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Dança do ventre, do estereótipo à poesia

Há uma dança que represa a energia vital. Outra que a libera e cria estética. A primeira é contida, controlada, medida. Acontece quando a dançarina ainda está presa à parte mecânica do movimento. Ela está preocupada com o fazer correto. O brilho do seu rosto fica ofuscado pelo receio do erro.

Já a dança que libera a energia vital e cria estética é aquela em que a dançarina vai além da mera execução do movimento. Ela canaliza toda sua energia para seus movimentos. O resultado dessa ação é o corpo vibrando no palco, atraindo o expectador para a magia que toda arte realiza. Nesse momento, o público silencia e acompanha, extasiado, o espetáculo.

Isso que aprendi assistindo ao Festival de Dança do Ventre promovido pela academia Templo de Isis, em 14 de dezembro, domingo ventoso. Foram várias horas de apresentação que passaram leves. O salão social do Clube Bonfim estava lotado, aproximadamente 900 pessoas. Trinta e seis apresentações, muitas dançarinas, mulheres de todas as idades que desejam superar os próprios limites físicos e psicológicos e aprender a dançar, como hobby ou profissionalmente. Algumas ainda inseguras, de rostos sem brilho, mas evidentemente disciplinadas e esforçadas. Outras já desenvoltas, esnobando harmonia e graça.       Quando se fala em dança do ventre, imediatamente somos a levados a pensar em liberação da sensualidade feminina reprimida. Ao menos, essa ideia é bem popular. Assistindo ao festival, eu pude desmistificá-la. As dançarinas que vi não estavam nenhum pouco preocupadas em ser objetos sexuais. O que elas buscavam era realizar um trabalho que lhes exigiu muita preparação. Elas queriam mostrar algo que está além dos estereótipos de sensualidade. Tanto as iniciantes quanto as que hipnotizaram a plateia com as vibrações e ondulações de seus corpos queriam apenas romper as barreiras que separam a realidade da poesia.

Dentre as apresentações que muito me agradaram destaco as seguintes: Pandeiro, dirigida pela professora Iris Camelo, com participação de Lú Aziza para quem a dança é elo consigo mesma; Neandertais, belíssima apresentação em que Olympia Silvério brilhou; Sumérios que contagiou o público com uma alegria imanente, o solo com Marina Ribeiro, estupendo; Incas, forte, vibrante; Hititas, grupo também forte, vibrante e harmônico e, por fim, Idade Contemporânea em que se destacou a coreografia com véus coloridos, um espetáculo de movimento e cor contagiante.

Saí do festival pensando no próximo. Parabéns, Olympia Silvério, por encarar as 1001 dificuldades que certamente interferem na produção desse trabalho, por demonstrar que a dança do ventre é uma forma de expressão acessível à maioria das pessoas, antes de ser obra de arte que também é.

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