Os interessados podem se inscrever no curso online “Platão e a Escrita Cinematográfica”, realizado pela Rabeca Cultural, em Sousas, que será ministrado pelo Prof. Fábio Zanoni, nos dias 09 e 16 de junho, quartas-feiras, às 20h.

Não faltam cursos de roteiro na contemporaneidade que se estruturam em torno da promessa de ensinar técnicas de escrita totalmente inovadoras, técnicas que seriam supostamente capazes de criar sujeitos aptos a dar livre curso para a própria criatividade. Por mais tentadora que seja tal promessa, o curso de escrita de roteiro que ora se apresenta pretende ser simultaneamente mais módico e mais eficaz.

Cena de Cidadão Kane, de Orson Welles

Em vez de reforçar a narrativa de que nossa interioridade guardaria uma espécie de genialidade latente à espera de ocasiões especiais para se manifestar em sua plenitude, propomos um curso que girará em torno do aprendizado de estratégias formais de escrita de roteiro. À moda das elaborações teóricas propostas pelos formalistas russos no início do século XX, explicitaremos como o uso de formas narrativas herdadas da tradição constitui o primeiro e mais importante passo para a confecção de narrativas insuspeitas. Mais precisamente, veremos de que modo uma parte importante das estratégias narrativas formais foi elaborada por Platão. Em última instância, o que estará em jogo é o esforço de abandonar a escrita-diário, baseada em experiências dotadas de valor apenas para quem as vivenciou, em benefício de uma escrita profissional, voltada para a mobilização de estratégias narrativas cujos efeitos cognitivos e emocionais tenham a chance de alcançar maior universalidade.

Sem desconsiderar a importância de ver e rever filmes consagrados pela tradição, o que estará em causa no presente curso de roteiro é a tentativa de desenvolver ferramentas cognitivas que levem o participante da oficina a migrar da posição de espectador para a de criador de narrativas fílmicas, o que implica refletir com enorme acuidade sobre determinado conjunto de estratégias formais que possuam o condão de auxiliá-lo no enfrentamento da árdua tarefa de subordinar a “leitura” de filmes à escrita de obras fílmicas. Portanto, como veremos na programação abaixo, o essencial, aqui, não reside em aprender a interpretar mais e melhor os filmes já incensados, mesmo que tal interpretação se apresente como crítica emancipadora, mas em mobilizar uma série de filmes (cultuados e comerciais), bem como variadas criações artísticas (livros de ficção, música, etc.), a fim de construir um caldeirão discursivo que alimente nossa própria prática escritural. Muito mais do que um espectador culto e emancipado, buscaremos construir uma rede de escritores atentos aos impasses e dilemas que envolvem tal empreitada criativa.

1 encontro:

– Apresentação geral e introdução sobre a importância da noção de forma narrativa.

– Platão e a estrutura narrativa presente na Alegoria da Caverna.

– Diferença entre tema e problema como meio de sofisticação da escrita de roteiro.

Por meio da comparação entre filmes que não pertencem ao mesmo gênero narrativo (Ghost e Matrix, entre outros filmes), trata-se de evidenciar como uma mesma forma narrativa está na base da produção de objetos fílmicos que raramente se imaginam avizinhados / Exposição oral e Exibição de filmes.

  • Guerra nas Estrelas: mais um exemplo de como um filme (aqui, um filme futurista) pode ser obrado a partir da extração de uma forma narrativa que, durante anos, serviu para expressar conteúdos outros, isto é, conteúdos localizados no passado (no caso, os filmes situados no Velho Oeste). Quer dizer, em vez de carroças, temos naves espaciais; em vez de armas, lasers, e assim por diante / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • A relação entre a confecção do longa-metragem eu sou mas eu, escrito e dirigido por Fábio Zanoni, e a forma narrativa presente no filme A ilha do medo, de Martin Scorsese / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • Pequenos excertos extraídos de poemas de Fernando Pessoa e de canções de Chico Buarque que explicitem a diferença entre o dizer coloquial e o dizer que se estrutura a partir de uma forma poética determinada / Exposição oral e Textos.
  • A partir do roteiro de uma peça de teatro encenada pelo Teatro da Vertigem, mostrar que o tema do consumismo, por exemplo, não precisa ser explicitado cenicamente por uma personagem parada em frente a uma vitrine de Shopping, já que o consumismo, para seguir no mesmo exemplo, pode aparecer mais sutilmente nas relações amorosas, nas relações familiares, e assim por diante / Exposição oral e Textos.
  • Foucault e a loucura, Foucault e a prisão, Foucault e a sexualidade. Mostrar como a variedade dos temas (loucura, prisão e sexualidade) esconde um problema comum (a relação entre o sujeito e a verdade). Novamente, o que está em jogo é argumentar em favor do desnível entre tema e problema / Exposição oral e Textos.
  • Cidadão Kane, de Orson Welles, e a tentativa de reforçar que um tema (por exemplo, a riqueza) pode ser apenas um meio de trazer à baila um problema (a relação entre poder e solidão) / Exposição oral e Exibição de filmes.

2 encontro:

  • Platão e a estrutura narrativa presente na Alegoria da Caverna.
  • O conceito de peripécia como um importante motor da escrita.
  • A elaboração de situações de encruzilhada como meio de encenação de dilemas morais específicos.
  • Maneiras insuspeitas de alocar o si mesmo.

A distinção entre peripécia trágica (Édipo, de Sófocles) e peripécia “happy end” (o Filme Um Príncipe em Nova York, de John Landis), entendendo, aqui, a noção peripécia como revelação na qual a personagem termina por mostrar-se diferente do que aparentava ser inicialmente / Exposição oral e Exibição de filmes.

  • Aproveitar a ocasião da comparação entre dois filmes tão distintos para sublinhar que, do ponto de vista do estudo da forma, as linhas divisórias tradicionais (por exemplo, filmes de autor e filmes comerciais) não devem ser seguidas / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • Ainda nesse sentido, lembrar os participantes que Hitchcock sempre se valeu de uma literatura considerada menor para produzir grandes obras fílmicas.
  • Exibição de outros filmes contendo peripécias / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • Filme Sangue Negro, de Paul Thomas Anderson, mais especificamente a cena em que a personagem central fica dividida entre cuidar do petróleo que começa a jorrar e o filho que sofreu um acidente em cima da plataforma de petróleo / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • Multiplicar os exemplos de cenas de filmes e de séries que se estruturam a partir do mesmo procedimento narrativo / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • O filme Seven, de David Fincher, e a possibilidade de colocar o si mesmo em situações inesperadas (por exemplo, fazer com que o assassino inclua a si mesmo na lista dos assassinatos que comete) / Exposição oral e Exibição de filmes.
  • Novamente, a peça Édipo, pois, ali, a personagem sai à cata de um suposto malfeitor, sem saber que este é, na verdade, ele mesmo. Ou seja, o si encontra-se em uma posição narrativa assaz surpreendente / Exposição oral.

Fábio Zanoni estreia como diretor e roteirista com o longa-metragem “Os amores de Vera” (2017), uma produção de baixo orçamento, realizada em parceria com a Bucareste Filmes. Nesse momento, acaba de finalizar as gravações do seu segundo longa-metragem, intitulado Eu sou ma(i)s eu. Sua incursão no cinema começou como assistente de roteiro nos curtas “Vida Loka também ama”, 2007, documentário de Eliane Caffé e “Mas será o Benedito?”, 2006, documentário de André Francioli. Graduado em Filosofia pela USP, deu sequência em sua pesquisa em cinema realizando um mestrado pela Universidade Nova de Lisboa, depois um doutorado pela Universidade de Lisboa, e, por fim, um pós-doutorado pela USP.

Publicou diversos artigos sobre cinema para revistas científicas como Revista Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual, Revista de Letras, Artes e Comunicação, entre outras.

Curso: Platão e a Escrita Cinematográfica

Prof. Fábio Zanoni

Dias 9 e 16 de junho

Quartas-feiras

Das 20h às 22h

Rabeca Cultural

Online pelo aplicativo Zoom

R$ 380,00 à vista

R$ 400,00 em duas parcelas

Inscrições e mais informações pelo Whatsapp 19 997206186

(Carta Campinas com informações de divulgação)