A empresa britânica Oxitec liberou com aprovação oficial cerca de 12 milhões de mosquitos transgênicos machos na cidade de Jacobina, na Bahia. A previsão era de que os mosquitos não conseguiriam se reproduzir e assim diminuir a incidência de dengue e outras doenças como zika, febre amarela e chikungunya. Mas agora os mosquitos híbridos conseguiram se reproduzir e repassaram para novas gerações genes modificados em laboratório. As informações foram publicadas pela agência de notícias da Alemanha.

Além da Deutsche Welle , outras mídias chegaram a dar manchetes alarmistas falando em ‘supermosquitos’, mas pesquisadores brasileiros dizem que não é bem assim. Veja ao final do texto outro lado.

(foto ebc)

Segundo o texto, a mudança genética chamada OX513A foi projetada para que a primeira geração de mosquitos, F1, não alcançasse a fase adulta e, portanto, não pudesse se reproduzir.

A esperança do Ministério da Saúde brasileiro era reduzir a população de mosquitos em 90%. Isso funcionou durante o teste de campo. Depois de 18 meses após o final do experimento, a população de mosquitos, porém, voltou a crescer alcançado o volume anterior ao teste.

Pesquisadores da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, estudaram as alterações genéticas dos mosquitos presentes na região, respectivamente, 12 e entre 27 a 30 meses após a sua liberação. O resultado destas análises não foi o esperado. Os pesquisadores concluíram que partes da mudança genética produzida em laboratório migraram inesperadamente para a população-alvo dos mosquitos locais.

Nas várias amostras, entre 10% e 60% dos mosquitos apresentaram alterações correspondentes às dos transgênicos no genoma, indicou um estudo foi publicado na terça-feira (10/09) na revista especializada Nature: Scientific Reports.

Se o teste de campo tivesse ocorrido como inicialmente previsto pelos cientistas, a modificação genética não teria passado adiante para as populações locais porque os descendentes dos transgênicos liberados originalmente não seriam capazes de se reproduzir.

No entanto, já se sabia anteriormente a partir de experimentos de laboratório que uma pequena proporção, de cerca de três a quatro por cento dos descendentes de mosquitos OX513A poderia atingir a idade adulta. Os cientistas presumiam, porém, que eles seriam fracos demais para se reproduzir.

Os autores do estudo relatam ainda que os mosquitos, tanto antes quanto após o experimento, continuaram igualmente potenciais transmissores das doenças em questão. A equipe de pesquisa em torno de Jeffrey Powell, em Yale, alertou também que a nova população de mosquitos, criada a partir da liberação dos insetos transgênicos, pode ser mais resistente do que a anterior.

Segundo os pesquisadores, é importante acompanhar esses testes de campo “com um programa de observação para poder detectar mudanças inesperadas”.

Cientistas críticos da engenharia genética questionam os testes realizados no Brasil. “A liberação foi realizada precipitadamente, sem que alguns pontos fossem esclarecidos”, afirmou o biólogo José Maria Gusman Ferraz ao jornal Folha de S. Paulo.

O laboratório de pesquisas de Munique Testbiotech também critica a Oxitec por ter iniciado os testes de campo sem estudos adequados. “Os experimentos da empresa Oxitec levaram a uma situação em grande parte incontrolável”, disse o diretor do laboratório Christoph Then. “Este incidente deverá ter consequências para o uso futuro da engenharia genética”, acrescenta. (Veja texto completo na Deutsch Welle)

Outro Lado

Fim de um ‘escândalo de engenharaia genética é o título da reportagem da publicação alemã salonkolumnisten desta sexta-feira, 27 de setembro. A matéria se refere a um artigo publicado no Scientific Reports no dia 10 de setembro, sobre mosquitos transgênicos que, da forma como foi escrito, insinua que a mistura entre os dois tipos de mosquitos pode ter gerado uma espécie de super-inseto transmissor de doenças. 

O artigo, considerado grosseiro e unilateral pela publicação alemã, levou a manchetes alarmantes na imprensa brasileira, como “Mosquitos transgênicos estão se reproduzindo no Brasil”; “Irresponsabilidade da CTNBio produz ‘super mosquito’ da dengue”; “Mosquitos transgênicos foram soltos sem controle na região”; “Tentativa de controlar Aedes pode ter criado “supermosquito” transgênico”. A questão é que seis dos oito autores do artigo em questão reivindicaram a retirada da publicação no Scientific Reports por não estarem envolvidos na versão final e não o aprovaram. Segundo eles, o texto publicado não corresponderia aos resultados apresentados por eles, nem ao texto original do manuscrito.

O co-autor Paulo Andrade, professor da Universidade de Pernambuco, disse à revista Questão de Ciência, do Instituto Questão de Ciência (IQC), que o artigo publicado no Scientific Reports era irresponsavelmente especulativo sobre os riscos delineados e com uso de “linguagem alarmista”. Manchetes como “Super mosquitos da dengue na Bahia”, “Filhos de mosquitos transgênicos não morrem”, “No Brasil, os mosquitos transgênicos se multiplicam” e “Mudanças genéticas são transmitidas” são, portanto, enganosas, garante a publicação alemã, que provoca diretamente os veículos alemães Tagesschau e Deutsche Welle a se pronunciarem sobre reportagens alarmantes que divulgam o referido artigo como verdade absoluta.

O grupo brasileiro de autores agora exige a retirada do artigo publicado no Scientific Report e pretende publicar os dados em outra revista sem o envolvimento do pesquisador norte-americano Jeffrey Powell. Autorizada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), a pesquisa a qual o artigo se refere não produziu nenhum efeito colateral negativo, ao contrário do que sugerem informações equivocadas, que acabaram sendo divulgadas na imprensa. O primeiro jornalista brasileiro a questionar o artigo foi o colunista Cesar Baima, em sua coluna na versão digital da revista Época. Segundo Baima, “…o estudo é uma sequência de erros e especulações que respectivamente não identificados e mal interpretadas deflagraram uma onda de notícias falsas e desinformação nas redes sociais que está gerando pânico entre alguns brasileiros, com afirmações de que os testes de campo produziram um “ supermosquito ” transgênico resistente a inseticidas e capaz de transmitir mais facilmente as doenças do Aedes”.

Para a pesquisadora Margareth Capurro, professora do Instituto de Ciencias Biomédias (ICB) da USP e coautora do artigo em questão, faltou uma frase crucial no texto publicado pela Scientific Reports: não existem mosquitos transgênicos no céu da Bahia! Segundo ela, também faltou dizer que eventuais mosquitos híbridos encontrados hoje, na cidade baiana de Jacobina, não representam nenhum perigo para a população, não transmitem mais doenças do que os mosquitos comuns e não são resistentes a inseticidas.

O transgênico foi liberado na região entre 2013 e 2015, em experimento de campo realizado pela empresa britânica Oxitec e aprovado pela CTNbio, que atestou a segurança e eficácia do procedimento com base em trabalhos assinados pelos autores brasileiros . O experimento foi considerado um sucesso, reduzindo a população de mosquitos locais em 95% durante sua duração. Com o fim da liberação dos insetos geneticamente modificados, houve retomada da população – o que também era esperado.

Texto enviado por João Mauro Uchôa, que contesta informação da Deutsch Welle.