Por Regis Mesquita

 

O que Paulinho, Gabriel de Jesus, Miranda, Thiago Silva, Marcelo e Casemiro possuem em comum?

 

Todos são titulares da seleção brasileira e todos foram criados SEM a presença do pai.

 

Estes seis titulares fazem parte de um grupo cada vez maior: crianças que são criadas em um lar cujo “chefe” é uma mulher.

 

Entre 1995 e 2015, o número de lares brasileiros “chefiados” por mulheres saltou de 23% para 40% segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) (pesquisa Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça).

 

 

Gráfico famílias chefiadas por mulheres por grupos etários

Fonte do Gráfico: Cresce a presença de mulheres chefes de família entre os idosos no Brasil

 

O gráfico mostra que o maior aumento de mulheres chefes de família está na faixa etária dos 20 aos 40 anos.

 

O que isto significa?

 

Primeiro: significa mais pais abandonando e não assumindo as responsabilidades da paternidade.

 

Segundo: o aumento da renda média das mulheres diminui o peso da culpa dos pais. Ou seja, sabendo que a mulher vai dar conta de criar os filhos, os pais sentem “mais tranquilos” para abandonar os filhos.

 

Esta é uma desculpa comum destes pais (mas não a única). Eles sentem que estão longe, distantes e que não fazem falta. A vida da família continua, sem ele.

 

É exatamente isto o que acontece. A família continua. Com mais dificuldades financeiras e principalmente, mais carência afetiva.

 

Gabriel de Jesus disse ao The Players’ Tribune: “Eu me lembro de quando estava jogando no Pequeninos, eu via algumas crianças depois da partida com os pais deles, e eu estava sozinho. Isso foi pesado para mim. Isso me marcou. Mas agora, quando alguém pergunta sobre meu pai, digo que minha mãe é meu pai. Ela fez tudo por mim e meus irmãos.”

 

Desemprego: um dado cruel

 

Uma mulher que cuida da família, muitas vezes sem a ajuda de ninguém, tem menos oportunidades de estudos, menos chances de aperfeiçoamento e menos flexibilidade de horário.

 

M. tem dois filhos e conta com a ajuda do avô das crianças para “vigiá-los depois da creche”. Mas, ela não pode se atrasar muito. Ela já perdeu boas oportunidades de emprego por causa desta limitação. Estudar para ela é um sonho (“um dia eu consigo”).

 

Segundo ela, os empregadores preferem mulheres sem filhos. Depois preferem as casadas com marido. Mulheres sozinhas e com filhos estão no fim da fila.

 

A realidade de M. se reflete nas estatísticas. Em 2015 a desocupação feminina era de 11,6%. A desocupação masculina era de 7,8%. Homens brancos desempregados eram 6,8%, já mulheres negras 13,3%.

 

Um vazio ocupado por grandes amigos

 

Momentos de carência são também oportunidades para grandes atos de bondade. Cássio, goleiro do Corinthians e do Brasil, teve na figura do seu tio João Carlos o suporte amigo. O pai do Cássio saiu de cena e “abriu espaço para o tio lhe estender a mão”.

 

O mesmo aconteceu com o lateral Marcelo, cujo avô foi seu verdadeiro pai (segundo declaração pública do jogador).

 

Thiago Silva foi criado pelo padrasto Valdomiro, a quem também reconheceu publicamente pelo afeto e educação que recebeu.

 

Nem todas as crianças abandonadas por seus pais tem a mesma oportunidade destes três jogadores. Grande parte das vezes sobra somente para a mãe e os irmãos para lutarem juntos e se ajudarem.

 

A família em risco também é uma oportunidade de grande união

 

As dificuldades obrigam as pessoas a compartilharem. Geralmente compartilham até a mesma cama. Compartilham roupa, a pouca comida, o trabalho doméstico. A necessidade de ajudar a mãe torna-os mais dispostos a colaborar.

 

Compare com uma família de classe média aonde cada um tem seu quarto, seus brinquedos e aparelhos eletrônicos. E estão sempre reclamando… (1)

 

Aonde as pessoas compartilham é mais fácil de surgir amizade. Aonde as pessoas colaboram entre si é mais fácil de manter a intimidade. A distância afetiva gera conflito, amplia o egoísmo e a intolerância.

 

Toda família vive esta dicotomia entre união e colaboração versus egoísmo e dispersão. Grande parte do resultado da educação dependerá de quais destas forças irão prevalecer.

 

A figura paterna, quando positiva, ajuda a aumentar as forças de união e colaboração. A ausência cria uma tensão que terá que ser compensada pela dedicação materna e a união entre irmãos. Duas regras são de especial importância nestas famílias: treine todos para servir e as fraquezas dos outros devem ser amparadas. Estas duas regras são fundamentais para criar um ambiente de paz. (2)

 

Mulheres que lutam muito e que merecem nosso respeito

 

Estas mães lutam muito. Enfrentam muitas dificuldades. A imensa maioria não desiste. Se esforçam muito e são um exemplo para outras pessoas que tem muito menos dificuldades.

 

Elas são cada vez mais comuns. Mesmo com menos filhos e mais creches, sua luta continua sendo forte e valente.

 

Perguntei para M. como poderia ser ajudada. Ela gostaria de não ser a última da fila na hora de arranjar emprego e nem a última da fila no momento da promoção no emprego.

 

Fica a dica para quem seleciona e contrata funcionários nas empresas.

1 – Seis sintomas de que você está criando seu filho para ser egoísta e frustrado

2 – Família: cinco dicas para viver em paz

Regis Mesquita é o autor do Blog Psicologia Racional e da coluna “Comportamento Humano aqui no site Carta Campinas