Em São Paulo – No centenário da Semana de Arte Moderna no Brasil, o campo das Artes e da Educação passa por um momento de questionamento profundo da Colonialidade. É neste contexto que o Rolê 22 surge: valorizar fazeres e saberes locais – em territórios prejudicados pelos danos da herança colonialista – a partir das palavras de outros corpos, identidades e territórios dissonantes, celebrando o legado cultural deixado pelos povos indígenas e afro-brasileiros.

(Imagem: Divulgação)

Depois de reunir artistas e artivistas de origem indígena e de origem africana, o Rolê 22 agora festeja o “São João”, no dia 24 de junho, sexta-feira, às 19h, na Ocupação 9 de Julho (R. Álvaro de Carvalho, 427 – Bela Vista, no centro paulistano). O público poderá acompanhar presencialmente (lugares limitados).

A ideia desses encontros é fazer uma roda de escuta, para refletir  como o legado da Semana da Arte Moderna de 1922 afeta populações que não são incluídas nas discussões – caso dos indígenas e dos afro-brasileiros.

Participam do evento do dia 24 de junho: Preta Ferreira (multiartista, comunicadora inata e de formação), Julie Dorrico (poeta, escritora, palestrante, pesquisadora de literatura indígena, pertencente ao povo Mucuxi), Marcelo Tupinambá Leandro (doutorando, coordenador de programação do museu Casa Mário de Andrade, produtor musical), Lumumba Afroindígena (artista plástico autodidata). Haverá intervenção musical do grupo Samba de Dandara (grupo ligado ao empoderamento e exaltação às mulheres sambistas). E a mediação será realizada por Jaíra Potï (artivista e gestora cultural, responde pela Direção Executiva do CPBrazil) e Maíra da Rosa (educadora, cantora, vocalista da banda Samba de Dandara). Thainá Silva (surda oralizada, youtuber, intérprete de músicas em Libras e empreendedora de Marketing Digital) será a apresentadora do evento.

Além da prosa, haverá neste terceiro evento a participação de duas artistas convidadas. Vanda Witoto – ativista Indígena, profissional da saúde, de Manaus/AM – (estará representada pelas roupas que os convidades estarão vestindo, numa espécie de desfile de moda. E Moara Tupinambá – artista visual e ativista das causas indígenas do povo tupinambá, de Mairi (Belém do Pará) – revelará duas obras inéditas suas, que deveriam ter sido expostas durante o Baile da Vogue deste ano e foram canceladas na última hora, sem explicações.  

Este evento, assim como os outros dois encontros (que aconteceram em abril e maio) estarão disponíveis online no www.role22.com.br e no Instagram (instagram.com/rolevintedois), no segundo semestre.

O projeto tem realização do CPBrazil e Governo do Estado de São Paulo através da Secretaria de Cultura e Economia Criativa.

Uma questão de herança

Se em 1922 os modernistas se reuniram no Theatro Municipal de São Paulo para afrontar a ordem estabelecida e marcar presença nas comemorações do Centenário da Independência do Brasil, em 2022 o Rolê 22 adentra nos territórios ancestrais para esboçar respostas para as perguntas retóricas: “O que temos a celebrar?” “Que modernidade nos atravessou?” “No Bicentenário da Independência deixamos de ser colônia?”. A ideia é contextualizar o centenário da Semana de Arte Moderna de 1922. Esse é o objetivo do “Rolê 22”, que reunirá uma série de ações para oferecer outras visões sobre o que entendemos por legado. 

E esses questionamentos perpassam as práticas institucionais e alcançam a vida cotidiana. E são provocações dirigidas a todes: descendentes dos povos tradicionais e descendentes dos milhares de imigrantes que juntes pintaram esse quadro de cores ainda pouco definidas chamado Brasil.

Ainda que a Semana de Arte Moderna de 1922 tenha entrado para a história como sinônimo de ruptura estética do seu tempo, deixou bastante a desejar quanto à representatividade racial e de gênero perpetuando assim traços da Colonialidade do poder e do saber, no mesmo ano em que se comemorava o centenário da Independência do Brasil. Por mais que os seus mentores tenham focado nos esforços de desvelar um “novo caráter provocativo” nas Artes, o grande evento foi conduzido majoritariamente por homens brancos cujos referenciais apontavam para a Europa como centro do pensamento e da produção artística mundial e tendo São Paulo e Rio de Janeiro como eixos dominantes da circulação intelectual e política do país.

O relatório “Inequality Kills” (A Desigualdade Mata) revela que os dez homens mais ricos do mundo viram a sua riqueza mais que duplicar desde o início da pandemia. Por outro lado, os rendimentos de 99% da população mundial diminuíram desde março de 2020 (disponível em https://www.oxfam.org/en/research/inequality-kills).

Isto no âmbito acadêmico, nas práticas institucionais e principalmente nos modos da vida cotidiana, onde – emergem como potências que alteram e desestabilizam a ordem vigente ao mesmo tempo que impulsionam coletivos culturais, produções artísticas independentes e práticas pedagógicas emancipadoras descentralizadas no amplo sentido do termo. Neste momento em que questões globais trazem à tona mais uma vez a necessidade de grupos subalternizados resistirem a antigas opressões do sistema colonial e seus engendramentos estruturais, como o racismo e o sexismo.

É por isso que o Rolê 22 quer provocar a discussão sobre o “não-lugar” das populações minorizadas, principalmente no campo da arte e na vida acadêmica, ao mesmo tempo que oferece ferramentas e pontes para que essas pessoas tenham mais acessos.

Rolê 22 – Encontros Artísticos

24 de junho de 2022, 19h

Gravação a partir da Ocupação 9 de Julho (R. Álvaro de Carvalho, 427 – Bela Vista, São Paulo – SP)

Capacidade: 30 lugares

Participantes:

Janice Ferreira – a Preta, é multiartista, comunicadora inata e de formação. Premiada em 2020 no Festival de Gramado por sua atuação em Receita de Carangueijo , Preta também atuou e cantou no premiado Onde voam as feiticeiras da Cineasta Eliane Caffé que iniciou sua parceria com Preta no também premiado Era Hotel Cambridge, Preta atuou no recente filme (ainda sem título) de Juliana Rojas e tem participação em séries e outros filmes. É a mais velha dos oito irmãos. Na adolescência, veio da Bahia para São Paulo e, desde cedo, trabalhou para ajudar na complementação da renda familiar. Formada em publicidade, consolidou sua carreira na produção cultural. É também a autora e intérprete do single e livro Minha Carne. Tem por missão “transformar o mundo, para o desenvolvimento cultural e econômico, a partir de pequenos grupos, com promoção da paz e justiça social”, pontua. Na Ocupação 9 de Julho, Preta organiza eventos culturais e socioeducativos, desde pesquisas acadêmicas, laboratórios, oficinas, shows e ações de saúde e lazer.  Logline Multiartista, abolicionista penal, ativista pelo direito à moradia no MSTC.*

Julie Dorrico – Pertence ao povo Macuxi. Doutora em Teoria da Literatura na PUCRS. Mestre em Estudos Literários e licenciada em Letras Português pela UNIR. É poeta, escritora, palestrante, pesquisadora de literatura indígena. Venceu em 1º lugar o concurso Tamoios/FNLIJ/UKA de Novos Escritores Indígenas em 2019. Administradora do perfil @leiamulheresindigenas no Instagram. Curadora da I Mostra de Literatura Indígena no Museu do Índio (UFU). Autora da obra “Eu sou macuxi e outras histórias” (Caos e Letras, 2019).

Lumumba Afroindígena – homem negro, 42 anos de idade, artista plástico autodidata. Bisneto de congoleses e de indígena da etnia Puri-Guarani. Inciou sua trajetória em 2001 pintando orixás em juta e pouco depois começou a esculpir. Fez sua primeira exposição individual em 2018 após uma imersão na cultura indígena do Xingu. Em 2020 esculpiu o Monumento a Tebas e em 2021 participou do evento MAR 360 (Museu de Arte de Rua). Suas principais influências atualmente são Basquiat, Ordalina Cândido entre outrxs, a arte original africana e ameríndia.

Marcelo Tupinambá Leandro – é doutorando no Programa de Pós-Graduação em Música na UNESP. Cursou graduação em História na PUC-SP. É autor da dissertação A criação musical e o sentido da obra de Marcello Tupynambá na música brasileira, pela ECA-USP, sobre a obra de seu bisavô e desenvolve, desde 2005, pesquisa relacionada a acervos musicais históricos. É Coordenador de Programação Cultural do museu Casa Mário de Andrade e produtor do CD São Paulo Futuro, a música de Marcello Tupynambá, lançado, em 2020.

Moara Tupinambá – nascida em Mairi (PA), é artista multiplataforma e utiliza: desenho, pintura, colagens, instalações, escrita, vídeo-entrevistas, fotografias, literatura. Sua poética percorre cartografias da memória, identidade, ancestralidade e reafirmação tupinambá na Amazônia.  Recentemente lançou o seu livro “O sonho da Buya-wasú”, da editora Miolo Mole.

Vanda Witoto – liderança do povo Witoto,  Coordenadora do movimento dos Estudantes Indígenas do Estado do Amazonas MEIAM,  tecnica de enfermagem , formanda em pedagogia na Universidade do Estado do Amazonas, empreendedora social e estilista no Ateliê Derequine. E pré candidata a deputada Federal pelo Amazonas

Samba de Dandara – samba de empoderamento e exaltação às mulheres sambistas, às grandes compositoras, às grandes intérpretes, às guerreiras do samba. A concepção de Samba de Dandara carrega o peso e a inspiração de Dandara, mulher negra, guerreira e referência histórica na luta contra a escravização. A música do grupo passeia por ritmos afro-brasileiros, sobretudo o samba em suas diversas vertentes – ijexás, afoxés, pontos de candomblé e umbanda. Fundada em 2012, a banda construiu sua história por espaços cativos do samba na capital paulista, como Bar Templo, Casa Barbosa, Bar do Baixo, Boteco da Dona Tati, eventos como Samba da Luz, Samba do Sol e Virada do Samba. Em seu primeiro disco, gravado em 2019 e lançado em maio de 2021 com a chancela e patrocínio de Natura Musical, Samba de Dandara compila a trajetória musical e repertório de suas integrantes, além do resultado de um intenso estudo de obras de mulheres cantoras e compositoras.

Thainá Silva – Surda oralizada, mãe do José Eduardo, casada, Youtuber, interpreta músicas em Libras e é empreendedora de Marketing Digital.

Maíra da Rosa – Mulher negra cisgênera, filha de Oxum, iyawo do Ilê Axé Oju Oya/SP, educadora, cantora, vocalista da banda Samba de Dandara, graduada em Letras pela PUC SP, mestre em Educação: Currículo pela PUC SP, educadora de Tecnologias e Artes do Sesc São Paulo.

Jaíra Poti – Artivista e gestora cultural. Pós graduada em Gestão de Conteúdo em Comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo. Organizou o 2º capítulo do livro Teatro e vida pública: o fomento e os coletivos teatrais de São Paulo (Hucitec Editora, 2012). Responde pela Direção Executiva do CPBrazil.

(Carta Campinas com informações de divulgação)