As mentiras de Paulo Guedes em Davos

.Por Sandro Ari Andrade de Miranda.

A desastrosa fala do Ministro da Economia do Governo Bolsonaro, na qual vincula a destruição do meio ambiente no Brasil à fome, é apenas um dos diversos impropérios que o mesmo proferiu em Davos. A ausência do Presidente da República no Fórum Econômico Mundial, depois do fiasco de 2019, abriu o circo para o passeio público do integrante do governo mais celebrado pela mídia, embora a sua competência, pelo menos para gerir os rumos da economia do país, seja absolutamente questionável.

(foto wilson dias – agênia brasil)

Na verdade, intelectualmente Guedes procede como um troglodita. Herdeiro da Escola de Chicago da década de 1970, demonstra estar longe, em termos de conceitos, do cenário atual da economia do planeta.

Desconhece questões como a pauta ambiental, trabalha com dados distantes da realidade material e não apresenta nenhuma alternativa de combate à fome, sequer caminha no campo da criação de barreiras para proteção do mercado interno da globalização. O Governo Trump, por exemplo, conservador de raiz, elegeu a proteção da economia norte-americana como prioridade, e isto é claramente demonstrado em ações como a pancada que deu no seu seguidor brasileiro ao taxar o aço e a soja.

Ou seja, o ministro brasileiro adota ideias que são apenas ideológicas, cujo os resultados, com exceção dos interesses de alguns especuladores, já se mostraram desastrosos em todo o mundo. Mas vamos detalhar alguns destes elementos.

A Questão Ambiental

Com certeza, a afirmação de Guedes referente ao fato das pessoas destruírem o ambiente porque sentem fome é o elemento mais grotesco das suas falas. Qualquer pessoa com o mínimo de conhecimento da realidade sabe que a destruição ambiental é causada, no Brasil, pelo capital das grandes corporações agrárias, de energia e de mineração.

Os incêndios que afetaram a Amazônia em 2019 foram promovidos por ruralistas que estão muito longe de apresentar qualquer traço de pobreza, ao contrário, são ricos e promotores da pobreza de grande parcela da população com a destruição de ecossistemas necessários à agricultura de subsistência e pela concentração de terras. Da mesma forma, Brumadinho, Mariana e o petróleo na costa do nordeste são fruto da ação de grandes empresas. O histórico dos crimes ambientais no país sempre indica a presença do grande capital.

Guedes mente e o mundo inteiro sabe disto. Não são os pobres que consomem mais do que a capacidade de suporte do planeta. Não são os pobres os responsáveis pela especulação imobiliária e pela sua expulsão para as áreas de risco, ambientalmente sensíveis, nem são os pobres os responsáveis pelo aumento das emissões de carbono.

Se o nobre Ministro tivesse o trabalho de consultar o Tribunal de Contas de União, saberia que a monocultura agrícola e a pecuária extensiva são as maiores consumidoras de água e emissora de gases-estufa no país. Que o Centro-Oeste, em razão das queimadas, incêndios provocados pela expansão da soja e do gado, poluem mais a atmosfera que todo parque industrial de São Paulo. Que as águas do Sul e do Sudeste estão contaminadas pelo uso intensivo de agrotóxicos utilizados nas grandes monoculturas, situação muito agravada pelo descontrole promovido pelo Governo Bolsonaro. Ou seja, a fala do Ministro não possui nenhuma base sólida, sendo mais um fake news produzido pelo Governo.

Corrupção e Licitações

Aqui uma nova aberração proferida pelo Ministro. Não é a prioridade às empresas nacionais que produz corrupção, mas a falta de transparência das licitações, especialmente das concorrências e a sua escolha por envelopes, ou leilões onde as empresas negociam valores previamente. Isto é tão antigo, quanto a mentalidade do Ministro.

Uma simples análise dos grandes escândalos de corrupção que afetaram licitações de empresas como a Petrobrás, irá demonstrar a presença de empresas estrangeiras nos contratos. O que havia antes e era positivo, pois alavancava a economia, era a exigência de conteúdo nacional nas compras públicas. O fim desta exigência não reduziu a corrupção, que segue campeado fortemente no atual governo federal, mas quebrou boa parte da nossa nascente indústria naval.

A proposta de Guedes visando abrir as compras públicas para as empresas estrangeiras em igualdade de condições com as nacionais vai ampliar a desindustrialização e quebrar ainda mais o país, produzindo mais e mais pobreza. Novamente, o atual governo brasileiro parece ver Trump como um semideus, mas não segue a único exemplo aproveitável do norte-americano, que é proteger a economia nacional.

A Retomada do Crescimento

Outra grande farsa. O Brasil segue em recessão técnica, perdendo capitais, empregos e renda (esta segue despencando). Os supostos números positivos da economia são, na verdade, sinais de preocupação. O aumento no número de CNPJs é puxado em quase a sua totalidade por Microempreendedores Individuais (MEIs), que tentam sobreviver com serviços de baixíssimo valor agregado dentro de uma economia que não gera empregos.

Os que surgem são temporários e intermitentes para atender a demanda do verão-férias-carnaval. Passado este período, se não ocorrer uma reorientação política, o país deve seguir quebrando recordes de desemprego.

Em síntese, a economia segue andando para trás, os trabalhadores perdendo renda e o país divisas. Os poucos ensaios do atual governo no campo de investimento seguem a tendência de primarização e desindustrialização, o que bate no primeiro tópico, aumento da crise ambiental.

Sandro Ari Andrade de Miranda é advogado e doutor em Ciências Sociais e editor do blog Sustentabilidade e Democracia.