Da RBA
Artigo escrito pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, também ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), reacendeu o debate sobre o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em 2016. “A justificativa formal foram as denominadas ‘pedaladas fiscais’ – violação de normas orçamentárias –, embora o motivo real tenha sido a perda de sustentação política”, afirmou Barroso, em texto para a primeira edição da revista do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), entidade criada há duas décadas e que se apresenta como “o think tank de referência em relações internacionais do Brasil”. Seu presidente é José Pio Borges, ex-presidente do BNDES, que chegou a ser acusado de irregularidades na privatização da Telebrás, durante o governo FHC. Com o artigo, a hashtag #foigolpe, referindo-se a 2016, foi para o topo do Twitter, e o assunto tornou-se um dos mais comentados nas redes sociais.
Uma prévia do texto de Barroso foi publicada pela colunista Mônica Bergamo, no jornal Folha de S.Paulo. A revista será lançada na semana que vem. Além de admitir a falta de fundamento legal para o impeachment, Barroso comenta o que aconteceu a seguir. “O vice-presidente Michel Temer assumiu o cargo até a conclusão do mandato, tendo procurado implementar uma agenda liberal, cujo êxito foi abalado por sucessivas acusações de corrupção. Em duas oportunidades, a Câmara dos Deputados impediu a instauração de ações penais contra o presidente”, descreveu.
Em junho de 2020, em uma live do grupo Prerrogativas, Barroso já havia dado declaração similar, apontado que Dilma não teria cometido crime de responsabilidade. “O hiper-presidencialismo latino-americano é uma usina de crises e, portanto, o impeachment passa a ser esse produto de prateleira que se usa na Bolívia, no Paraguai, no Brasil, como aconteceu com a presidente Dilma. Evidentemente ela não caiu por corrupção, até porque, considerando o que veio depois… Ela caiu por falta de sustentação política, não havia um mecanismo institucional do presidencialismo para mudança da condução política quando você tem perda de sustentação.”
Ruptura institucional
O processo de impeachment começou em 2 de dezembro de 2015, quando o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), contrariado em seus interesses, deu prosseguimento a pedido feito por juristas. O impedimento foi aprovado em 31 de agosto do ano seguinte: Dilma, que havia sido reeleita em 2014, perdeu o mandato, mas não os direitos políticos. Na época, ela foi acusada de crime de responsabilidade devido às chamadas “pedaladas” fiscais. Menos de dois meses depois, Cunha foi preso – e condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.
Ao defender-se no Senado, a presidenta negou que houvesse cometido crime de responsabilidade e disse que não houve comprometimento da meta fiscal. E alertou: “Estamos a um passo da consumação de uma grave ruptura institucional, estamos próximos da concretização de um verdadeiro golpe de Estado”, disse. “Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes. No passado, com as armas, e hoje, com a retórica jurídica, pretendem novamente atentar contra a democracia e contra o Estado do direito”, afirmou ainda, apontando um cenário, que acabou se confirmando, de redução de direitos. Confira aqui a íntegra do discurso.
“Fazer impeachment contra um presidente com base falsa e inexistente é, por definição, um golpe. Era óbvio na época que o motivo não tinha nada a ver com “pedaladas”, mas a grande mídia se uniu em apoio, e não se ouviu dissidência. Este foi um ataque grave à democracia brasileira”, comentou o jornalista Glenn Greenwald. A também jornalista Hildegard Angel fez referência aos muitos pedidos de impeachment do atual presidente, ignorados pela Câmara. “Que tamanho vai ter, em outubro, o Congresso brasileiro, que ignorou solenemente os 143 pedidos de impeachment de Bolsonaro, encaminhados por 1.550 pessoas e 550 organizações?” (Da RBA)