Durante a pandemia, quando se começou a cogitar novamente a taxação de grandes fortunas, para reduzir a desigualdade social e aumentar a arrecadação de imposto sem colocar mais peso sobre a classe média, os milionários já começaram a se mobilizar para influenciar o debate. Um escritório de advocacia já foi acionado para fornecer à imprensa “especialistas” contra a taxação de milionários. Agora, o mesmo escritório entra na briga com seus “especialistas” para defender a privatização dos correios.

(foto Tomaz Silva/Agência Brasil)

O escritório é o Godke Adovagados. O proprietário é Marcelo Godke, que se apresentada como especialista em Direito Empresarial e Societário, professor do Insper e da Faap, mestre em Direito pela Columbia University School of Law e sócio do Godke Advogados.

No caso da defesa dos milionários, outros dois ‘especialistas’ também entraram em campo para impedir a taxação. André Félix Ricotta, que se apresenta como doutor em Direto Tributário pela PUC/SP, Ex-Juiz Contribuinte do Tribunal de Impostos e Taxas da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo. Presidente da 10ª Câmara Julgadora. Coordenador do IBET de São José dos Campos. Professor da Pós-graduação em Direito Tributário do IBET e Mackenzie. Presidente da Comissão de Direito Tributário e Constitucional da OAB-Pinheiros (SP).

Outro é Eduardo Natal que se apresenta como mestre em Direito do Estado – Direito Tributário – pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Especialista em Estratégias Societárias, Sucessórias e Tributação pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT) e da International Bar Association (IBA). Autor do livro “A Dinâmica das Retenções Tributárias”. Sócio do escritório Natal & Manssur.

Segundo os “especialistas”, em comunicado à imprensa, taxar os milionários seria “catastrófico para o país”(SIC). Eles entraram em campo para combater qualquer taxação com a volta do debate na Câmara dos Deputados, por meio do PLC 215/20. A proposta de criação de um Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) está em análise na Câmara dos Deputados, por meio do Projeto de Lei Complementar 215/20.

Os chamados especialistas criam uma falsa ideia (fake news) do projeto para poder combatê-lo. “Especialistas tributários também discordam da eficácia da proposta e, além de não acreditarem que ela seria a solução para os problemas de arrecadação”, anotaram. Essa é uma falsa ideia, o PL não é para ser a solução da arrecadação, é para taxar os milionários e ter mais justiça tributária. É para fazer com que os muito ricos, herdeiros, etc contribuam um pouco mais. Só isso já seria benéfico ao país.

Dizem que outras medidas poderiam ser mais eficientes, concordando com o comando da Receita Federal do governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro, que decidiu também entrar no debate para defender os milionários. “A Receita listou a taxação da distribuição de lucros e dividendos, a mudança da tributação presente no mercado de capitais e o fim dos programas de parcelamento de dívidas com a União que oferecem descontos” como alternativas a taxação das grandes fortunas.

Mas se para os “especialistas”, a taxação dos milionários não é solução para os problemas da arrecadação, essas também não são. Mas tudo junto: taxação de grandes fortunas, lucros e dividendos, tributação de mercados de capitais poderiam ajudar em muito. Uma não exclui a outra. Quanto mais se taxar os milionários, mais igualdade tributária se tem.

Os “especialistas” também criam outras fantasias, de que os milionários vão embora do país, vão vender todos os seus milhares de imóveis e bens e vão aplicar tudo (imagina!) em criptomoedas! “Há uma crença que esse imposto seria capaz de promover justiça tributária. Mas ele atingiria um percentual ínfimo e poderia promover a migração do capital para ativos que não são rastreáveis, como as moedas virtuais, além de um movimento de pessoas querendo ir embora do país”, diz Eduardo Nadal.

Esse tipo de argumento é risível. Imagina o milionário, que vai vender fábricas, shoppings, lojas, imóveis em geral e colocar todos seus ativos em uma moedas virtuais sem garantia de Estados nacionais, correndo o risco de perder tudo porque não quer pagar 2% de imposto!. Hehe. Além disso, o sujeito milionário vai embora do país. Mas ele já mora mais fora do que no país de origem. Com a facilidade dos transportes e jatos, os milionários vivem passeando pelo mundo. Além disso, se a taxação “atingiria um percentual mínimo” de milionários, esse é mais um motivo para taxar. É uma prova de que 99% da população vai ser beneficiada e apenas 1% será taxada.

A sugestão dos “especialistas” defensores dos milionários, veja só, é taxar a classe média. “Muito mais importante seria a readequação das alíquotas do Imposto de Renda que estão desatualizadas, para fazer quem tem mais renda pagar mais imposto do que quem tem menos”, sugerem. Ora, isso também não exclui os milionários. Mas a medida parece estratégia para taxar mais a classe média que é quem paga imposto de Renda e proteger 1% dos milionários.

O projeto de Lei Complementar 215/20, de autoria do deputado Paulo Guedes (PT/MG), institui o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), com alíquota de 2,5% sobre o valor dos bens de pessoas físicas ou jurídicas que tenham patrimônio líquido superior a R$ 50 milhões. O imposto se aplica a imóveis para uso pessoal com valor acima de R$ 5 milhões; veículos que custem mais de R$ 500 mil; embarcações com valor superior a R$ 1 milhão e aeronaves com valor maior que R$ 5 milhões.

A arrecadação irá para educação e saúde. Se alguém se encaixa nesse perfil, com tanto dinheiro que vai morrer antes de gastar tudo (sem contar o que vai ganhar nos próximos anos), deveria ele próprio apoiar a taxação.

Não basta defender os milionários, é preciso que eles tomem conta também dos bens públicos que tem custo baixo para a população. É o caso da privatização dos Correios, que deve encarecer as entregas e prejudicar principalmente a população mais pobre e pequenas empresas que usam a estatal para fazer entrega de mercadorias por todo o Brasil.

O Projeto de Lei 591/2021 quebra o monopólio dos Correios para a entrega de cartas, telegramas e malotes.
O advogado Marcelo Godke, que não quer que milionários paguem mais impostos, acredita que o projeto é bom. “Não duvido que o serviço venha a ser encarecido. Na privatização, a gente paga um pouco mais caro, mas conta com excelência. Por isso que o sistema de competição é essencial, mesmo que encareça, teremos um bom serviço. E se esse serviço não corresponder, as empresas podem perder a concessão”, afirmou. Em resumo, a população e as pequenas empresas vão pagar mais caro para enviar encomendas. Em compensação, os bilionários que comprarem os Correios vão ficar mais ricos. (Com informações de divulgação)