado comprometeu-se a construir 50 unidades acopladas aos sistemas previstos no programa.
“A água foi ótima. Essa salgada, que era jogada fora, agora vai para criatório de peixe, depois é reaproveitada com as plantas, que reaproveitam o sal que vai para a terra. Para nós é ótimo, não estamos prejudicando a terra”, explica a presidenta da associação comunitária do povoado, Íris do Céu Feitosa. “Antes era aquela disputa para conseguir água no riacho e ainda tinha que andar quilômetros com o balde na cabeça”, diz.
A comunidade conta ainda com cisternas, para armazenar a água das escassas chuvas, e com carros-pipa do Exército e da prefeitura. A água do dessalinizador, por ser a mais pura, é usada basicamente para consumo humano. A associação cobra R$ 0,01 por litro. O dinheiro é destinado ao pagamento da energia usada pelo equipamento de dessalinização e para manutenção de todo o sistema.
A cerimônia de lançamento do programa estava lotada. Pela primeira vez, o povoado recebia o governador do estado e uma ministra. Na plateia, faixas pediam melhorias na educação e saúde. A população também queria o tão sonhado sistema de encanamento, para que a água chegasse às casas. O pedido, no entanto, encontra barreiras técnicas: a vazão da água dessalinizada, segundo o Ministério do Meio Ambiente, não é suficiente para o encanamento. Apesar das faixas, todos os discursos foram aplaudidos.
Um dos pedidos foi atendido. Em seu discurso, a ministra garantiu que levará para a presidenta Dilma Rousseff a demanda da comunidade pelo Programa Minha Casa, Minha Vida. Em Minuim, a maior parte das casas é de taipa.
Sobre se a crise no Sudeste trará mais atenção ao sertão, Izabella disse que o Sudeste tem muito a aprender com o Nordeste. “A crise hídrica no Sudeste só mostra uma coisa, que o povo terá que ter a sabedoria do nordestino para poder criar alternativas e enfrentar. O que estamos vendo aqui é a sabedoria do nordestino buscando saídas permanentes para a oferta de água”, disse. E complementou: “O povo aqui não desperdiça. O povo do sertão sabe entender qual é o valor da água”. (Agência Brasil; edição Carta Campinas)