Uma pesquisa realizada na Unicamp tenta entender como a própria vivência e ensino durante a Faculdade de Medicina provoca no médico uma espécie de antipatia, ou seja, um distanciamento e indiferença do médico em relação ao paciente e o foco exclusivo na doença. A pesquisa também pode servir para entender o perfil dos médicos brasileiros e, até, a reação da classe em relação à presença de colegas cubanos no Brasil.
Veja letra de música feita por estudantes da medicina da USP-Ribeirão
No estudo, o médico e pesquisador Marcelo Schweller, orientado pelo professor Marco Antonio de Carvalho Filho, avaliou uma série de intervenções, visando manter ou aumentar a empatia de estudantes de medicina da Unicamp em diferentes estágios de formação. O conceito de empatia na pesquisa é a capacidade de compreender o sentimento ou reação da outra pessoa imaginando-se nas mesmas circunstâncias.
Segundo os pesquisadores, há uma perda da empatia ao longo dos anos do curso de graduação e tem como umas das causas principais o chamado ‘currículo oculto’. O estudante têm várias experiências na faculdade que não são somente as experiências em sala de aula e supervisionadas. Essas experiências também vão moldando a personalidade e a identidade profissional desses alunos. E nem todas essas experiências são positivas. Isso é o que se denomina currículo oculto em medicina.
“Queremos formalizar o currículo oculto, trazer para o debate. A formação dos futuros médicos precisa estar pautada em valores e virtudes, que surgem da necessidade primordial de colocar os interesses do paciente acima dos interesses do próprio médico. Para respeitar isso, o médico precisa ter uma fidelidade à verdade científica, mas também à verdade humana”, afirmou o professor Marco Antonio de Carvalho Filho ao Jornal da Unicamp.
Na pesquisa, Marcelo Schweller expôs os alunos a atividades programadas e utilizou uma escala psicométrica para medir a empatia do estudante. Os resultados demonstraram que a empatia aumentou consideravelmente em praticamente todos os alunos que passaram pelas atividades. Para o pesquisador, a relação médico-paciente é o fundamento da prática da medicina. Entre os fatores que permitem o sucesso dessa parceria, a empatia se destaca como um dos mais importantes. “Existem evidências científicas que associam a atitude empática do médico com a satisfação do paciente, melhor adesão ao tratamento e melhores desfechos clínicos”, afirma Schweller.
A pesquisa constatou que 94% deles acharam que a capacidade de ouvir o paciente estava melhor; mas não só de ouvir o paciente: 91% acreditam que a capacidade de ouvir outra pessoa também está melhor.
A motivação dos estudantes após as atividades também aumentou após as atividades da pesquisa. Cerca de 60% dos estudantes ficaram motivados a estudar não somente a relação médico-paciente, mas os conteúdos de medicina como um todo. Quase 100% consideraram uma aplicação deste aprendizado na vida profissional e mais de 90%, também na vida pessoal.
“O processo pedagógico é baseado no reforço positivo, não sendo raro os alunos se emocionarem durante a intervenção. Para alunos e professores, a atividade resgata a motivação inicial que os levou a escolher a profissão. Os resultados, por outro lado, sugerem que é possível manter ou mesmo aumentar os níveis de empatia por meio de metodologias ativas de ensino em diferentes estágios da formação médica”, conclui Marcelo Schweller.
A pesquisa também mostrou que determinadas especialidades médicas estão mais associadas aos níveis de empatia de estudantes de medicina. Aqueles que pretendem especialidades com contato direto com os pacientes, como medicina de família, clínica médica, psiquiatria e pediatria, apresentam níveis de empatia maiores que os estudantes que buscam especialidades orientadas por tecnologia ou procedimentos, como anestesiologia, radiologia e patologia.