Forças Armadas fazem operação conjunta em comunidades do Rio Rio de Janeiro - Forças Armadas fazem operação conjunta com as polícias Civil e Militar em comunidades na zona oeste da cidade. Os militares estão apoiando ações nas comunidades de Vila Kennedy, Vila Aliança e Coreia (Tânia Rêgo/Agência Brasil)

 

Por Regis Mesquita

 

Cena real: policiais observam uma negra andando de táxi. Eles param o táxi para verificar o que está acontecendo. Naquele momento passam por eles vários táxis. Os passageiros são pessoas acima de qualquer suspeita. Seguem em paz, sem serem incomodados.

 

Cena real: um pobre rouba um carro. Faz o que com o carro? Repassa para uma quadrilha desmontar e vender as peças. Tudo já está planejado. Negócio rende bilhões de reais. Os chefes nunca são investigados.

 

Cena fictícia: enquanto a polícia para o táxi com a negra que é judoca (com medalha olímpica) passa por eles um homem em um carro de luxo. O sujeito é um dos organizadores da rede de roubo de carros. (1)

 

Cena real: os grandes criminosos frequentam os mesmos lugares que os empresários, apresentadores de tv, artistas, delegados, etc. Colocam os filhos nas mesmas e caras escolas, frequentam os mesmos clubes, moram nos mesmos condomínios, etc.

 

Cena real: um cientista da uma universidade pública é obrigado a depor sobre a organização de um congresso científico. Pertinho dali o varejo do tráfico corre solto. Enquanto isso, os chefões estão negociando com bancos e empresas esquemas para lavar o dinheiro; estão separando as propinas para juízes, policiais, radialistas, fiscais, donos de rádio e tvs, promotores, etc. O cientista é investigado. Sujeito honesto, trabalhador, interessado em fazer o bem. Assim como a negra no táxi, é considerado um perigo para a sociedade.

 

Esta DISTORÇÃO no funcionamento da sociedade (e não só da polícia) tem que acabar. As prioridades de investigação estão erradas. O crime de roubo de carro (por exemplo) não vai diminuir enquanto houver um sujeito rico oferecendo mil reais para um pobre roubar o carro para ele. A prioridade deve ser investigar e prender o sujeito que organiza e aumenta a escala (quantidade) de crimes realizados. A prioridade deve ser prender aquele que manda o outro cometer o crime (os dois devem ser presos, mas a prioridade é quem tem o mando de fato).

 

Roubo é negócio

 

Quando o sujeito rouba um celular, ele ganha ao vendê-lo. Ao roubar um carro, também ganhará ao vendê-lo. Se tiver volume de roubo (muitos roubos) terá que organizar um esquema de escoamento da mercadoria. Organização! É nesta fase que o crime pequeno torna-se crime organizado. Somente com organização a criminalidade cresce e dá vazão ao roubo (e outros frutos do crime).

 

Se a criminalidade está grande é porque quem está ganhando muito dinheiro, está satisfeita o bastante para ampliar seus negócios. A estratégia destes grandes bandidos é passar despercebido. Basta comprar uma Mercedes e usar terno que serão considerados “pessoas de bem”, empresários, etc.

 

Na rua, a polícia para o dono da moto e deixa passar a Mercedes. A polícia maltrata e ameaça o dono da moto, sob os aplausos de pessoas como você. E para a felicidade do dono da Mercedes. Você quer ver na televisão que a polícia está fazendo algo. Ela está fazendo: toda a atenção está direcionada para o dono da moto. Afinal, existem muitos bandidos usando moto para roubar.  Existem também muitos jovens trabalhadores que compram moto para melhorar sua qualidade de vida; e são maltratados. O dono da Mercedes feliz e impune, contrata o roubo. É um empresário. (2)

 

Roubo de pobre e roubo de milionário

 

O roubo de pobre é, geralmente, mais impulsivo, desestruturado. O maior exemplo são os arrastões. Aqueles garotos (que devem ser punidos) não pagam propina para ninguém, não usam várias empresas no Brasil e em paraísos fiscais para lavar dinheiro, etc.

 

Como você pode observar, o roubo do milionário é mais organizado, racional e envolve muito mais gente. Além dos que recebem propinas, existem os funcionários – advogados, economistas, gerentes de empresas, seguranças, serviços de logísticas, controladores de investimentos, bancos, joalherias, etc. São pessoas de classe média ou classe alta, que “tiram sua casquinha” do dinheiro do crime organizado.

 

Para continuar tudo igual, ou pior, basta você continuar permitindo a lavagem cerebral que associa pobres a chefes de um mercado que rende bilhões de dólares. Neste caso, você vai se indignar com a negra parada no táxi somente porque ela é medalhista olímpica. Se não fosse, seria suspeita.

 

O Brasil faz piada de português burro. Mas, pelos resultados parece que somos nós os burros. Basta ver a alta credibilidade do Jornal Nacional, do apresentador Datena e de outros do mesmo tipinho. Basta ver aqueles sujeitos que tem raiva dos defensores dos direitos humanos: a culpa da criminalidade é destes defensores que querem a impunidade (acreditam os odiadores dos direitos humanos).

 

Lavagem cerebral serve para isto: tem que existir um culpado. Os bilionários e seus funcionários escolhem quem são os culpados. Enquanto isto enchem o bolso de dinheiro; o orgulho e a vaidade tiram deles qualquer traço de compaixão (que não seja marketing para se fingir de bondoso).

 

Preste atenção, porque é a sua vida, a vida de uma sociedade que poderia ser bem melhor.

 

Lembre sempre: a lavagem cerebral sempre envolve a disseminação de sentimentos negativos. Outro exemplo de lavagem cerebral disseminada pela “indignação” e falta de gratidão você encontra neste texto: A gratidão como arma política e a ingratidão como arma de dominação

 

PS: a foto desta postagem mostra que o exército (que recebe uma fortuna de verba do orçamento todos os anos) repete o mesmo erro e o mesmo padrão de ação com prioridades invertidas.

 

(1) “Esse preconceito vai até onde?”, diz Rafaela Silva após abordagem

 

(2) Carta ao homem que quer vender ‘filhote de bandido’

 

Regis Mesquita é o autor do Blog Psicologia Racional e da coluna “Comportamento Humano” aqui no site Carta Campinas