O Brasil e a indústria da morte

.Por Sandro Ari Andrade de Miranda.

O exílio forçado do deputado federal Jean Wyllys (PSOL/RJ) já seria suficiente para envergonhar qualquer país. Com trabalho reconhecido internacionalmente em defesa da diversidade sexual e dos direitos humanos, Jean tem sido vítima constante de ameaças pelas milícias do Rio de Janeiro.

(foto isac nobrega – pr)

Depois do assassinato de Marielle Franco, também do PSOL, e das seguidas ameaçadas ao seu outro companheiro de partido, Marcelo Freixo, Jean decidiu proteger a sua vida e por isto não pode ser criticado ou condenado. Até porque a morte, no Brasil, virou um grande negócio. O seu nome simplesmente aparecia num grupo de discussões de magistrados como alguém que deveria ser eliminado.

Mata-se aqui e muito, de todas as formas, de todos os jeitos. Somos campeões mundias no massacre de defensores de direitos humanos. Em 2016 morria 1 militante social a cada 5 dias, vítima de homicídio, em regra por emboscada ou fuzilamento. Não tenho dúvidas que estes números cresceram bastante nos últimos anos, especialmente em 2019, quando as nossas ruas passaram a ser pintadas de vermelho sangue.

Hoje assistimos a mais um espetáculo deliberado de morte. Sim, pois não pensem que o desmoronamento da barreira de rejeitos minerários de Brumadinho/MG foi um acidente. Foi resultado de imperícia técnica e medidas de contenção de custos para aumentar a taxa de lucratividade da empresa. Cada vítima de mais um crime ambiental desta natureza representa bilhões de reais em dividendos no mercado financeiro.

Mariana também foi assim e ninguém até hoje foi preso. Existem mais 47 represas no país que são bombas relógios permanentes, e o néscio que sentou na cadeira do Planalto ainda diz que existe indústria da multa no IBAMA. Ao contrário, existe negligencia, imperícia, irresponsabilidade técnica e empresarial e dolo permanente nos crimes ambientais. Quando o Presidente da República vai para a imprensa defender criminosos, pois quem comete crime ambiental desta dimensão é isto, um criminoso, ele assina uma carta em branco para a matança. Retorne a este ponto mais adiante.

Mas não são apenas as milícias, os jagunços e os criminosos ambientais que matam. O Brasil voltou ao mapa da fome da ONU, situação inaceitável no mundo civilizado. Com muito custo conseguimos sair deste desonroso espaço. Bastou um golpe de estado, a imposição de um ajuste fiscal desumano e o corte de políticas sociais que o trabalho de formiguinha de inclusão social foi destruído pela avalanche de interesses que orientaram a Emenda Constitucional nº 95/2016. Mata-se na porta dos hospitais por falta de atendimento. A prioridade no nosso país é pagar a dívida com os bancos, mesmo que isto importe na falta de médicos.

No Brasil a morte também é definida no nascimento, em genocídio permanente. No último país do mundo a abolir formalmente a escravidão, mata-se pela vítima nascer indígena, por nascer negro, por nascer mulher, por ser transexual ou homoafetivo. Somos campeões em preconceito, em feminicídios, em mortes por armas de fogos, nossos índices são piores do que de países em Guerra, além de condenado por organismos internacionais pelo genocídio de povos indígenas.

A nossa polícia é a que mais mata no mundo, mas também sofre vítimas aos borbotões, fruto da insensatez de quem pensa que violência se combate com mais violência. O trabalho sério de pesquisadores do IPEA e do Fórum Nacional de Segurança Pública é descartado para adoçar os brucutus da bancada da bala, os quais sequer se deram ao trabalho de ler tais documentos. Viramos um país que nega os intelectuais e a inteligência, e aposta tudo na lei do mais forte, na lei do mercado, na lei da exclusão, na lei da morte.

E sim, o atual Presidente da República é um dos grandes responsáveis pelos elevados índices de criminalidade no país. Embora tenha tomado posse, a sua principal mensagem de campanha foi liberdade para o ódio e para a violência. Facilitou, por decreto, a posse de armas nas regiões com maiores índices de mortes por armas de fogo no país.

Foi para as redes sociais fazer chacota do exílio forçado do Deputado Jean Wyllys, algo que é prova de falta de decoro para qualquer Chefe de Estado, além de uma imensa demonstração de falta de civilidade. Desde a sua época como parlamentar defende torturadores, milicianos, fez apologia ao estupro em plenário, em síntese, a cultura da violência forma o seu habitus.

Enquanto o Brasil for comandado por pessoas que defendem a cultura da violência, da exclusão social, do ódio, do armamento, da destruição do meio ambiente, do preconceito, do machismo, do ranço étnico, em síntese, a cultura da morte, esta ainda será um grande negócio e a sua indústria a mais lucrativa.

Sandro Ari Andrade de Miranda é  advogado, especialista em política, mestre em ciências sociais pela Universidade Federal de Pelotas. Tem atuação no estudo, análise e elaboração de políticas públicas, no planejamento administrativo, nas áreas do direito ambiental e urbanístico.