Algo de estranho no transporte público em Campinas

.Por Marcio Pochmann.

A análise da situação do transporte público no município de Campinas permite constar a continuidade do seu descaso para a população, especialmente aquela situada na base da pirâmide social. De acordo com o IBGE, quase 40% da população vive mensalmente com até um salário mínimo (954 reais), chegando a compreender 66% dos campineiros, se for ampliada a faixa de até dois salários mínimos mensais (1.908 reais).

Justamente para o contingente da população situada na base da pirâmide social, que concentra cerca de 2/3 de pessoas não brancas (preta e parda no conceito do IBGE), o transporte público é fundamental no deslocamento do trabalho e demais atividades realizadas fora da residência. Destaca-se que do total dos ocupados de baixa renda em Campinas, a maior parte encontra-se na situação de empregados sem carteira assinada, trabalhadores informais, subempregados e desempregados, ou seja, sem condições de usufruir, por exemplo, dos benefícios dos passes subsidiados.

Nesse início do ano de 2018, o sexto ano da gestão do prefeito Jonas Donizette em Campinas, o valor mensal do salário mínimo permite ao trabalhador adquirir 187 passagens de ônibus por mês, enquanto em 2013, o primeiro ano do mesmo prefeito, o salário mínimo equivalia a 208 passagens mensais. Ou seja, 21 passagens a mais do que atualmente, o que significa uma perda para o trabalhador de baixa renda de 10% no poder de compra para o uso do transporte coletivo.

De outra forma, considerando o uso diário de apenas duas passagens de ônibus e por somente 22 dias úteis, o trabalhador gastava 132 reais mensais (ou 21,2% do salário mínimo líquido) em 2013 no custeio individual com o uso de ônibus. Atualmente, o trabalhador compromete quase 207 reais (ou 23,6% do salário mínimo liquido), o que equivale ao aumento de 56,7% no gasto mensal com o transporte público.

Se comparar a evolução do preço do transporte público da capital de São Paulo, percebe-se como a atual administração local tem sido injusta com os mais pobres. Enquanto na cidade de São Paulo, o preço da passagem de ônibus subiu 33,3% entre o início de 2013 e o de 2018 (de R$3,00 para R$4,00), em Campinas houve aumento de 56,7% (de R$3,00 para R4,70).

Por conta disso, o trabalhador de salário mínimo paulistano conseguiu reduzir o peso do transporte em relação ao seu orçamento, a passo que para o campineiro ocorreu o contrário. Justamente por isso que se pode perceber a existência de algo de estranho no transporte público de Campinas.

Talvez por isso, que o Ministério Público do Estado de São Paulo terminou também buscando analisar a situação atual do transporte público municipal. Pela conclusão recém-apresentada, destaca-se a notificação de uma série de graves irregularidades, suficientes para solicitar a condenação e a perda de direitos políticos do próprio prefeito Jonas Donizette (PSB), entre outros.