.Por Sandro Ari Andrade de Miranda.

Desconfio, sempre, de quem busca o perfeito, regras rígidas, comportamento metodicamente estabelecido. A beleza da vida está nas imperfeições, naquilo que adquiridos com o tempo, profanando a sacrossanta virtude dos déspotas do moralismo vazio. Somos tocados, em verdade, pelo imperfeito, pelo incompleto, pelos nossos iguais.

(imagem maklay62 cc)

A utopia revolucionária nunca foi o mundo da lógica, da estética mecânica, dos desenhos simétricos, das pessoas iluminadas, mas um espaço onde todos e todas, independente da sua adequação aos padrões, pudessem ter oportunidades. Mesmo sujos, doentes, massacrados pela vida, ainda assim pudessem ser vistos como parte da sociedade. Onde este sonho se perdeu?

Hoje vivemos um ambiente fragmentário, das frases prontas, das repetições, da linearidade. Passamos a ser mais moralistas do que os inquisidores medievais, o que nos aproxima cada vez mais do conservadorismo. O ser humano tornou-se tão vaidoso que nega a sua proximidade com as demais espécies, prefere acreditar que é uma obra de arte tocada pelo sopro divino. O mesmo humano que mata, que agride, que violenta, que exclui, busca a redenção no paraíso. Só que antes queima a vida, provoca desabrigo, espalha o terror por onde passa.

A verdade, e isto é definitivo, é que não somos perfeitos. E é essa imperfeição que nos mantém vivos. Fomos desnudados por Freud ao demonstrar que somos guiados por desejos. Que somos tão carnais quanto qualquer outra espécie. Antes disto, Darwin já havia demonstrado que nascemos do barro sim, bem como da lama, das cavernas escuras e mofadas, das árvores onde viviam os nossos antepassados, somos o resultado de uma luta por vida, a nossa origem é profana, animal, não temos nada de divinos. A genética desconstruiu a nossa visão binária do humano. E hoje sabemos que o bem e o mal convivem harmonicamente dentro da nossa personalidade.

Felizmente, somos dominados por nossas paixões. São elas que nos iluminam e nos tornam vivos. Imaginem um mundo desapaixonado, desinteressado, sem emoções, sem dor, mas sem alegria, seria algo bom? Um “admirável mundo novo” onde as pessoas já nascem predestinadas, onde qualquer erro seria objeto de eliminação sumária do imperfeito? Alguns realmente sonharam com isto, Mengele era uma deles e sabemos o custo final desta insanidade.

Quando falamos em emoções, precisamos ter presente que o ódio é perfeccionista e o amor é cheio de defeitos. O ódio segue padrões rígidos, o amor aprendizado. O ódio exclui o que está fora dos padrões, o amor busca incorporar as diferenças. Se desejamos realmente ter uma vida sublime, com amor, precisamos aprender a conviver com a imperfeição, com o incompleto, com a vida. Caso contrário, seremos apenas novos ditadores.