.Por Guilherme Boneto.

Tenho conversado com pessoas que acham abomináveis as falas e atitudes do candidato Jair Bolsonaro contra as mulheres e as minorias sexuais. Fiquei particularmente chocado com o cântico de parte da torcida do Atlético-MG, na semana passada, recomendando cuidado aos adversários porque, diante da sua percepção da realidade, “o Bolsonaro vai matar veado”, uma ideia que a campanha do presidenciável, até este momento, não refutou.

Quando menciono o acontecido, as pessoas torcem o nariz. Também costumam relativizar as falas de Bolsonaro. Ouvi, inclusive, que ele pode ter se arrependido do que disse no passado, o que, a meu ver, seria legítimo, desde que ele viesse a público mencionar que estava arrependido, com a clareza que requer a gravidade do assunto. Mas ele não fez isso.

No entanto, o que mais me assusta e entristece é que, mesmo diante de tantos riscos, as pessoas escolherão o candidato Bolsonaro no segundo turno porque a alternativa será uma candidatura do PT. Os brasileiros estão mortalmente feridos. Consideram que os erros do partido não merecem perdão.

Quem me acompanha aqui sabe que não partilho dessa opinião. Vejo nas administrações do PT uma série de avanços, inclusive os institucionais, no sentido de que, hoje, o judiciário tem a prerrogativa de fato de investigar e punir os malfeitores da coisa pública. Vários dos ministros do STF que votaram de maneira contrária aos interesses petistas nos últimos anos foram indicados por Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, o que denota notável independência.

Também os avanços sociais são um legado incontestável dos governos do PT, dentre os quais o Bolsa Família nos moldes de hoje, o Prouni, as novas universidades federais, os programais de expansão do consumo, a melhora substancial da imagem do Brasil no exterior. Nada disso, porém, é suficiente.

Há aqueles que acham que o Brasil, numa nova administração petista, será transformado na Venezuela, em Cuba, na nova União Soviética, sem recordar o passado recente do governo Lula, no qual as grandes empresas e os bancos lucraram como nunca antes. Contra esses alienados, não há o que discutir. Eles vão de Bolsonaro no primeiro turno com invencível convicção.

Entretanto, há aqueles que optarão por outros candidatos neste momento da campanha e que, pelos escândalos de corrupção aos quais assistiram nos últimos anos, não consideram o PT como uma opção. Foram tantos os erros e é tão profunda a ferida que, neste momento, é inútil trazer à baila os argumentos de que a corrupção é sistêmica e que ocorrerá em qualquer governo, ainda que possa reduzir-se com uma ampla reforma política, cujo início interessa a pouquíssimos candidatos. Essas pessoas, que não são homofóbicas, nem machistas, nem racistas, que não são essa gente horrível com a qual estamos cruzando por aí neste momento tão difícil, não querem Bolsonaro. Mas podem preferi-lo caso a opção a ele seja o PT, nem tanto por Fernando Haddad, que é um grande sujeito, mas pelo partido que o abriga.

Então, eu questiono: até onde o PT está disposto a ir? Compreendo amplamente as razões do partido, o entendimento de que a prisão do ex-presidente Lula é injusta, a defesa de sua candidatura até as últimas consequências e a colocação de um substituto sob sua tutela, mas me pergunto se essa confrontação valerá a pena diante dos possíveis desdobramentos.

Ciro Gomes, meu candidato, não é apenas um homem experiente e qualificado para o cargo, mas foi desde sempre um aliado de primeira hora do PT. Já declarou, magnanimamente diante da última jogada petista com o PSB, que terá Fernando Haddad como seu candidato no segundo turno, se for o caso.  Ciro pode ser, se passar ao segundo turno, a voz da razão, e não terá o telhado de vidro disponível aos ataques de Bolsonaro, num momento em que a questão moral parece tão cara à sociedade brasileira.

Ciro tem o necessário preparo para desconstruir as contradições de Bolsonaro e mostrar o que ele de fato representa, sem ter que responder por erros passados. Compreendo suas chances no segundo turno como muito maiores do que as de Haddad. Para além disso, suas ideias concretas de reformas para o Brasil poderiam revolucionar o nosso país a médio e longo prazo. Ciro Gomes é o estadista que precisamos neste momento.

Se isso de fato ficar claro mais próximo ao primeiro turno, o PT estaria disposto a apoiar Ciro Gomes para evitar a eleição de Bolsonaro? E se Fernando Haddad não tiver condições de vencê-lo? Terá valido a pena a estratégia de Lula? Será razoável entregar a presidência da República a Bolsonaro por conta da vaidade do PT?

Há jogo pela frente. Muita coisa pode mudar até o dia da eleição. Mas acho que não podemos perder de vista a amplitude do antipetismo no Brasil de 2018, e devemos questionar as chances de Haddad no segundo turno para que toda a luta empreendida até hoje não seja jogada no lixo.  Está em jogo muito mais do que um projeto de país; trata-se do nosso futuro, das instituições e valores democráticos, do nosso direito de existir. É a luta da civilização contra a barbárie.