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A árvore da janela

Um Sol sem dó, cansado do meu sono,

Beijava minha cama indolente,

E numa manhã mágica de outono,

O solo suplicou tua semente.

 

Guiadas pelas mãos da natureza,

As minhas te fizeram sepultada,

Um germe de poder e de proeza,

Que meu sonho regou na madrugada.

 

E o broto verde, tenro e sonhador,

Rompeu a crosta que o encarcerava,

De seiva e sentimentos deu-se a flor,

E o sabor ao fruto da palavra.

 

Dona da vocação mais generosa,

Foste acolhendo a vida entre teus galhos,

A joaninha, a pomba-amargosa,

E as orquídeas sorveram teus orvalhos.

 

E veio líquen, besouro e a formiga,

A lagarta, o lagarto, a corruíra,

O serelepe e a cigarra amiga,

Do passo-preto, às cores da saíra.

 

Vira-bosta, bicudo e bacurau,

Colibri, maritaca e marimbondo,

Bromélia, periquito e pica-pau,

E a borboleta azul veio se expondo.

 

Tinha aranha, jacu e caramujo,

Um “dorme João”, três pés de passarinho,

Inhambu, bicho pau, uma coruja,

E uma esperança pra te dar carinho.

 

Camundongo chamou o quiriquiri,

O sabiá cantou pro curió,

E a cuidadosa mãe do bem-te-vi,

Pôs pra fugir gavião carijó.

 

Maravilhosa cria do selvagem,

Que meu destino quis plantar aqui,

Fez-se tão atraente a tua imagem,

Que um curso d’água se acercou de ti.

 

Banhou tuas raízes pertinazes,

E os meus devaneios mais profundos,

Alimentou de paz as minhas frases

E Morfeu tornou um os nossos mundos.

 

Contracorri meus passos rio acima,

Pra te versar depois pro rio abaixo,

Exausto, eis que lavei os pés da rima,

No gelado gentil do teu riacho.

 

Entre as tantas ramas das escolhas,

Que pra viver, invento e reinvento,

Eu pude ver o som de quando as folhas,

Brincando, curtocircuitam o vento.

 

E nas colchas amassadas da manhã,

A muito poucas léguas do acordar,

Onde o ontem rodeia o amanhã

Meu novo eu sentia um novo ar.

 

Caiu fresca e macia a alvorada

E nenhum Sol já fez sombra tão bela,

Eu vi aquela copa delicada:

Minha árvore me olhava da janela…

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