(imagem reprodução facebook letrux)

.Por Glauco Cortez.

Como um país golpeado por uma quadrilha sustentada pelo cleptoevangelismo conseguiu produzir uma obra de arte como Letrux Em Noite de Climão?

Há algo que não se encaixa e por isso talvez vivamos, também, nesse climão tenso entre o fascismo e a democracia. Um Rio de Janeiro que é o Brasil, um rio de janeiro que morre com o Brasil. Dali artista parece enfrentar as trovoadas com uma dose de ira sonora sobre um manto introjetado do livre arbítrio. ‘Em Noite de Climão’ nos faz renascer como civilização.

Mas não pense que vai encontrar na trilha um discurso político-musical. Não, não adianta querer encontra neste magnífico trabalho uma única palavra de ordem. A política subjaz a arte e o amor.

A força da arte não está no discurso racional, mas na estética que opera um discurso de liberdade, tatuado na alma, algo que explode em cada batida, em cada viagem sintetizada em formas melódicas. ‘Em Noide de Climão’ vaza a poesia da liberdade, não dos sonhos, mas da vida experimentada no dia a dia. A dor de ser livre, a dor da existência que não cabe em ordem verticais, própria ao sacrifício do subjugado.

Em algum momento, Letrux parece navegar em uma cena carioca dos anos 80 em que se previa o fim de uma ditadura. Ou em uma batera que nos faz voltar aos anos 70 acompanhada de sonoridades eletrônicas futuristas.

Há um humor que não se submete à ordem estabelecida pela administração dos corpos. Um humor que rompe barreiras, que está ali vivendo a realidade, não produzindo a realidade. É um momento histórico em uma liberdade sexual-afetiva vai além da liberdade sexual dos anos 60.

Não, Letrux não cabe em um país golpista e cleptoevangélico. Em Noite de Climão é a mais bela bruxaria musical. Mesmo porque, na suruba da Letrux o prazer é gozo estético para todos, muito diferente da suruba do Estado, em que a população só se fode.

Quer entender? Ouça o disco e veja esse texto arrebatador de João Neves (e que me levou a Letrux). Em certo momento João Neves registra: “Durante o ritual de minha morte, por favor, faça-o ao som deste disco! Quero que a última parte do que me forma, ouça, em alto e bom som, as pulsões dessas canções…”

Fiquem com Letrux: