Pesquisa da USP revela alta concentração de remédios, cafeína e cocaína na costa de Ubatuba

Praia do Flamengo, em Ubatuba (foto stela madruga/wikimedia commons cc)

Pesquisa realizada no Instituto de Oceanografia (IO) da Universidade de São Paulo (USP) identificou alta concentração de poluentes, desde fármacos a produtos de uso pessoal como cafeína, anti-inflamatórios, analgésicos, componentes da cocaína, dentre outros, nas regiões costeiras de Ubatuba, no Litoral Norte de São Paulo.

O estudo foi realizado por Luciana Rocha Frazão, especificamente em áreas de alto valor ecológico da Enseada do Flamengo e Baía de Ubatuba, em sua tese de doutorado, intitulada “Produtos farmacêuticos e de higiene pessoal na zona costeira em Ubatuba (Brasil): um hotspot ecológico e turístico que enfrenta alta contaminação”.

A pesquisa, a partir da coleta e análise de amostras, identificou 15 de 22 componentes-alvos nas águas e investigou suas possíveis consequências a biota regional. Os componentes foram encontrados desde a região litorânea até as áreas mais afastadas da costa, indicando uma extensa contaminação com baixo nível de diluição por toda a faixa marinha. “As características físico-químicas deles não permitem uma diluição por completo e os tratamentos de esgoto não eliminam esses compostos, até porque são muitos e não se sabe os efeitos deles”, explicou a pesquisadora.

Luciana ressalta também as possíveis consequências desta contaminação, que podem afetar tanto a cadeia trófica, ou seja, a transferência de energia e, consequentemente, de poluentes entre os organismos, como também as trocas gasosas entre o oceano e a atmosfera.

Tal fenômeno revela-se preocupante devido a intensa importância das águas oceânicas na produção de gás oxigênio para a vida terrestre, processo realizado principalmente pelo fitoplâncton, micro-organismos fotossintetizantes que são sensíveis ao aumento da temperatura e à presença de poluentes na água do mar, além de serem responsáveis por 50% da produção do oxigênio que respiramos.

Além disso, questões de saúde pública, bem como impactos na cultura e na economia da pesca da região, podem ser outros setores afetados pelo aumento da concentração destes poluentes nas águas costeiras.

Tripla Crise Planetária

Em sua tese, a pesquisadora ressalta que a expansão destes contaminantes seria um dos fatores do que a Organização das Nações Unidas (ONU) denominou como Tripla Crise Planetária, ou seja, a interação entre as três principais crises ambientais da atualidade: mudança climática, perda de biodiversidade e contaminação química. Luciana ainda afirma que a acumulação de fármacos (PPCPs) nas águas marinhas, em larga escala, pode desencadear os mesmos efeitos da emissão de poluentes, especificamente do gás carbônico, na atmosfera.

”De forma semelhante às emissões de dióxido de carbono na atmosfera, cujo acúmulo de longo prazo levou ao efeito estufa e à atual crise climática, os PPCPs também podem se acumular lentamente. Esse acúmulo pode resultar em mudanças significativas que passam despercebidas até que um ponto de inflexão seja atingido, o que pode levar a consequências graves e irreversíveis para os ecossistemas marinhos”. (Com informações de Julia Fernandes Teixeira/Agência Universitária de Notícias-USP)